Decisão do Supremo que anula 100 mil contratações de Aécio pesa sobre PSDB

    Por Marcos de Moura e Souza e Cristiano Zaia | De Belo Horizonte e Brasília

    Em novembro de 2007, Aécio Neves (PSDB), então governador de Minas Gerais, sancionou uma lei que mudaria a vida de milhares funcionários do Estado.

    A chamada Lei 100 efetivou cerca de 100 mil professores e outros servidores da área de educação que não tinham feito concurso público. Eram pessoas que tinham contratos temporários e condições de trabalho e salário inferiores aos concursados e cujo tempo de serviço simplesmente não era computado para efeito de aposentadoria. Muitas estavam havia anos nessa situação, um caso de desleixo administrativo que vinha sendo empurrado com a barriga por governos de Minas. Aécio pareceu à época ter, finalmente, solucionado a questão.

    Mas, então, veio a bomba. Há duas semanas, por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) consideraram inconstitucional a efetivação de servidores sem concurso, jogando por terra a solução do ex-governador tucano.

    O STF deu prazo de 12 meses para que o governo de Minas realize concursos públicos e coloque os aprovados nas vagas ocupadas hoje pelos efetivados pela Lei 100. Estes, para continuarem trabalhando no Estado, terão de passar nos concursos que Minas prepara ou tentar uma vaga como substituto – numa condição de trabalho inferior a quem têm atualmente.

    Em princípio, quem não conseguir ser aprovado e não se encaixar como substituto estará na rua. O risco real disso ocorrer virou um drama para milhares de trabalhadores e suas famílias em Minas Gerais. O governo ainda não definiu quantas vagas serão necessárias abrir nos concursos.

    “Eles fizeram essa lei para resolver a situação. Me deu segurança para aposentadoria, tinha trabalho garantido e de repente tudo isso acaba”, diz Mirian Messias da Silva, 58 anos, assistente técnica de educação básica de uma escola estadual de Ribeirão das Neves. Sua colega, Viviane Tomaz Rangel, diz que o governo havia assegurado que as vagas delas estavam garantidas. “Meu sonho de consumo, que era comprar um carro, vai ter de esperar. Vou ter de pensar duas vezes.”

    Ao todo, a Lei 100 efetivou 97.104 cargos, o que equivale a 88.104 pessoas (já que algumas ocupam mais de um cargo). São professores, mas há também auxiliares de serviço, pessoal do setor administrativo, supervisores, especialistas, entre outros. A maioria, 80.257, desses servidores está ligada à Secretaria da Educação do Estado, que tem ainda 68.447 concursados e outros 75.973 substitutos.

    A secretária Ana Lúcia Gazzola diz que ainda não tem um número exato sobre quantos serão de fato afetados pela decisão do STF. Mas na secretaria a estimativa é que sejam cerca de 70 mil – já descontados os aposentados e os que estão em vias de se aposentar e, portanto, protegidos pela decisão do STF.

    Num ano de eleições, uma sombra de insegurança sobre tantos servidores é péssima notícia para o governo de Minas e deve virar munição de campanha dos adversários de Aécio.

    Principal candidato da oposição à Presidência, o tucano já começou a ser alvo de críticas. A linha de argumento será esta: “O STF deu um atestado de que o choque de gestão em Minas foi uma falácia. Os tucanos contaram uma historinha para os servidores do Estado ao dizerem que a lei que o efetivou era possível. Como alguém que se gaba pela eficiência de gestão comete um erro dessa magnitude”. As palavras são do deputado federal Odair Cunha, presidente do PT em Minas e aliado muito próximo do ex-ministro do Desenvolvimento e candidato petista ao governo do Estado, Fernando Pimentel.

    No Palácio Tiradentes, sede do governo de Minas, e entre tucanos mineiros, o que se ouve é que a decisão do STF foi endereçada contra Aécio, que houve um caráter eleitoral dos ministros para minar o adversário da presidente Dilma Rousseff nas eleições de outubro.

    O atual governador de Minas é Alberto Pinto Coelho (PP). Ele assumiu o posto no dia 4, quando o então governador Antonio Anastasia (PSDB) renunciou para atuar na campanha de Aécio e provavelmente candidatar-se ao Senado. Coelho é um aliado de Aécio.

    O STF também julgou inconstitucionais leis semelhantes à Lei 100 e que estavam em vigor no Acre e no Rio Grande do Sul.

    Para Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do sindicato dos professores, Sindiute, ligado à CUT, “o governo foi irresponsável ao propor a lei sabendo dessa fragilidade constitucional”.

    O presidente do PSDB em Minas, o deputado federal Marcus Pestana, que foi secretário por sete anos no governo Aécio, admite que o ex-governador reconhecia a insegurança jurídica da lei, mas que tudo foi feito com embasamento técnico, diante de uma situação histórica de excesso de servidores temporários no Estado.

    “O governo apenas tentou assegurar professores nas salas de aula”, respondeu. Ele ainda acrescentou que os resultados educacionais da gestão do ex-governador serão uma “bandeira forte” de Aécio na corrida presidencial.

    O próprio Aécio comentou e defendeu a lei, dizendo: “Este foi o caminho que encontramos para corrigir uma distorção que já havia no quadro da educação com grave consequência na vida de milhares famílias carentes.”

    O discurso oficial é que a Lei 100 foi um acerto e que não havia outra maneira de regularizar a situação de tantos servidores não concursados que dependiam de velhos contratos precários com o governo de Minas. O pior para eles é que o Estado e prefeituras não recolhiam contribuição previdenciária para sua aposentadoria. Aécio quando eleito para o primeiro mandato em 2002 recebeu esse quadro. Foi em 2007, no primeiro ano do seu segundo mandato, que ele apresentou o projeto da Lei 100 à Assembleia e a aprovou.

    Ana Lúcia Gazzola diz que a fórmula foi discutida com a equipe do então presidente Lula. “Houve discussões com o Ministério da Previdência, com o INSS e com a Casa Civil do governo federal. Foi um acordo formal e a lei foi aprovada pela Assembleia de Minas”, afirma.

    A secretária lembra que a decisão do STF garantiu aposentadoria integral para no mínimo os que já tinham se aposentado e para aqueles que até 1º de abril – quando da decisão foi publicada – já tinham condições necessárias para requerer este benefício. São, segundo um primeiro levantamento da secretaria, 18 mil servidores.

    Desde a sentença dos ministros, essa virou uma questão de primeira ordem para o governo mineiro. “É a questão mais urgente”, resumiu Ana Lúcia. “No meu caso, 85% da minha agenda estão sendo devotados a isso. Há grande complexidade operacional nesse processo.”

    Ela diz que provavelmente o Estado fará mais de um concurso e que ainda não tem o número de quantas vagas serão oferecidas.

     

    Fonte: Diap

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