É baixa a expectativa de redução de gastos do governo neste ano, mas mercado quer compromisso já para 2015
VICTOR MARTINS
O governo está de mãos atadas frente o Orçamento, sem conseguir cortar despesas. Corre contra o tempo para concluir o decreto de contingenciamento, que deve ser apresentado antes de 20 de fevereiro, quando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, viajará à Austrália para a reunião do G20. A equipe econômica, até lá, precisa construir um cálculo que atenda os anseios do mercado e de investidores. O ideal seria chegar a um ajuste de aproximadamente R$ 50 bilhões. Porém, uma tesourada dessa magnitude, concordam especialistas, inviabilizaria o funcionamento da máquina pública.
Para a essa cifra, o governo teria de sacrificar ainda mais os investimentos e cortar nas despesas sociais. A situação deixou a presidente Dilma Rousseff diante de uma escolha que parece impossível, sobretudo em um ano eleitoral. A ordem é fazer a correção de rota sem punir transferências de renda e outras bandeiras da gestão petista.
O que os ministros apresentaram até o momento como cota de sacrifício, no entanto, não agradou ao Palácio do Planalto. A preferência é de que os cortes ocorram no custeio, mas o espaço que existe é mínimo. No ano passado, as despesas para manter a máquina estatal em funcionamento chegaram a R$ 71,7 bilhões, valor que, na teoria, poderia ser reduzido.
Mansueto Almeida, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), calcula que, neste ano, R$ 22 bilhões não podem ser tocados porque são destinados ao pagamento de sentenças judiciais, indenizações e restituições, compensando o Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Sobrariam, então, R$ 49 bilhões. “Se cortasse metade, o que acho impossível porque teria que parar a execução de vários programas, o governo economizaria menos de R$ 25 bilhões”, disse.
Como a Grécia
Amir Khair, economista e consultor na área de contas públicas, chama a atenção para o fato de que o governo enfrenta, em 2014, a alta dos juros básicos (Selic). Ele explica que a taxa, na média, ficou em 8,29% anuais em 2013. Para este ano, a expectativa é de que essa média suba para 11%. “Com isso, é possível que as despesas com juros ultrapassem os 6% do Produto Interno Bruto”, observou. Se o cálculo se confirmar, será um gasto semelhante ao da Grécia em 2012, quando o país tinha uma dívida de mais de 150% do PIB e enfrentava uma das piores crises da sua história.
Para André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, pagar mais que 5% do PIB de juros é um gasto pesado. “Exigir um ajuste recessivo para sanar as contas públicas, no atual cenário, só terá o efeito de piora dos indicadores e jogará o país numa convulsão social aguda”, defendeu.
Há expectativa de transparência, ao menos. “Acho que seria mais salutar falar claramente para o mercado que, em 2014, o primário será menor, mas que a trajetória será revertida a partir de 2015”, sugeriu Almeida. “Mas o governo teria de se comprometer com melhora a partir do próximo ano, algo que reluta em fazer”, afirmou.
Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho, considera que não há espaço, neste ano, para um superavit primário (economia para pagar os juros da dívida) maior que 1,5% do PIB, número bastante inferior ao de 2013. “Não há muito o que fazer. É preciso retomar a agenda de reformas estruturais para abrir espaço no Orçamento. É uma tarefa a longo prazo, mas que surte efeito imediato à medida que dá boas sinalizações”, argumentou.
Fonte: Correio Braziliense