Sem aceitar cortes e sem apoio político para aumentar as receitas, a presidente Dilma Rousseff transferiu para o Congresso Nacional a responsabilidade precípua do Executivo de comandar a gestão das finanças públicas.
Ontem, os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, entregaram o projeto de lei do Orçamento para 2016 ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), com um “buraco” de 0,5% do PIB – equivalente a R$ 30,5 bilhões – para que deputados e senadores decidam o que fazer.
Dilma nem tentou cortar as despesas. Na proposta, fechada no domingo, as despesas tanto obrigatórias quanto discricionárias crescem; as receitas caem. O Orçamento foi elaborado pressupondo crescimento de 0,2% da atividade econômica e inflação de 5,4%. As expectativas do mercado indicam continuidade da recessão para o próximo ano e o Banco Central prevê inflação de 4,5% no fim do exercício.
Depois de desistir, na sexta feira, da recriação da CPMF, ontem surgiu a ideia de discutir com os parlamentares a criação de um imposto emergencial, com prazo de vigência de um ano. Proposta semelhante foi feita pelo ex-ministro Delfim Netto, como uma transição para que o governo tenha tempo para cortar seus gastos. Mesmo Delfim, porém, acha que assim como a CPMF, é uma alternativa que não passa no Congresso.
A questão da CPMF, aliás, foi um capítulo à parte que deixou em delicada situação tanto o vice-presidente, Michel Temer, quanto o ministro da Fazenda. Por desconhecer as intenções do Palácio do Planalto, Temer atribuiu a “burburinhos” as informações publicadas nos jornais, na semana passada, de que o Orçamento previa a volta da CPMF.
Levy, que era contra essa alternativa, acabou por justifica-la e defendê-la, em evento da BM&F, em Campos de Jordão, quando o governo já anunciava a desistência de propor o retorno do imposto do cheque. Ali o ministro da Fazenda falou, também, de um programa econômico mais amplo e, na política fiscal, do necessário foco na “racionalização do gasto obrigatório e discricionário, sem ambiguidades”.
Agora, com o primeiro Orçamento deficitário da história contemporânea do país, Levy disse que pretende construir, com o Legislativo, medidas legais para financiar o “rombo” nas próximas semanas e meses. A intenção é mexer nos gastos obrigatórios, sobretudo com uma reforma da previdência com a fixação da idade mínima.
Para políticos de partidos aliados, Dilma era e continua sendo a ministra da economia e, como tal, comanda a política fiscal e o Orçamento da União com “voluntarismo”. Foi assim na gestão de Guido Mantega na Fazenda e continua assim hoje, segundo esses observadores atentos do modo de governar da presidente da República.
Para economistas do setor privado, a presidente Dilma está montando “o seu próprio precipício”. Isso porque ela está mostrando que não pretende controlar a trajetória da dívida pública como proporção do PIB.
Sem atribuir a devida importância ao principal indicador de solvência – a dívida/PIB – a presidente está consolidando as condições para uma piora do risco país, para a elevação da taxa de juros do mercado e mais desvalorização do câmbio. O CDS (Credit Default Swap), que mede o risco país, ontem era de 263 para a Turquia, que não é “grau de investimento”, e de 350 para o Brasil.
Nos prognósticos desses economistas, a retração da atividade este ano pode chegar a 3% e se estender para 2016, com a repetição de PIB negativo da ordem de 1%. Se isso se confirmar, o país poderá ter a taxa de desemprego de até 12% no primeiro trimestre de 2016.
Depois de uma retração de 1,9% do PIB no segundo trimestre deste ano, a expectativa é que no terceiro trimestre a contração chegue a 2,5% em comparação com o período imediatamente anterior.
Fonte: Valor Econômico