Dólar atinge R$ 2,836 e pressiona a inflação

    Perspectiva de elevação dos juros nos Estados Unidos e incertezas com a economia brasileira levam moeda norte-americana a subir 2,12%. Com um dos maiores tombos do dia, real chega ao menor valor desde novembro de 2004

    O dólar disparou ontem e alcançou a cotação de R$ 2,836, a maior desde novembro de 2004. A alta do dia, de 2,12%, foi a quinta seguida, puxada pela perspectiva de elevação dos juros norte-americanos e pelas incertezas com a economia brasileira, sobretudo em relação ao ajuste fiscal. O real figurou entre as moedas que mais se desvalorizaram. A alta do rendimento dos títulos do Tesouro norte-americano, pressionada pela perspectiva de normalização da política monetária, antes do esperado, contribui para o recuo das moedas emergentes. 

    Apesar de o governo insistir no discurso de que uma desvalorização do câmbio é positiva para a competitividade da indústria, os especialistas ponderam que a alta do dólar pode piorar o quadro econômico curto prazo. Boa parte disso se deve ao fato de muitas das empresas brasileiras estarem bastante endividadas em dólar e devem sofrer com a variação. A maior parte da dívida externa bruta do país, de US$ 347,6 bilhões, está em mãos privadas. 

    Segundo o Banco CENTRAL (BC), as empresas privadas em território brasileiro devem US$ 118,4 bilhões (veja quadro). Os donos de dívidas com vencimento de curto prazo, um total de US$ 45,9 bilhões – US$ 35,2 bilhões com vencimento neste ano -, devem sofrer mais. 

    Para analistas, a alta do dólar é fruto de um cenário de insegurança que deve perdurar durante o ano e provocar turbulências por muitos meses. Isso porque a desconfiança em relação à Petrobras, o risco de racionamento de água e energia, a possibilidade de que o governo apertará mais o arrocho fiscal e a consolidação cada vez mais clara de recessão deixam o investidor com o pé atrás.

    O cenário externo também acentua as oscilações. Nos Estados Unidos, os sinais de recuperação da economia aumentam a possibilidade de que os juros voltem a subir, o que reduz o apetite por risco dos investidores. “O real está ficando fraco e o dólar está ficando forte. Temos um pouco das duas coisas”, explica o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito. 

    Na China, dados de inflação abaixo do esperado reforçam a especulação de que o BC chinês vá cortar a taxa básica de juros. Além disso, a mudança de governo na Grécia e a possibilidade de que o país saia da Zona do Euro aumentam o pessimismo e a incerteza do mercado.

     

    Riscos

    Virene Matesco, especialista em macroeconomia da Fundação Getulio Vargas (FGV), o maior problema para a economia está no sobe e desce do dólar, pois as empresas, justamente para se proteger de situações inesperadas de dólar alto, fazem reservas (hedges). “A volatilidade do câmbio, mais do que o patamar alto do dólar, tem impacto nas decisões de negócio da empresa, nas opções de endividamento e no investimento”, explicou a professora.

    O efeito do dólar nas alturas pode chegar ao consumidor na forma de produtos importados e de viagens ao exterior mais caras. “Esse é mais um dos fatores que pode alimentar a inflação já alta”, completou. O governo ameniza. “Temos uma preocupação com a evolução de preços. O repasse de câmbio para preços é reconhecidamente menor do que em anos anteriores, mas ainda existe”, garantiu o chefe do Departamento Econômico do BC, Túlio Maciel.

     “O dólar só escalou esse patamar devido à percepção de piora da economia brasileira. Estamos no meio de uma ação especulativa. Vários fundos acreditam que o Brasil tem hoje riscos que não tinha há alguns meses”, pontua Perfeito, da Gradual Investimentos. “Não tem ajudado o país a exportar e faz a gente não importar”, argumentou. Para ele, muitas empresas não se prepararam para as mudanças do cenário cambial, confiantes nas intervenções diárias do BC para tentar estabilizar as oscilações.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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