Dólar e juros testam novas máximas

    Um clima de pânico tomou conta dos mercados e levou dólar e juros futuros a novas máximas históricas. A moeda americana atingiu o pico de R$ 4,1508, para fechar a sessão a R$ 4,1456, alta de 2,28%.

    No mercado de juros, a disparada foi tão intensa que boa parte dos contratos atingiu o limite máximo de oscilação. O contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2017, o mais negociado, alcançou 16,55%, de 15,75% do fechamento anterior. O DI para janeiro de 2021 bateu em 16,94%. 

    O movimento ocorreu horas depois de o governo ter computado uma vitória – a primeira em muitos dias – no Congresso, ao garantir a manutenção de 26 dos 32 vetos às chamadas pautas-bomba, durante sessão na madrugada. A leitura dos investidores é que a governabilidade segue comprometida e a solução, muito demorada. Com isso, fica mais elevado o risco extremo de um “impeachment”. 

    O mercado até ensaiou uma trégua na abertura, diante do resultado da votação dos vetos, com o dólar negociado na mínima a R$ 4,0157, em baixa de 0,92%. Mas o alívio durou pouco e a trajetória de alta foi retomada.

    O peso da vitória do governo acabou sendo reavaliado, uma vez que a oposição conseguiu obstruir a votação de seis vetos importantes – entre eles, o reajuste dos servidores do Judiciário e de aposentados. Mas foram afirmações do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que ditaram a dinâmica do mercado. Pela manhã, ele disse que a CPMF “não passará” e, à tarde, que o “cerne da decisão do plenário” sobre o impeachment é a responsabilização por atos anteriores ao mandato. Nas duas situações, dólar e juros dispararam, chamando BC e Tesouro para o jogo. 

    “O mercado sabe que uma troca de governo é um buraco negro, uma situação que pode se arrastar por meses, e tem medo disso”, afirma o gestor de um grande fundo paulista, que prefere não ser identificado. “Hoje, mais do que ao ´downgrade´, investidores reagem a uma crise política.” 

    “Os investidores perderam a capacidade de tomar decisões. O preço deixou de ser um parâmetro e a dinâmica passa a ser determinante para o movimento”, explica o gestor de um grande fundo de São Paulo, que prefere não ser identificado. Não houve relatos de saída de recursos de estrangeiros, mas zeragem de posições, que acabam gerando perda para outros agentes. “É como jogar uma batata quente; as posições não desaparecem, então os agentes tentam jogá-las uns para os outros.” 

    Para tentar quebrar essa espiral negativa, o BC fez dois anúncios de leilões de linha de câmbio, ofertando até US$ 4 bilhões, fez um leilão de swap e já marcou um segundo para hoje. Já o Tesouro anunciou para hoje a recompra de até 1 milhão de NTN-Fs de seis vencimentos – títulos públicos prefixados – simultaneamente à oferta de venda de 150 mil papéis dos mesmos vencimentos. Nenhuma das ações foi capaz de dar respiro aos preços. 

    Para o sócio gestor da Modal Asset Management, Luiz Eduardo Portella, a atuação do Tesouro, que fará hoje o terceiro leilão de recompra de títulos em uma semana, a ação tem menos efeito sobre o mercado do que em outras ocasiões porque, desta vez, os preços reagem a uma crise interna. 

    Em 2008 e 2012, quando o Tesouro fez resgates antecipados de títulos, foram questões externas que geraram instabilidade. Ele destaca que esse nível do juro prefixado, tanto no mercado futuro quanto no de títulos públicos, é bastante preocupante, com potencial de gerar problemas para empresas que têm de rolar dívidas. “É um quadro de alerta, porque o custo dos financiamentos se baseia nos juros futuros, não na Selic.”

    Para o economista-chefe da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-RJ, José Márcio Camargo, o nervosismo do mercado financeiro reflete a preocupação com a solvência da dívida pública. “Existe um impasse: o governo não quer cortar gastos e a sociedade não quer aumentar impostos. O governo tem que entender que tem que ceder. É doloroso, mas é necessário.” Esse movimento, diz, não se traduz em fuga de capital. Uma saída de recursos ocorreria se investidores vissem “risco de fronteira”, ou seja, entendessem que o governo poderia vir a adotar medidas de controle de capital. “Isso não está acontecendo.” 

    O cupom cambial mostra não haver, por ora, uma saída forte de recursos, e recuou após os leilões de linha realizados pelo BC. A taxa do Forward Rate Agreement (FRA) de cupom cambial mais curto, que representa o juro em dólar no Brasil e é utilizado como um termômetro da oferta de dólares no mercado, fechou a 1,77% ante 1,94% do pregão anterior. Apesar da forte volatilidade nos mercados, o fluxo cambial segue comportado.

     

    Fonte: Valor Econômico

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