Entidades divulgam carta de boas-vindas ao professor L. Randall Wray

    Professor e pesquisador do Levy Economics Institute de Nova Iorque, L. Randall Wray, falou sobre “Teoria Monetária Moderna e sua aplicação para economias periféricas” na UnB

    Prezado Professor L. Randall Wray,

    É com enorme satisfação que recebemos o senhor neste momento delicado que atravessa o Brasil.

    Em nosso País, a Teoria da Moeda Moderna começou a ser debatida de forma mais ampla muito recentemente. E se por um lado é vista com ceticismo em determinados segmentos sociais, inclusive entre grupos progressistas, de outro também se observa que algumas de suas ideias centrais começam a ser incorporadas no debate. Assim vão se abrindo pequenas rachaduras nas paredes do dogmatismo fiscal.

    Sobre as críticas, do nosso ponto de vista elas resultam tanto do desconhecimento acerca de como se operacionalizam os gastos públicos, a arrecadação e a política monetária, quanto da dificuldade de mudar o modelo mental. E há também, é claro, uma faceta política envolvida, posto que uma política de empregador de última instância não necessariamente agrada a todos os segmentos da sociedade.

    No debate que faremos na Universidade de Brasília no dia 25 de novembro, os membros da mesa e grande parte da audiência conhecem razoavelmente bem o assunto. Isso nos anima a sugerir que, após apresentar os pontos centrais da MMT, o senhor procure também abordar os constrangimentos mentais e institucionais que precisam ser superados – especialmente em economias periféricas – para que possam ser implementadas políticas econômicas soberanas.

    No intuito de contribuir para o debate, elencamos alguns pontos sobre a institucionalidade brasileira que talvez possam fornecer uma visão geral das nossas circunstâncias e desafios atuais:

    1. No último dia 05 de novembro, o presidente Jair Bolsonaro, o Ministro da Economia Paulo Guedes e o líder do Governo do Senado apresentaram ao Congresso Nacional as Propostas de Emendas à Constituição números 186, 187 e 188/2019, com uma série de mudanças nos instrumentos de planejamento e orçamento brasileiro, em sentido oposto ao preconizado pela MMT.
    1. Na nossa visão, caso tais mudanças sejam aprovadas, teremos um regime fiscal ainda pior do que o atual, que já é caracterizado pela sobreposição de três controversas e contraproducentes regras: a “regra de ouro”, a meta de resultado primário e o teto de gastos.
    1. A “regra de ouro”, conforme determina a Constituição Federal promulgada em 1988, impede o financiamento de despesas correntes mediante endividamento público, dado que isso supostamente não beneficia gerações futuras. Sabemos, no entanto, que certas despesas correntes, como nas áreas de saúde, educação, ciência, tecnologia e inovação, podem beneficiar gerações futuras. Ao invés de sugerir a revogação dessa regra, que passou a ser descumprida em 2019, as emendas constitucionais propostas por Bolsonaro/Paulo Guedes estabelecem que diante do seu descumprimento uma série de gatilhos serão automaticamente acionados impondo a redução de despesas atualmente obrigatórias. A jornada de trabalho dos servidores públicos, por exemplo, será reduzida em 25%, com redução proporcional da remuneração.
    1. A segunda regra fiscal vigente no Brasil é a meta de resultado primário. De acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, instituída em 2000, as Leis de Diretrizes Orçamentárias, aprovadas anualmente no Brasil, precisam definir metas de resultado primário que, caso descumpridas, resultarão em crime de responsabilidade do chefe do poder executivo, que será punido com o impeachment. Esse inclusive foi o argumento formal que embasou o impeachment da Presidente Dilma Rousseff, em 2016.
    1. Após o impeachment de Dilma Rousseff, assumiu a presidência seu vice, Michel Temer, que encaminhou ao Congresso Nacional a proposta de emenda à constituição que foi aprovada ainda em 2016, instituindo a terceira regra fiscal atualmente vigente no Brasil: a proibição do aumento real das despesas primárias da União durante 20 anos.
    1. A Constituição brasileira institui três instrumentos de planejamento e orçamento propostos pelo Poder Executivo e aprovados pelo Poder Legislativo: o Plano Plurianual (vigência de 4 anos), a Leis de Diretrizes Orçamentárias (vigência de 1 ano) e a Lei Orçamentária Anual (vigência de 1 ano).
    1. As propostas apresentadas por Bolsonaro-Paulo Guedes extinguem o Plano Plurianual, sem substituí-lo por outro instrumento de planejamento de médio ou longo prazo, que venha a orientar a alocação orçamentária.
    1.  Além disso, as emendas constitucionais propostas implicam na prática a redução dos recursos orçamentários direcionados para a Saúde e Educação, contrariando o contrato social firmado na Constituição de 1988, que revela prioridades da sociedade brasileira.
    1. A premissa básica para a adoção de medidas dessa natureza é a suposição de que o Estado brasileiro estaria falido. Sabemos que não é possível que países quebrem em sua própria moeda. Ademais, o Banco Central do Brasil dispõe de aproximadamente US$ 380 bilhões em reservas internacionais. Além disso, o regime cambial vigente no Brasil é o de câmbio flexível “sujo”, de maneira que eventuais ataques especulativos contra a moeda brasileira podem ser contornados sem maiores problemas.

    É esse o quadro presente da política econômica brasileira. Diante da já precária situação econômica que enfrentamos – o PIB de 2018 ainda não voltou ao patamar de 2014 após duas quedas sucessivas, de cerca de 3%, em 2015 e 2016, e crescimento pífio nos anos seguintes –  com a taxa de desemprego ao redor de 12% seria uma irresponsabilidade não pensar nas consequências desse conjunto de políticas de austeridade sobre o tecido social e sobre a própria democracia.

    É neste sentido e diante desse contexto que estamos promovendo o presente debate. Nossa esperança é sensibilizar mais alguns corações e mentes acerca da urgência de construirmos um novo arranjo político e institucional que oriente a política econômica brasileira tendo a MMT como importante fonte de inspiração.

    Brasília, 25 de novembro de 2019.

     

    Associação Brasileira dos Economistas pela Democracia – ABED

    Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Planejamento e Orçamento – Assecor

    Sindicato Nacional dos Auditores e Técnicos Federais de Finanças e Controle – Unacon

    Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central – Sinal

    Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado – Fonacate

    Fonte: UNACON

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