Depois de encolher em termos reais, em dólar, de 2014 para 2015, no ano passado o segmento de fortunas voltou a mostrar vigor no Brasil, com incremento da ordem de 10,3%, para US$ 1,4 trilhão ao fim de 2016, resultado auxiliado pelo bom desempenho da bolsa e dos títulos de renda fixa, mas também pela maior atividade em fusões e aquisições. Até 2021, as estimativas são de um crescimento anual composto de 9,1%, chegando a US$ 2,2 trilhões, segundo estimativas da Boston Consulting Group (BCG).
Os dados foram extraídos de pesquisa global da consultoria, que entrevista os principais bancos especializados em gestão de fortunas. O recorte de Brasil, disponibilizado ao Valor, considera apenas a parcela local do patrimônio financeiro – começa no público afluente, com patrimônio entre US$ 250 mil e US$ 1 milhão investidos, e chega ao topo da cadeia, com os indivíduos ou famílias que têm mais de US$ 100 milhões aplicados.
“O principal fator para esse resultado foi o investidor ter poupado mais para o futuro, dando impulso à previdência, num momento em que houve forte apreciação de ativos tipicamente de renda fixa”, diz o sócio sênior da consultoria, André Xavier. “Mas também tem dinheiro novo.”
Após três anos de queda do PIB per capita, com um decréscimo real de 11%, o especialista vislumbra o crescimento da renda disponível nos próximos anos. E, num momento de queda de Juros, um passo em direção à diversificação.
Apesar do imbróglio político tornar o cenário macro mais turvo, extrapolando para anos à frente, Xavier vê a parcela aplicada em ações pelas famílias brasileiras crescer progressivamente. As projeções mostram essa participação subindo de 14% para 18% até 2021 na parcela mais rica da população, com mais de R$ 100 milhões, e de 13% para 17% entre os que reúnem de R$ 20 milhões a R$ 100 milhões.
Conforme compara, enquanto nos Estados Unidos 70% da alocação está em renda variável, e na Europa varia entre 30% e 40%, no Brasil essa parcela se limita a 5%. “A premissa é que apesar de viver um momento difícil, o Brasil tem potencial de grande economia e de geração de riquezas, e que pela sua demografia tem necessidade de Poupança de longo prazo. A renda variável seria um desses motores”, diz. “Mas demora até que a base instalada receba novos aportes, leva tempo para mudar a agulha. Precisa de muitos anos de estabilidade econômica para isso.” Tradicionalmente, acrescenta, o percentual em ações aumenta com o patrimônio das pessoas.
À luz da redução dos Juros, o Credit Suisse Hedging-Griffo (CSHG) ampliou a parcela investida em fundos multimercados, mas não tem dado recomendação para aumentar a alocação em bolsa neste momento, diz o executivo-chefe da área de private banking, Marco Abrahão.
Após a delação do grupo JBS colocar no centro do estresse político o presidente Michel Temer, a instituição tem privilegiado títulos prefixados nas suas sugestões mais táticas, e menos papéis atrelados à inflação. Tradicionalmente, porém, no perfil moderado a instituição reserva de 5% a 10% para aplicações em bolsa.
Outra tendência de diversificação em meio ao ciclo de corte de Juros que pode levar a taxa Selic para 8,25% ao ano, dos 10,25% atuais – conforme as projeções no boletim Focus do Banco Central -, tem sido a alocação em ativos no exterior, afirma Flavio Souza, diretor-executivo da divisão de gestão de riquezas do Itaú Unibanco.
“Com a taxa caindo a um dígito, o juro real fica mais próximo ao do investidor externo, então a tendência é ir nessa direção, onde as alternativas de instrumentos financeiros são mais amplas do que no Brasil”, diz.
Segundo o diretor do private bank local do Itaú, Luiz Severiano, com a inflação sob controle, a instituição financeira também está mais otimista com o risco em títulos prefixados.
A onda de Juros altos no Brasil coincidiu com um período de oferta de títulos isentos, sem incentivos para o investidor tomar outro tipo de risco. Mas, com a queda da Selic, produtos de maior valor agregado tendem a ser privilegiados, diz Sérgio Magalhães, superintendente-executivo do Bradesco Private Bank.