O Ministério da Fazenda trabalha numa proposta de acerto de contas entre a União e o BNDES para quitar o estoque de R$ 24,5 bilhões das “pedaladas fiscais” e cumprir a exigência feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) de que as contas sejam regularizadas.
A decisão dependerá da estratégia fiscal do governo para este ano e 2016. Apesar de já estar claro que a União não cumprirá a meta, já reduzida, de superávit primário de 0,15% do PIB para este ano, o governo ainda discute a magnitude do que pode ser considerado um déficit aceitável que não piore ainda mais as avaliações da nota de crédito do país.
O Valor apurou que há grande resistência na equipe econômica em fazer simplesmente o pagamento dos subsídios atrasados. A avaliação é que isso significaria na prática uma transferência de recursos para o BNDES, elevando a capacidade de empréstimo da instituição. O governo também quer garantir que não haja impacto na dívida bruta da União, principal indicador da solvência do país, que já atingia 65,3% do PIB em agosto. Em qualquer cenário – a quitação das pedaladas ou o acerto de contas – haverá déficit primário para a União.
Atualmente, o crédito das pedaladas está contabilizado no patrimônio de longo prazo do BNDES. Se o Tesouro Nacional emite títulos para pagar a dívida, esse crédito melhora de qualidade e passa a ser equivalente a dinheiro no caixa. Com isso, o banco passa a ter mais liquidez para conceder financiamentos. O resultado acaba sendo praticamente o mesmo das transferências de mais de R$ 300 bilhões que a União fez ao BNDES e que foram suspensas pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Da mesma forma que o BNDES é credor do Tesouro, o Tesouro também tem créditos com o banco oficial. A proposta em estudo é que, ao mesmo tempo em que o Tesouro faça o pagamento ao BNDES, o banco faça um adiantamento no mesmo valor do pagamento de juros que deve à União sobre os empréstimos feitos para financiar o Programa de Sustentação ao Investimento (PSI), além da política anticíclica do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.
O BNDES renegociou a dívida com o Tesouro Nacional em março de 2014, quando o desembolso dos juros sobre os empréstimos da União aumentaria. Além de reduzir os juros cobrados, o banco ganhou seis anos de carência para começar a pagar juros (2020) e 26 anos para o pagamento do principal (2040). Os juros pagos entre o sétimo e o 21º ano serão equivalentes a um terço da TJLP e sempre limitados a 6% ao ano.
A discussão no momento é se o governo precisa de uma lei para autorizar o encontro de contas com o banco. A Fazenda estuda se a operação não pode ser vista apenas como um adiantamento do BNDES a seu controlador. O argumento contrário é que será preciso de autorização legal para mudar as condições contratuais acordadas com o banco de fomento.
Outra dificuldade é o impacto que o pagamento pode ter sobre a capacidade de o BNDES honrar os empréstimos que já foram feitos, assim como a capacidade do banco fazer novos financiamentos nos próximos anos. Essas contas, que estão sendo feitas pelos técnicos do governo podem definir, inclusive, o valor que o governo considera possível pagar nesse ano.
A decisão já tomada pelo TCU, da qual o governo recorre e ainda não tem resultado, exige que o Banco Central contabilize a dívida do BNDES, além das demais “pedaladas”, na dívida pública. Quando isso for feito, haverá impacto imediato sobre a dívida bruta. O efeito do acerto de contas sobre o primário será integral, mas é diferente nas dívidas líquidas e bruta.
Na contabilidade da dívida líquida, um crédito da União contra o BNDES, que são os contratos de empréstimo, será substituído por um fluxo de caixa, na forma do adiantamento de juros. O resultado final sobre a dívida líquida, porém, será negativo. A dívida sobe nesse conceito contábil, porque haverá déficit primário quando o Tesouro pagar ao BNDES.
No caso da dívida bruta, o efeito será neutro. O endividamento bruto aumenta quando o governo reconhece e paga a dívida junto ao BNDES, devido ao mesmo resultado primário negativo. Mas cai em valor equivalente ao dinheiro que receber do banco.
Fonte: Valor Econômico