O governo anunciou ontem um pacote de R$ 66,2 bilhões para garantir a meta de superávit primário de 0,7% do PIB em 2016 em que a metade dos recursos – R$ 32 bilhões – depende da recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), considerada politicamente inviável há duas semanas pelo próprio Poder Executivo. De tudo o que foi proposto, R$ 62,2 bilhões ainda dependem de aprovação do Congresso Nacional.
“São dois milésimos da entrada de cinema para fortalecer a Previdência Social, para pagamentos de aposentados, de benefícios a idosos e aos aposentados do Brasil. Os dois milésimos que tem que pagar no sanduíche vão dar bastante energia para a economia”, disse o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ressaltando a nova roupagem que o governo achou para a CPMF.
O aumento de receitas previsto no pacote não se restringe à CPMF. Reduções de gastos tributários e elevação de outros tributos somarão mais R$ 7,7 bilhões. Além disso, o governo quer ficar com 30% das receitas do Sistema S (Sesi, Sesc, Senac, Sebrae), estimado em R$ 6 bilhões, para financiar gastos com a Previdência. Com isso, 62% de todo o esforço anunciado serão cobertos por mais tributação.
O corte de gastos anunciado para fechar a conta do superávit é de R$ 26 bilhões. A maior parte deste esforço (R$ 12,4 bilhões) virá da transferência de despesas que hoje são da União para outras fontes, notadamente as emendas parlamentares e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A proposta do governo é que R$ 7,6 bilhões de despesas da Saúde e do PAC sejam cortadas, mas que os parlamentares usem as emendas ao Orçamento para evitar o corte. O mesmo deve ser feito no Minha Casa, Minha Vida. Neste caso, o governo fala numa redução de R$ 4,8 bilhões no orçamento do programa, mas pretende que o FGTS cubra essas despesas com recursos próprios do fundo.
Os cortes de fato recairão sobre a folha de pagamentos e chegam a R$ 10,5 bilhões, sendo as principais medidas o adiamento do reajuste dos servidores federais de janeiro para agosto, a suspensão de concursos públicos e o fim do bônus pago aos servidores que podem se aposentar mas preferem continuar trabalhando. A redução de despesas correntes do governo é de apenas R$ 2 bilhões e o setor agrícola ficará sem R$ 1,1 bilhão para a política de preços mínimos.
Para garantir que as medidas entrem em vigor, o governo terá que aprovar no Congresso duas propostas de emenda constitucional, uma delas a da CPMF, além de alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias e enviar três projetos de lei. Além disso, todas as medidas de aumentos de receitas serão feitas por meio de medidas provisórias, que o Congresso terá que aprovar depois. Isso no momento em que o governo não tem um ministro na coordenação política e a popularidade da presidente Dilma Rousseff está em 8%, uma baixa histórica.
“Procuramos compor [o ajuste fiscal] da maneira menos distorcida e mais eficiente, dividir o esforço [entre todos] para alcançar o necessário equilíbrio orçamentário. É um orçamento que impõe esforço de todos”, justificou o ministro Joaquim Levy.
O governo quer que a CPMF seja cobrada por quatro anos a uma alíquota de 0,2%, o que renderia R$ 32 bilhões ao ano para o governo federal. É pouco provável, no entanto, que esta alíquota se mantenha. As negociações com governadores e prefeitos preveem o aumento da CPMF para 0,38%, sendo a diferença transferida para os cofres estaduais e municipais.
De acordo com o ministro Levy, será necessário cobrar a CPMF por quatro anos porque o governo tem que “continuar a fortalecer o lado fiscal e o superávit de 0,7% do PIB não pode continuar a vida toda”. Mas Levy afirma que o governo “tem sensibilidade” e pode reduzir a alíquota antes do prazo.
Além da CPMF, o governo também está propondo ao Congresso uma redução de benefícios tributários para aumentar sua receita no ano que vem. O Reintegra, que devolve impostos pagos nas exportações, terá alíquota reduzida para 0,1% no ano que vem. Outra medida proposta é a limitação das deduções que as empresas podem fazer quando distribuem lucros por meio de um mecanismo chamado de juros sobre capital próprio. Neste caso, o governo fixará em 5% a taxa que vai remunerar este recursos e aumentar a alíquota cobrada de 15% para 18%.
O Sistema S, além de ficar sem 30% de sua receita, também passará a pagar pelo benefício tributário que o governo dá às empresas que investem em inovação e tecnologia. A estimativa é que esta medida garanta uma economia de R$ 2 bilhões ao Tesouro.
Houve também mudanças no imposto de renda cobrado sobre ganhos de capital, que o governo quer transformar em progressivo. Em vez de uma alíquota única de 15% cobrada no momento em que a venda de um bem é feita, a proposta é que a tributação chega a até 30% para operações acima de R$ 20 milhões num ano.
Fonte: Valor Econômico