Governo vai ampliar meta fiscal na próxima semana

    MUDANÇA NO ORÇAMENTO VISA EVITAR A PARALISIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS. DEFICIT PROJETADO PARA ESTE ANO PODERÁ CHEGAR A R$ 155 BILHÕES, COMO ANTECIPOU O CORREIO. PARA DEFINIR O NÚMERO, MEIRELLES QUER AVALIAR DISPOSIÇÃO DO CONGRESSO EM APROVAR REFORMA DA PREVIDÊNCIA

    Autor: ROSANA HESSEL

    O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deverá bater o martelo sobre a nova meta fiscal deste ano e a de 2018 na próxima semana, aumentando o deficit previsto nas contas públicas. Ele pretende esperar o resultado da votação da denúncia de corrupção contra o presidente Michel Temer na Câmara dos Deputados, marcada para hoje, para avaliar a disposição do Congresso Nacional de retomar as discussões da Reforma da Previdência e, assim, ter mais previsibilidade em relação às despesas, principalmente, as do ano que vem.

    A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) permite um rombo de até R$ 139 bilhões nas contas do governo federal deste ano. O presidente Michel Temer deu o aval para Meirelles fixar as novas metas fiscais. Os números não estão fechados, mas a meta deste ano não deverá ultrapassar um deficit de R$ 155 bilhões, conforme o Correio publicou no domingo passado. Fontes do governo argumentam que a nova meta não poderá ser maior que o deficit do ano passado registrado pelo Banco Central, de R$ 159 bilhões. O objetivo fiscal de 2018, que é de um saldo negativo de até R$ 129 bilhões, deve passar para R$ 140 bilhões.

    Riscos

    Meirelles também sofre pressões para liberar verbas do Orçamento o mais rápido possível. Técnicos que acompanham o caixa do Tesouro avisam que o dinheiro acaba no fim do mês e, por conta disso, será necessário afrouxar o contingenciamento de R$ 44,9 bilhões do Orçamento para evitar a paralisação dos serviços essenciais à população. A Receita Federal, por exemplo precisa de uma suplementação orçamentária. Vários fornecedores estão com os pagamentos atrasados, incluindo o Serpro, estatal de processamento de dados, cujos serviços só não foram cortados porque houve negociação.

    ‘Todos os órgãos da administração pública federal tiveram um contingenciamento muito forte, algo em torno de 45%, e isso vem tendo impacto nas atividades, trazendo muitas dificuldades para o funcionamento dos serviços’, disse o presidente do Sindifisco Nacional, Cláudio Damasceno.

    Nos últimos encontros com economistas, Meirelles foi bombardeado com afirmações de que a meta deste ano e a do próximo não serão cumpridas. Fontes próximas a Meirelles disseram que ele vem consultando gestores dos maiores fundos instalados no país sobre a alteração da meta fiscal e o que mais tem ouvido é que ele pode mudá-la, sem prejuízo à credibilidade da equipe econômica. Não à toa, ele vem considerando essa possibilidade de mudança – e já mudou o discurso.

    Desde 2014, as contas do governo federal fecham no vermelho, algo nada animador para o equilíbrio fiscal e a redução do endividamento público. As despesas crescem enquanto a receita encolhe mês a mês. Para piorar, os gastos com benefícios previdenciários e com pessoal, graças aos reajustes concedidos por Temer no ano passado, consumirão a maior parte das despesas neste ano, porque são as que mais aumentam.

    ‘Infelizmente, a realidade de não aprovar a Reforma da Previdência e dos aumentos salariais do ano passado está cobrando seu preço’, resumiu o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, ao comentar a inevitável mudança da meta fiscal. Ele lembrou que a frustração de receitas se acentuou após o agravamento da crise política, em maio. ‘Um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) que facilmente iria para a casa de 1% será menor, e isso joga a estimativa de arrecadação para baixo, sem falar na frustração com as receitas extraordinárias. Melhor ajustar logo de uma vez do que tentar remediar com soluções que não serão possíveis, especialmente em ano eleitoral’, completou.

    O atraso dos leilões de quatro usinas hidrelétricas da Cemig, que, pelos cálculos da Fazenda, podem render R$ 11 bilhões, contribuirá para a frustração de receitas neste ano. Outro valor que está contabilizado e pode não se concretizar é a do Novo Refis, de R$ 13 bilhões, devido às alterações feitas no projeto de lei pelo relator, deputado Newton Cardoso (PMDB-BA), que reduz a arrecadação para menos de R$ 500 milhões.

    A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, estima um deficit de R$ 148 bilhões neste ano e crescimento de 0,3% no PIB. ‘No ano que vem, será mais difícil cumprir a meta sem a Reforma da Previdência. A emenda do teto será mais apertada, porque será o equivalente à inflação acumulada em 12 meses até junho, que foi de 3%. Isso vai fazer com que, inevitavelmente, o governo corte despesas com saúde e educação, que estão incluídas nos gastos não obrigatórios, porque não poderão suspender os aumentos salariais já concedidos’, disse.

    BC confirma: Selic vai cair

    Após reduzir a Taxa Básica de Juros (Selic) de 10,25% para 9,25% ao ano, o Banco Central (BC) voltou a sinalizar que pode promover novo corte de um ponto percentual em setembro. As indicações foram apresentadas na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, divulgada ontem. A equipe de Ilan Goldfajn demonstrou menor preocupação com o andamento das reformas no Congresso Nacional, o que pode facilitar o processo de redução de Juros. A mudança de tom do colegiado em relação a aprovação das medidas de ajuste fiscal foi perceptível para os analistas. Na ata de maio, o Copom citou a palavra ‘incerteza’ 17 vezes. No documento de ontem, o termo apareceu oito vezes.

    Dívida cresce mesmo com Juros em queda
    HAMILTON FERRARI
    ESPECIAL PARA O CORREIO

    Mesmo com a Taxa Básica de Juros, a Selic, em forte ritmo de queda, o custo do setor público com o pagamento de encargos financeiros está aumentando, em consequência da manutenção de uma máquina administrativa inchada e extensa, que consome mais do que o governo arrecada. No primeiro semestre, a dívida pública subiu 19,2%, em comparação com o mesmo período de 2016, um incremento de R$ 206,6 bilhões. No total, o setor público deve hoje R$ 4,8 trilhões. Os mais otimistas preveem que o endividamento só vai parar de crescer em 2021, mas há quem veja uma interrupção apenas daqui a sete anos.

    A dívida aumenta porque, como a arrecadação não é suficiente para custear os gastos, que não param de subir, o governo se toma recursos continuamente, mediante a venda de títulos, por exemplo, para cobrir as despesas. Como o Correio mostrou recentemente em uma série de reportagens, no Brasil, o custo dos Três Poderes é exagerado, e os serviços que eles entregam à sociedade em troca dos impostos arrecadados deixam a desejar.

    Em comparação a países emergentes que têm uma economia de tamanho similar, a dívida pública brasileira é muito mais elevada. Enquanto essas nações convivem com dívidas equivalentes a 30% ou 40% do Produto Interno Bruto (PIB), a do Brasil estava 73,1% em junho passado, de acordo com o Banco Central. No início de 2019, segundo projeções do mercado, a relação dívida-PIB deve chegar a 80%.

    Diante desse cenário, as agências internacionais de risco podem reduzir novamente a nota de crédito do país, como fizeram há dois anos. Um novo rebaixamento trará sensação de pessimismo e pode provocar fuga de investidores estrangeiros do país.

    Segundo Luiz Castelli, economista da GO Associados, a grande discussão é até onde os credores vão financiar a dívida brasileira. ‘A situação está cada vez mais complicada. O risco em relação ao país é notório, porque o Brasil pode não conseguir colocar um freio no estoque crescente. Isso pode acarretar a desvalorização dos ativos brasileiros’, afirmou.

    O economista Roberto Piscitelli, especialista em contas públicas, destacou que quanto mais o país se endivida, mais os credores exigem garantias para continuar emprestando. Além disso, a desconfiança com a capacidade de pagamento se eleva e o risco pode ficar incontornável. ‘Mesmo em queda, os Juros praticados no país estão entre os maiores do mundo. Então, o perigo é que o país perca o controle de suas dívidas’, comentou.

    Fonte: Correio Braziliense

    Matéria anteriorFazenda tenta conter pressão para rever aperto fiscal e liberar gastos
    Matéria seguinteEmpresas buscam substituir mão de obra por terceirizado