Grécia ganha mais uma chance da UE

    Alemanha e França pedem que o país apresente nova proposta ao grupo, que contemple reformas econômicas a fim de retomar o fluxo de recursos

    A Europa manteve as portas abertas para negociar com a Grécia mesmo depois da vitória estrondosa do “não”. No domingo, 61% dos gregos rejeitaram as exigências da última proposta de resgate dos credores internacionais. Em nova tentativa de salvar o euro, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente da França, François Hollande, decidiram conceder mais uma chance ao país endividado, mas pediram que o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, apresente “rapidamente” novas propostas que contemplem reformas econômicas para conseguir a liberação de recursos. 

    A Grécia tem até 20 de julho para pagar 3,5 bilhões de euros ao Banco Central Europeu (BCE). Se a dívida não for paga, deixará o BCE impedido de emprestar à Grécia por estatuto. Na semana passada, o país já deu um calote de 1,6 bilhão de euros no Fundo Monetário Internacional (FMI). Ontem, a diretora do FMI, Christine Lagarde, avisou a Tsipras que o fundo não vai liberar crédito até a Grécia pagar dívida. Tsipras reagiu e ligou para Angela Merkel, garantindo que novas propostas serão apresentadas ainda hoje. 

    Para contornar a situação, no lugar do intransigente Yanis Varoufakis, que renunciou ao cargo de ministro das Finanças depois do resultado do referendo do último domingo, o governo grego anunciou Euclid Tsakalotos, atual coordenador da equipe negociadora, como substituto. Tsakalotos, um economista discreto que acumula a função de vice-ministro das Relações Exteriores, também é membro da coalizão radical, da qual Varoufakis faz parte, mas é mais ponderado, dizem especialistas. 

    De acordo com o economista Paulo Eduardo Nogueira Gomes, da AZ FuturaInvest, Tsakalotos, 55 anos, foi uma escolha positiva para dar continuidade às negociações. Encarregado dos assuntos econômicos internacionais e formado em Oxford, o novo ministro das Finanças, nomeado, no fim de abril, coordenador da equipe grega de negociações em Bruxelas após o isolamento de Vafourakis nas reuniões da Zona do Euro, terá a dura tarefa de recuperar a confiança do seu país diante dos grandes bancos e instituições financeiras europeias. 

    “Os gregos disseram no referendo que merecem algo melhor e que não podem aceitar um acordo inviável”, declarou o novo ministro, após assumir o cargo. “Vamos continuar as negociações. Espero que algo mude na Europa”, disse Tsakalotos, que admitiu ter um certo medo ao assumir seu cargo “em um momento que não é nada fácil na história grega”. 

    De fato, a missão dele é difícil. Paulo Gomes, da AZ, explicou que a Grécia é um país pesado, de alto custo, no qual 49,7% dos jovens estão desempregados, 26% das pessoas economicamente ativas também estão desocupadas e um quinto da população é de aposentados. “As pensões custam 18% do PIB (Produto Interno Bruto). A situação grega colocou a Zona do Euro em xeque porque, se os países credores afrouxarem as exigências, as outras nações que passaram por crises (Espanha, Portugal, Irlanda) vão querer o mesmo tratamento. Se mantiverem o aperto, é possível que a Grécia saia do grupo, o que vai encolher ainda mais a moeda”, disse. 

    Ontem, o euro caiu 0,37% em relação ao dólar, cotado em US$ 1,10, e as principais bolsas europeias fecharam em queda pelos temores de que a Europa recuse as demandas por austeridade dos credores e do impacto da crise grega na zona do euro. Em Paris, o CAC 40 caiu 2,01%, a 4.711.54 pontos, enquanto em Frankfurt o DAX 30 teve queda de 1,52%, a 10.890,63 pontos. Fora da Eurozona, o FTSE 100 recuou 0,76% em relação ao fechamento de sexta-feira, a 6.535,68 pontos.

     

    Respingo na Bovespa

    A vitória do “não” no referendo de domingo, com os gregos rejeitando as medidas de austeridade fiscal, também respingou no Brasil. Depois de cair forte pela manhã, ainda na esteira da consulta popular grega, o Ibovespa, índice da Bolsa de Valores de São Paulo, teve leve alta, mas fechou em queda de 0,76% a 52.119 pontos. A queda foi a maior em três meses e rompeu o patamar de 52.500 pontos, mantido desde março. A moeda norte-americana também teve um dia de grande volatilidade. No fechamento do pregão, o dólar teve alta de 0,09% cotado a R$ 3,142.

     

    Banco fica fechado

    Os bancos gregos vão permanecer fechados até amanhã. Desde a semana passada, apenas algumas agências estão funcionando, e só para pagamentos de aposentadorias. Nos caixas eletrônicos, os saques estão limitados a 60 euros, o que preocupa a população e também os gregos que moram no Brasil. Ontem o conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE) decidiu manter o aporte de empréstimos às instituições financeiras do país “no mesmo nível de 26 de junho”. Naquela data, o crédito autorizado era de 89 bilhões de euros.  

    Gregos e descendentes que moram fora não poupam esforços para ajudar os parentes em Atenas. A situação, contudo, não é algo inédito, garante o presidente da Comunidade Grega de Brasília, Dionyzio Antônio Martins Klavdianos, 51 anos. “Esse procedimento é muito adotado. O envio de dinheiro de imigrantes é uma das três principais fontes de renda do país”, disse.  

    Klavdianos assegura que o cenário político-econômico do país é delicado, mas não aterrador. “O grego, por si só, é desesperado. O desemprego atingiu muitas famílias, a massa salarial encolheu, mas muitas pessoas estão conseguindo sobreviver”, afirmou ele, que ainda não prevê um ambiente de desabastecimento de itens de primeira necessidade. “Liguei para familiares e todos estavam muito felizes com a vitória do “não”. Estão confiantes de que, agora, o país terá condições mais favoráveis de negociação e mais chances de crescimento”, justificou. 

    A situação dos compatriotas preocupa o padre Emanuel Sofoulis, 79, da Igreja Ortodoxa Grega em Brasília. Nascido na ilha grega de Samos, faz três décadas que mora na capital federal. “O povo está sendo muito sacrificado nos últimos anos, principalmente a camada mais pobre da população, que sente muito mais os impactos econômicos”, disse. 

    Ao contrário do presidente da comunidade grega, Sofoulis teria votado no “sim” caso estivesse na Grécia. “Para a retomada da economia, não existe milagre. Tem que apertar o cinto e fazer uma política austera. O governo não deve entrar na conversa de nacionalizar os bancos e não promover uma economia aberta para os investidores”, avaliou.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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