A aceleração da inflação neste ano tende a dificultar o cumprimento das metas atuariais pelas entidades de previdência complementar. Com uma projeção de 9,15% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), segundo relatório de mercado do Banco Central, e os juros médios de 5,5% relativos ao passivo dos planos, o objetivo anual de rentabilidade dos fundos de pensão chega próximo de 15% – nível bastante alto para ser atingido, principalmente no ambiente apático em que se encontra a economia brasileira.
“Acho difícil a indústria bater a meta neste ano”, diz José Ribeiro Neto, presidente da Abrapp, associação que representa as fundações. O executivo avalia que as melhores expectativas em relação ao ajuste fiscal e à retomada da economia no segundo semestre não devem se concretizar. Em razão do cenário negativo, o desempenho de outras aplicações que não aquelas atreladas aos títulos do Tesouro Nacional, como ativos de renda variável ou operações estruturadas perderão em desempenho.
Por outro lado, lembra, as aplicações no exterior tendem a trazer bons resultados. As operações de empréstimos a participantes também devem contribuir positivamente, uma vez que o retorno está atrelado à meta atuarial de cada plano. No entanto, esses dois investimentos representam menos de 4% da carteira média do setor.
A perspectiva sobre o cumprimento da meta atuarial muda de acordo com as carteiras e o passivo de cada plano. Para o vice-presidente de Investimentos da SulAmérica, Marcelo Mello, quem estiver mais posicionado em títulos do governo, principalmente atrelados à variação do IPCA, aproveitará os retornos mais gordos pagos pelo Tesouro Nacional por causa do arrocho da política monetária e garantindo a rentabilidade para seu passivo.
Essa estratégia pode servir, inclusive, para planos com obrigações indexadas a outros índices de inflação, como o IGP-M e o IGP-DI. As projeções de analistas de mercado captadas pelo BC indicam alta de 7,46% e 7,64%, respectivamente, para esses dois indicadores em 2015. “Tudo vai depender muito de como está a composição das carteiras, mas a rentabilidade total pode ser um pouco prejudicada”, enfatiza Mello.
De acordo com os dados mais recentes da Abrapp, associação que reúne as entidades de previdência complementar, o sistema tinha, em março, 65% de seu patrimônio alocado em renda fixa. Do total, apenas 12,7% de seu patrimônio estava aplicado em títulos públicos e 48,4% em fundos de investimento em renda fixa. Ações e fundos de investimento em renda variável correspondiam, juntos, a 24% dos recursos geridos pelas entidades.
“Os que estiverem mais expostos terão perdas maiores em todos os ativos que não acompanham a inflação, como nos mercados de ações e de imóveis”, diz o professor de finanças José Roberto Savoia, da FEA-USP, ex-secretário de Previdência Complementar. “É uma situação de um jogo perverso. Na melhor das condições, os fundos conseguem se proteger”. Ele lembra que, na busca pelo rendimento, a isenção do Imposto de Renda concedida às aplicações financeiras feitas pelas fundações é um diferencial vantajoso para o resultado, mas ainda há os custos.
O Valia, fundo dos funcionários da Vale, é um exemplo de que existe a dificuldade para se atingir a meta, mesmo tendo recorrido à segurança dos títulos públicos atrelados à inflação.
Segundo Maurício Wanderley, diretor de investimentos e finanças da fundação, no consolidado dos três planos que somam R$ 19 bilhões de patrimônio, 76% estão aplicados em renda fixa, dos quais 90% em papéis com rentabilidade atrelada ao IPCA. Ainda assim, nos primeiros seis meses deste ano, o retorno nominal global obtido por todas as classes de ativos ficou em 7,07% ante uma meta atuarial para o mesmo período, de 9,3%. “Os títulos do governo atrelados à inflação são uma proteção natural. Eles amenizam o impacto, mas não eliminam o risco”, disse o executivo.