Juros baixos mudam dinâmica no câmbio

    Lucas Hirata | De São Paulo

    Os Juros mais baixos abrem caminho para uma nova dinâmica no mercado de Câmbio, que deve contar menos com o efeito da entrada de capital de curto prazo. A redução desse fluxo – direcionado pelas taxas tradicionalmente altas no país – já foi percebida em 2017 e ajudou a explicar a leve desvalorização cambial observada no período.

    Segundo estudo preparado pelo Departamento Econômico do Santander, é possível atribuir à redução agressiva da Selic ao longo do ano parte da depreciação cambial observada num período em que uma série de fatores apontavam para o fortalecimento da divisa brasileira. O real terminou o ano passado com perda de 1,90% contra o dólar. Já um dos principais modelos do banco indicava que a moeda poderia ter ganhado até 11%, com base na queda da divisa americana ante as principais moedas globais, na alta das commodities, na redução do prêmio de risco e na melhora das contas externas do Brasil.

    Com a menor expectativa de rentabilidade, o fluxo de curto prazo entrou no território negativo nos últimos anos. Segundo levantamento do Santander, houve saída de capital de cerca de US$ 30 bilhões nos 12 meses até outubro de 2017, relativos a operações de curto prazo destinadas principalmente a renda fixa. Volume que contrasta com a entrada de US$ 61 bilhões em 2014, pico mais recente. Já componentes menos voláteis da balança de pagamentos continuam a registrar fluxo positivo: o saldo era de US$ 51 bilhões nos 12 meses até outubro de 2017, devido, principalmente, ao aumento do investimento estrangeiro direto e à queda do Déficit da conta corrente.

    O que explica essa nova dinâmica é que, com a redução da distância entre a taxa de Juros local e a externa, fica menor a atratividade das operações de “carry trade”, em que o investidor capta recursos a taxas mais baixas em mercados globais para aplicar em outras praças, a taxas mais elevadas. Desde 2009, o prêmio esperado para investimento no mercado interno contra o externo, em produtos de renda fixa de cinco anos, oscilava em torno de 6%. Agora, essa medida foi reduzida para o intervalo de 3% a 4%.

    “Está acontecendo uma mudança de paradigma na economia brasileira; pela primeira vez temos uma política monetária expansionista o suficiente para contrair o prêmio esperado aqui”, diz o economista-chefe do Santander Brasil, Mauricio Molon. Agora em níveis mais próximos dos padrões internacionais, os Jurosganham peso no Câmbio. “Antes, os movimentos de Juros não faziam muita diferença no Câmbio porque o prêmio local era muito elevado”, afirma.

    A redução do fluxo de curto prazo não significa, necessariamente, algo negativo para a economia brasileira, na avaliação do economista. Isso porque as contas externas estão mais robustas e a dependência de capital de curto prazo diminuiu, deixando o país menos exposto a mudanças de humor lá fora. “Mesmo com essa transição, o Brasil está menos vulnerável porque estamos abrindo mão da necessidade de capital de curto prazo”, acrescenta.

    Para 2018, persiste a leitura de que esse fluxo se manterá negativo diante de uma Selic ainda mais baixa. A Taxa Básica de Juros deve cair de 7% para 6,75% em fevereiro, permanecendo assim até 2019, de acordo com a estimativa no Santander Brasil. O dólar, por sua vez, deve terminar o ano de 2018 em R$ 3,50 ante o nível atual de R$ 3,23.

    Por ora, o Câmbio ainda conta um cenário externo favorável para a tomada de riso e uma trégua na cena política brasileira. Na primeira semana de 2018, o dólar acumulou queda de 2,44%, sendo cotado a R$ 3,2327. Considerando apenas as quatro sessões iniciais dos últimos anos, este foi o maior recuo desde o começo de 2009, quando a moeda caiu 4,02%.

    No entanto, grande parte das variáveis aponta para dólar mais forte e depreciação do real no ano, de acordo com Molon. O risco-país deve ser afetado por incertezas eleitorais enquanto a recuperação da atividade tende a elevar o Déficit em conta corrente. Lá fora, a desaceleração da economia chinesa coloca em risco a valorização de commodities enquanto o aperto monetário nos EUA deve pressionar o dólar.

    Com a redução do diferencial de Juros, outro impacto no mercado é a queda do custo das operações de proteção contra oscilações da moeda, o hedge cambial. Ao longo de 2018, na avaliação de Molon, será observado um crescimento da utilização do hedge pelas empresas. E conforme isso se concretiza, os bancos – que oferecem a proteção – precisam fazer a contrapartida do negócio e aumentar suas posições no exterior, intensificando o fluxo negativo de capital. “As incertezas eleitorais podem afetar a demanda por hedge conforme as empresas buscam alternativas no mercado”, explica.

    Fonte: Valor Econômico

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