Autor: Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro
Com a eventual queda da Medida Provisória (MP) 784, o governo tem uma alternativa na manga para tentar viabilizar as mudanças na legislação da leniência e permitir que o Banco Central (BC) e Comissão de Valores Mobiliários (CVM) assinem acordos com Instituições Financeiras, mas a proposta está parada na Câmara dos Deputados há mais de um ano, desde o governo Dilma Rousseff, enterrada pela polêmica sobre o tema.
“Temos o PL 3636 [que modifica a tramitação dos acordos de leniência]. Podemos retomar a discussão para tratar também da leniência do sistema financeiro dentro desse projeto”, disse o líder do governo na Câmara deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que participou de reunião ontem de manhã com os presidentes do BC, Ilan Goldfajn, e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O projeto, contudo, está envolto em polêmicas. Relatado pelo deputado André Moura (SE), hoje líder do governo no Congresso, esse projeto causou polêmica no fim do governo Dilma, quando as grandes empreiteiras ainda começavam a colaborar com a Justiça na Lava-Jato. Políticos, empresários e sindicalistas tentaram alterar a legislação para que o Ministério Público ficasse de fora dessas negociações.
Para o líder do governo, o cenário é diferente hoje, com a sociedade e os parlamentares mais informados sobre esse tipo de negociação. “Discutir a legislação sobre os acordos de leniência não é mais tabu”, afirmou. Outra alternativa, que precisaria ser negociada com Maia, é editar uma nova medida provisória ao fim da atual sessão legislativa, em dezembro, quando a Constituição permite este tipo de manobra.
De qualquer forma, BC e CVM perdem importantes instrumentos para tentar enfrentar acusações contra Instituições Financeiras. O texto era visto pela oposição como uma forma de salvar bancos envolvidos em irregularidades nos governos Lula e Dilma e que poderiam ser delatados pelo ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci. A MP passou a autorizar que o BC fizesse acordos de leniência com essas instituições, com as cláusulas e as confissões permanecendo sob sigilo.
A MP também levantou a suspeita, na época, de ser uma retaliação à delação premiada dos executivos da JBS. Discutida dentro do Executivo há anos, a proposta foi publicada logo em seguida aos irmãos Batista fragilizarem o governo com sua delação, mas serem acusados de lucrar no mercado financeiro com o conteúdo das acusações. A MP aumentou em dez vezes as multas que a CVM pode aplicar para infrações nos mercados de capitais, para até R$ 500 milhões.
O projeto perdeu a prioridade, contudo, diante da possibilidade de que a votação ontem comprometesse o calendário planejado pelo governo para a votação da denúncia de que Temer cometeu os crimes de organização criminosa e obstrução de justiça.
Outro complicador para a votação ontem, além do baixo quórum por causa do feriado, era o parecer da comissão de deputados e senadores, que aprovaram “penduricalhos” como mudanças na legislação dos demais acordos de leniência, alterações na carreira dos servidores do BC e CVM, pagamento de bônus para os procuradores da Fazenda que atuam nos dois órgãos, entre outras. Os partidos apresentaram mais de 17 emendas para alterar o texto ontem no plenário.
Fonte: Valor Econômico