Mais 30 dias de crise

    TCU dá um mês para governo justificar as pedaladas em suas contas. Relator vê 31 irregularidades e diz que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi violada, mas decide dar amplo direito de defesa antes de apresentar parecer

    A presidente Dilma Rousseff ganhou 30 dias para se defender das pedaladas fiscais, mas ainda está em situação delicada. A disposição dentro do Tribunal de Contas da União (TCU) é a de rejeitar as contas do governo de 2014, o que não acontece desde 1937. O ministro-relator Augusto Nardes identificou 31 irregularidades, mas preferiu dar “amplo direito à defesa”, concedendo prazo para a presidente apresentar explicações sobre 13 pontos, antes de colocar o processo em votação. Com isso, o tribunal garantiu que governo não se valerá de questionamentos jurídicos para tentar evitar o pior: motivos para a oposição abrir um processo de impeachment. O plenário do TCU seguiu, por unanimidade, o voto do relator e adiou o julgamento do relatório. “Este tribunal não tem condições de apreciar as contas do governo, em razão dos indícios de irregularidades, que demandam a abertura de prazo para o contraditório”, justificou Nardes, ao postergar, pela primeira vez na história, um parecer sobre contas públicas. 

    O ministro-relator afirmou que, de 2009 a 2014, as chamadas pedaladas fiscais, mecanismo utilizado pelo Tesouro Nacional para atrasar de forma proposital o repasse de dinheiro para bancos públicos e autarquias e melhorar artificialmente as contas federais, somaram R$ 40,2 bilhões, sendo R$ 7,1 bilhões apenas no ano passado. Segundo Nardes, o governo feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Ele destacou que “tão grave quanto” as pedaladas, foi o fato de o governo não cumprir, em ano eleitoral, o contingenciamento de R$ 28,5 bilhões. “E ainda liberou mais R$ 10,1 bilhões”, ressaltou.

     

    Tiro no pé 

    TCU tinha por prática comum aprovar as contas públicas com ressalvas, sem que o governo se preocupasse em corrigir os erros apontados. “É necessário dar um basta nisso”, afirmou o ministro, garantindo que a inovação é um avanço para o país. Mas, na avaliação do especialista em contas públicas José Matias-Pereira, professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB), o TCU deu um tiro no pé. “Vai ficar exposto a um processo de pressão política por 30 dias, que pode levar a uma reversão de tudo o que está sendo debatido tecnicamente, que são as irregularidades cometidas por este governo”, analisou. Em outras palavras, o TCU se eximiu da responsabilidade de desaprovar as contas e passou a bola para o Congresso. Já o especialista em contas públicas Raul Velloso considerou a medida inédita positiva por colocar ainda mais pressão no setor público. “Isso vai melhorar a governança do país”, afirmou. 

    O governo comemorou o prazo. O advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, disse que o governo usará integralmente o prazo de 30 dias para que a presidente Dilma Rousseff apresente sua defesa. “É uma decisão equilibrada, que procura a consistência e a formação de uma convicção por parte dos ministros do TCU“, afirmou. Ele insistiu na tese de que o Tribunal não chegou a uma conclusão sobre as contas e que uma eventual decisão contrária ao governo não implica responsabilidade direta de Dilma. 

    A estratégia legal, neste caso, é separar o julgamento das contas do governo da pessoa da presidente. Nardes, contudo, foi muito claro ao dizer que a responsabilidade é de Dilma e de seus gestores. O TCU ainda aguarda esclarecimentos de 17 membros do governo, entre eles, o presidente do Banco CentralAlexandre Tombini, e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega

    A presidente Dilma deverá encaminhar as respostas para os 13 questionamentos (leia quadro abaixo) por escrito. Após recebê-las, o ministro-relator do TCU vai produzir um novo parecer, que será apresentado para votação. Em seguida, a decisão será encaminhada ao Congresso, que tem o poder para aprovar ou não as contas de presidentes. “Nesse momento de atrito político, se as justificativas de Dilma não forem suficientes, a rejeição das contas pode abrir espaço para um impeachment por improbidade administrativa”, assinalou Matias-Pereira.

     

    Fonte: Correio Braziliense

    Matéria anteriorPrimeiro dia de Fachin
    Matéria seguinteAmpliado a todos prazo de aposentadoria compulsória