Ministro concorda com projeto que muda transferência de lucro do BC

    O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, manifestou-se ontem favorável à criação de uma “reserva especial” para onde seja transferido o resultado positivo do Banco Central. Em entrevista ao Valor, Barbosa lembrou que esse mecanismo é adotado por vários países desenvolvidos. A legislação atual determina que os lucros do BC sejam transferidos ao Tesouro Nacional, em dinheiro, enquanto os prejuízos são cobertos pelo Tesouro por meio de transferências de títulos ao BC.

    Barbosa explicou que só não incluiu o dispositivo no projeto de lei complementar que cria o depósito voluntário remunerado, encaminhado ontem ao Congresso, porque, no seu entendimento, essa “reserva especial” deve ser criada e regulada por lei ordinária.

    Na opinião do ministro, antes de criar a “reserva especial”, é necessário instituir o novo instrumento de política monetária, que é o depósito voluntário remunerado. Esse instrumento ajudará o BC a enxugar a liquidez do mercado e será uma alternativa às operações compromissadas.

    As declarações de Barbosa foram feitas ao ser consultado, pelo Valor, sobre o projeto de lei complementar apresentado ontem pelo senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que muda a forma de transferência do resultado positivo do Banco Central ao Tesouro. Pelo projeto, se o resultado, apurado semestralmente, for positivo, será transferido a uma “reserva especial” a ser criada no próprio BC para a cobertura de resultados negativos futuros. Barbosa disse que está aberto à discussão do assunto, quando o projeto for analisado pelo Senado.

    O projeto de Ferraço determina ainda que o Conselho Monetário Nacional (CMN) fixará um valor máximo para a reserva especial. Sempre que esse máximo for atingido, o resultado positivo do BC excedente será direcionado a um fundo de transferência ao Tesouro. Anualmente, os recursos serão remetidos ao Tesouro em valor equivalente à média dos aportes feitos ao fundo ao longo dos três exercícios financeiros anteriores.

    Os valores recebidos pelo Tesouro serão usados exclusivamente para o pagamento de amortização e juros da dívida pública mobiliária federal na carteira do Banco Central e na cobertura de resultados negativos, de acordo com o projeto.

    Hoje, o resultado do BC é dividido em duas partes: uma referente às contas cambiais (variação do valor das reservas internacionais e lucros ou prejuízos com operações de swaps cambiais) e aquela referente às demais contas não cambiais. Sempre que o real se desvaloriza frente às demais moedas, o valor das reservas internacionais, em reais, aumenta, gerando grandes ganhos patrimoniais para o BC. O inverso se dá nos casos de valorização do real.

    Em sua exposição de motivos ao projeto, Ferraço argumenta que esses ganhos e perdas não se realizam na prática, pois o BC não vende as reservas, mantendo-as em seu balanço. Apesar disso, são contabilizados como lucros ou perdas, em função de o Banco Central apurar seu balanço em regime de competência, precificando as reservas internacionais pelo seu valor de mercado.

    Uma vez apurado um ganho, o BC é obrigado pela legislação em vigor a transferi-lo ao Tesouro, em dinheiro. “Isso coloca na mão do Tesouro um volume de recursos criado pela simples oscilação circunstancial de preços das reservas”, observa Ferraço.

    Na justificativa, Ferraço diz que as regras atuais estão em desacordo com as melhores práticas contábeis internacionais e “têm viabilizado um financiamento implícito do Banco Central ao Tesouro”. Para ele, “a consequência de tal financiamento tem sido o estímulo à expansão do gasto primário, o aumento da dívida pública por meio das operações compromissadas do BC e a redução na transparência das contas públicas, em especial no que se refere ao perfil de prazo, composição e custo da dívida pública mobiliária federal”.

    O objetivo de Ferraço, com o projeto, é impedir que esse “financiamento implícito” continue acontecendo. O governo nega que o BC esteja financiando o Tesouro, mas concorda em mudar a forma de transferência do resultado da autoridade monetária.

     

    Fonte: Valor Econômico

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