Nova lei de falências ‘empodera’ bancos

    PROJETO PERMITE QUE CREDORES, NORMALMENTE DO SETOR FINANCEIRO, APRESENTEM PLANO DE RECUPERAÇÃO E INDIQUEM GESTORES

    Fisco também tem a sua força ampliada; poderá pedir a falência do devedor e até impedir a venda de ativos

    RAQUEL LANDIM
    DE SÃO PAULO

    A nova lei das falências do governo Michel Temer vai permitir que os bancos troquem a gestão e assumam o comando das empresas em recuperação judicial. Em geral, as Instituições Financeiras são os maiores credores nesses processos.

    O projeto foi elaborado pelo Ministério da Fazenda e já está na Casa Civil, aguardando apenas a votação da Reforma da Previdência para ser enviado ao Congresso.

    A expectativa da área técnica é que a nova legislação entre vigor ainda na atual gestão, mas os empresários prometem mobilizar suas bancadas para alterar o projeto ou mesmo derrubá-lo por considerar a versão final mais um risco do que uma solução para um momento de dificuldades financeiras.

    Segundo a última versão do texto, à qual a Folha teve acesso, o prazo para que o acionista controlador apresente o plano de recuperação de uma companhia é reduzido de 180 dias para 120 dias, sem a possibilidade de renovação.

    Caso o devedor não consiga aprovar seu plano na assembléia de credores ou perca o prazo, credores que representem pelo menos 1/3 da dívida da empresa ganham o direito de apresentar seu próprio plano —o que pelas regras de hoje é vedado.

    Além disso, se esse novo plano receber o aval da assembléia, a gestão da empresa é automaticamente destituída e os credores podem indicar novos administradores.

    O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, já disse publicamente que a nova lei de falências representa um “empoderamento” dos credores, para preservar a companhia e os empregos, em vez de proteger os acionistas devedores.

    Para advogados tributaris-tas, as mudanças beneficiam os bancos e prejudicam as empresas. “Caso essa lei seja aprovada, as empresas vão desistir de entrar em recuperação judicial e sangrar até falir”, diz Ivo Waisberg, do Thomaz Bastos, Waisberg e Kurzweil Advogados.

    A atual lei de falências foi promulgada em 2005 e é considerada por especialistas um avanço em relação à legislação anterior, que não previa a recuperação judicial, mas apenas uma concordata.

    A avaliação do atual governo, no entanto, é que os resultados não foram satisfatórios para os credores. Para cada R$ 1,00 que entra na recuperação judicial no Brasil, os credores recebem apenas R$ 0,25. Na Colômbia, chega a R$ 0,60, e a média na América Latina é de R$ 0,45.

    A discussão da nova legislação começou em agosto de 2016 e foram ouvidos acadêmicos, advogados e associações de classe. A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) participou ativamente do processo.

    O novo projeto de lei tem 55 páginas e altera cerca de 80% da legislação atual.

    “Pode mudar a lei inteira, o que traz enorme insegurança jurídica, porque uma legislação não é só o que está escrito na Constituição, mas também a jurisprudência que vai sendo criada”, diz Eduardo Munhoz, do E. Munhoz Advogados. Procurada pela reportagem a Febraban, entidade que representa os bancos, não se pronunciou.

    RECEITA

    Outro credor que ganha força no projeto de lei elaborado pelo Ministério da Fazenda é o fisco, que terá direito de pedir a falência das empresas e de impedir a venda de ativos.

    Hoje os créditos fiscais ficam de fora da recuperação judicial, o que significa que não sofrem com os descontos que são aplicados a outros credores. Existe apenas um parcelamento em até 84 vezes. Na prática, no entanto, o fisco não tem recebido praticamente nada.

    Isso ocorre porque os juizes vêm permitindo que as empresas não paguem os créditos fiscais para que possam ganhar fôlego financeiro.

    Pela nova lei, o prazo do parcelamento também é alterado. Sobe para 120 vezes, mas o fisco ganha o direito de pedir a falência caso a dívida não seja paga.

    Apesar de os créditos fiscais continuarem fora da recuperação judicial, as Receitas federal e estaduais terão voto na assembléia de credores e poderão impedir que a empresa venda ativos para levantar capital.

    Se forem aprovadas no Congresso, essas novas regras podem ser utilizadas em recuperações judiciais em andamento. Técnicos do governo, porém, não acreditam que o projeto de lei seja promulgado a tempo de influenciar processos polêmicos como os da Oi e da Sete Brasil.

    Fonte: Folha de S.Paulo

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