O longo caminho de volta ao crescimento da economia global

    Enquanto que a normalização da política monetária parece ter adquirido seu ritmo lento e gradual nos Estados Unidos, a União Europeia e o Japão ainda estão longe de vislumbrar um fim para políticas econômicas excepcionais em vigor. Apenas ontem, após reunião do Banco CENTRAL Europeu, Mario Draghi, presidente, revelou que afinal havia consenso entre todos os membros da instituição – leia-se, a Alemanha concordou – em colocar o afrouxamento quantitativo (QE) no arsenal do Banco. Era esperada uma resposta do BCE ao risco mais próximo de deflação, com a inflação na zona do euro caindo para 0,5% em março, mas ela não veio. Draghi disse que ainda trabalha com um período prolongado de baixa inflação , em que o índice chegará perto dos 2% no fim de 2016. No Japão, a terceira maior economia do mundo, o experimento de radical emissão monetária colhe alguns trunfos, mas enfrenta desafios para produzir inflação de 2% até o fim do ano.

    Draghi fez eco ao alerta sobre a ameaça de um período longo de inflação muito baixa, dado pela diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde. Esse risco, mais acentuado na Europa e que se tornou a realidade da qual o Japão tenta desesperadamente escapar, obrigará a execução de políticas monetárias acomodatícias por vários anos – o que significa também o risco de um período prolongado de crescimento muito baixo , como aponta a parte do Perspectiva Econômica Mundial do Fundo divulgada ontem. Com a deflação rondando, apolítica monetária dos países desenvolvidos, exceto a dos EUA, poderá ser posta à prova ao enfrentar os limites dos juros zero.

    A enrascada em que a Europa poderá se meter se a inflação continuar caindo é especialmente complicada. O BCE não poderá, como o Federal Reserve americano, comprar títulos do Tesouro, porque, em primeiro lugar, não há um Tesouro da zona do euro e, depois, porque vários países, com Alemanha à frente, se opõem mortalmente a financiar déficits nacionais. Uma emissão de títulos dos governos da zona do euro, já proposta e rejeitada, poderia ser uma saída para o BCE, mas ela está fora do mapa político da união monetária. Draghi contornou em parte o problema com um QE pela porta dos fundos: inundou os bancos com dinheiro e os bancos compraram títulos dos endividados países da periferia do euro. Isso estancou a crise, que ameaçava destruir o euro.

    O BCE preferiu esperar mais um pouco para usar mais medidas não convencionais. A posição majoritária parece se inclinar para a presunção de que o período prolongado de baixa inflação não deve se materializar em deflação. Há analistas que argumentam que essa ameaça é temporária e está, até certo ponto, inscrita na lógica do ajuste econômico feito na zona do euro. Com graves problemas de competitividade, boa parte dos países da região, sem poder contar com a desvalorização cambial, seguiram o caminho mais doloroso de redução de salários e outros custos, e da busca pela produtividade. A inflação caiu muito. Por isso, a valorização recente do euro é um problema adicional para o euro e para Draghi.

    Para alguns analistas, mais frutífero que a compra maciça de títulos seria que o BCE sinalizasse garantia de fornecimento ilimitado de recursos aos bancos, que permitisse a muitos deles fazer o que não fizeram até agora – livrar-se de títulos podres em suas carteiras e retomar o crédito.

    No Japão, o abenomics produziu o que já é quase uma façanha – inflação de 1,3% em fevereiro, em relação ao mesmo mês de 2013 -, com forte avanço da indústria e crescimento robusto de 3,6% nas vendas do comércio (fevereiro). Seu sucesso não está garantido, porém. O imposto sobre consumo subiu em abril de 5% para 8%, como anunciado, e boa parte do vigor do varejo se deve à antecipação de compras. E quase metade da taxa de inflação corrente se deve ao aumento da energia importada. Sem ela, o índice seria de 0,7%.

    Enquanto a produção reage bem, estimulada pela desvalorização do iene, e os lucros estão subindo, os salários, peça vital no xadrez do abenomics , não estão avançando. E há quem aposte que o esforço para elevar os preços acabará jogando os juros para cima e quebrando o governo japonês, o mais endividado do mundo.

    As dificuldades de UE e Japão para retomar o crescimento, a desaceleração da China e o menor ritmo de expansão dos países emergentes mostram que a economia global ainda está longe de restaurar seu equilíbrio.

     

    Fonte: Valor Econômico

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