Embora ainda não tenha atingido em cheio a inflação, grande parte dos efeitos da elevação dos juros já afetou a atividade econômica. Essa é a avaliação de alguns experientes especialistas em política monetária e ajuda a explicar porque, há pelo menos um mês e meio, os analistas do mercado financeiro revisam, sempre para baixo, suas projeções para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. Na semana passada, o Boletim Focus, que traz as projeções do mercado para diversos indicadores econômicos, apontava um crescimento de 1,05%. Para 2015, estima-se um crescimento um pouco maior, de 1,5%. Mas nove entre dez analistas também reconhecem que há, na rodada de revisões, uma influência importante da fraca atividade externa, que mostra uma recuperação do mercado mundial lenta e heterogênea, com alguns países sinalizando dados melhores e outros ainda claudicando.
Não custa lembrar, o próprio Banco Central, no último Relatório de Inflação, divulgado em junho, foi um dos primeiros a revisar sua projeção de forma acentuada, cortando sua previsão de atividade econômica para este ano de 2% para 6%. Para a atividade industrial, as revisões do BC foram ainda mais dolorosas, saindo do quadrante positivo (2,1% de expansão) no relatório anterior, para uma contração de 0,4%. No segundo semestre, o nível de atividade tende a ser levemente melhor, até por um efeito estatístico: o menor número de feriados contabilizará mais dias de atividade, dando um empurrãozinho. Há, ainda, uma expectativa de que as exportações consigam finalmente trazer alguma contribuição positiva ao crescimento do PIB, algo que não ocorre há quase dez anos. Para 2015, como se sabe, a expectativa é de um PIB ligeiramente maior que o deste ano.
No caso da inflação, a avaliação do mercado é de que os efeitos finalmente se fazem sentir, embora ainda com grande defasagem. “Demorou muito”, avalia o especialista em inflação da LCA, Fabio Romão. A equipe econômica sempre reage a essa crítica lembrando os efeitos da estiagem e a elevação do preço dos alimentos ocorrida no início do ano. A “inflação da Copa”, causada pela elevação das passagens aéreas, outro percalço no caminho, deve refluir nos próximos dois meses. E a inflação de serviços finalmente dá algum sinal para baixo.
Entre alguns analistas financeiros, uma péssima notícia contribuiu para reforçar a interpretação de que o motor que turbina os preços dos serviços – a disponibilidade de renda da população – já perde o fôlego. O número de vagas formais criadas em junho medido pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado na última semana, foi decepcionante (25 mil, ante uma expectativa de 53 mil). Ou seja, um mercado de trabalho mais “acomodado” leva a menos pressão sobre a inflação de serviços (um dos vilões) e, consequentemente, à expectativa de que o BC ao menos não suba mais os juros, como defendem alguns. Seria o mesmo que levar o país à recessão.
Ambição é ser referência
Os Brics têm ambição de transformar o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) em uma espécie de referência no mundo dos bancos de desenvolvimento. “O objetivo é funcionar de forma complementar, mas um pouco de competição não faz mal a ninguém”, diz o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, embaixador Carlos Márcio Cozendey. O desejo é que o Banco seja um padrão de gestão, agilidade, eficiência e qualidade no atendimento das necessidades de seus clientes – países em desenvolvimento. Assim, a característica da governança compartilhada na qual nenhum país tem poder de veto inclui uma preocupação específica. “A preocupação em evitar qualquer poder de veto tem uma dimensão de mercado: fica claro que nenhuma decisão será bloqueada pela vontade de um país”, explica Cozendey. A impossibilidade de que o presidente do Banco presidisse também o Conselho de Administração do NBD – um esforço brasileiro que acabou prevalecendo na reta final das negociações – teve o mesmo objetivo: garantir a distribuição equilibrada de poder.
Segundo o embaixador, a governança da nova instituição não foi arquitetada para servir como um contraponto ao “déficit democrático” de instituições multilaterais emprestadoras de recursos, como FMI e Banco Mundial. O que se persegue é um objetivo nada fácil: conseguir, no médio prazo, que a instituição alcance uma classificação de risco superior à dos seus sócios fundadores. No grupo, a China tem o rating mais elevado: AA-, a quarta melhor nota na escala de classificação das agências.
Com isso, o Banco será capaz de captar a custos mais baixos e prover garantias mais sólidas aos futuros clientes em operações com terceiros.
Cozendey não comenta nem confirma, mas, segundo analistas, dentre os países do Brics, é a China o parceiro que mais avidamente busca angariar poder geopolítico no mundo. Interpretações de que o Banco dos Brics tem “um dono” podem prejudicar sua reputação no mercado global.
Mas nada disso é imediato. Como se sabe, a expectativa é que o Banco só comece a operar dentro de dois anos. Estima-se que os países precisem de um ano para ratificar o acordo que o criou – no caso brasileiro, passar pela aprovação da Câmara dos Deputados e do Senado. E as cotas em dinheiro, correspondentes a 20% do capital inicial de US$ 50 bilhões, serão integralizadas ao longo de sete anos.
Coluna publicada às segundas-feiras
Fonte: Brasil Econômico