Odebrecht decide fazer delação premiada

    O empresário Marcelo Odebrecht decidiu fazer delação premiada com a Operação Lava-Jato e liberou os executivos das empresas do Grupo Odebrecht a fazerem o mesmo. Marcelo e diversos dirigentes estão presos em Curitiba, em decorrência das investigações que revelaram o escândalo de desvios bilionários em contratos com Petrobras.

    Agora, os investigadores da força-tarefa irão avaliar se aceitam a colaboração. Para se tornar delator, Marcelo terá de confessar crimes ainda não descobertos pela investigação, além de indicar ilícitos e evidências que possam comprová-los.

    Já condenado em primeira instância a 19 anos de prisão por crime de corrupção, a delação de Marcelo terá de ser homologada pelo juiz Sergio Moro, ainda que o empresário delate pessoas com prerrogativa de foro. Nessa hipótese, os depoimentos em delação serão prestados à Procuradoria-Geral da República (PGR).

    “As avaliações e reflexões levadas a efeito por nossos acionistas e executivos levaram a Odebrecht a decidir por uma colaboração definitiva com as investigações da Operação Lava-Jato”, afirma comunicado divulgado pelo grupo, com o título de “Compromisso com o Brasil”.

    A empresa (…) vem mantendo contato com as autoridades com o objetivo de colaborar com as investigações, além da iniciativa de leniência já adotada em dezembro junto à Controladoria Geral da União“, diz o texto divulgado pela Odebrecht, sem assinatura.

    “Esperamos que os esclarecimentos da colaboração contribuam significativamente com a Justiça brasileira e com a construção de um Brasil melhor”. Segundo o comunicado, a empresa “não tem responsabilidade dominante” sobre os fatos apurados na operação, “que revela na verdade a existência de um sistema ilegal e ilegítimo de financiamento do sistema partidário-eleitoral do país”.

    Este trecho da nota é visto como uma sinalização há fatos a revelar sobre a campanha de reeleição de Dilma Rousseff, em 2014, já colocada sob suspeita de receber de recursos ilícitos simulados em doações eleitorais.

    Ontem, a Operação Lava-Jato revelou que descobriu uma estrutura organizada dentro da Odebrecht destinada ao pagamento de propinas a agentes públicos em dinheiro vivo, que movimentou pelo menos R$ 69 milhões até janeiro de 2015, segundo a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF). A estrutura tinha o nome de “setor de operações estruturadas”.

    Foram presos os executivos ligados à Odebrecht Hilberto Mascarenhas Silva Filho, Luiz Eduardo da Rocha Soares, Sergio Luiz Neves, Antonio Pessoa de Souza, Paul Altit, Roberto Prisco Ramos, João Alberto Loureira, Rodrigo Costa Melo e o funcionário Isaias Ubiraci Santos.

    Segundo os investigadores, dois operadores atuavam no esquema, a partir do chamado “dólar cabo” – troca de posições financeiras sem o uso de conta corrente. São os irmãos Marcelo Rodrigues e Olívio Rodrigues Júnior.

    O relatório da Polícia Federal que embasou as buscas mostrou que o operador Fernando Soares, o Baiano, pode ter recebido repasses da Odebrecht enquanto estava preso em Curitiba negociando seu acordo de delação premiada. Um documento da empreiteira apreendido pela PF aponta pagamento de R$ 550 mil em de junho de 2015 em um endereço no centro do Rio de Janeiro ligado à Hawk Eyes Administradora de Bens Ltda, empresa de Baiano que também foi alvo da Lava-Jato.

    Segundo os investigadores, foi encontrado nas buscas à Odebrecht um registro de um possível pagamento para um destinatário chamado Gustavo, que seria o irmão de Baiano, diz a PF.

    Na época do possível pagamento, Baiano negociava seu acordo de delação, que foi homologado pelo ministro Teori Zavascki em outubro do ano passado. Gustavo, irmão de Fernando, foi um agente importante na condução da defesa do lobista, responsável pela contratação de seu advogado e da administração dos negócios da família após sua prisão. O irmão do lobista e delator Fernando “Baiano” Soares, Gustavo Soares, foi conduzido coercitivamente.

    A Polícia Federal também identificou ordens de pagamento de R$ 2 milhões da Odebrecht para William Ali Chaim, que trabalhou para o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, preso e processado pela Operação Lava-Jato, e é ex-tesoureiro da campanha do presidente do PT, Rui Falcão, a deputado federal.

    Segundo Falcão informou por meio da assessoria de imprensa do PT, Chaim foi tesoureiro da sua campanha em 1998. Diz que “atualmente mantém apenas relações de amizade com ele e acredita que não seja mais filiado ao PT”.

    Segundo os procuradores Carlos Fernando dos Santos Lima e Laura Tessler, o esquema era de conhecimento de Marcelo Odebrecht, herdeiro do conglomerado empresarial e condenado a 19 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro com recursos desviados da Petrobras.

    “Há um sistema automático para o controle de pagamentos [de propinas] com distribuição de alçadas em setores de óleo e gás, infraestrutura, estádios”, afirmou em entrevista coletiva o procurador Santos Lima.

    O ex-diretor do Corinthians Andre Luiz de Oliveira, o “André Negão” alvo de condução coercitiva, foi preso em flagrante em São Paulo por porte ilegal de arma e liberado após pagar fiança. Ele é suspeito de receber vantagens indevidas. A Arena Corinthians, construída pela Odebrecht, foi palco da abertura da Copa do Mundo de 2014, e, embora tenha sido uma obra privada, teria sido viabilizada com o pagamento de propina pela Odebrecht, segundo a Lava-Jato.

    De acordo com Santos Lima, os rastros de repasses ilegais apareceram em planilhas apreendidas que indicam o envolvimento da diretoria da Odebrecht responsável pela gestão do contrato com o Itaquerão. O procurador disse que ainda está em análise inicial a lista dos destinatários dos pagamentos ilícitos.

    Segundo o Ministério Público Federal, o diretor de contrato da Odebrecht Infraestrutura, Antônio Roberto Gavioli, responsável pela obra no bairro paulistano de Itaquera, figura como o solicitante de pagamentos em espécie de R$ 500 mil, em data não especificada, para pessoa com o codinome “Timão”, que seria André Negão.

    O deputado federal Andrés Sanchez (PT-SP), ex-presidente do Corinthians, confirmou que o dirigente do clube depôs na Polícia Federal. “Não tem nada a ver com o Corinthians o fato de ele ter sido levado a depor. São coisas dele. Não tem nada a ver com a arena também”, disse.

    O sócio de um ex-assessor da presidente Dilma Rousseff também recebeu pagamentos suspeitos de serem propina, afirma a Operação Lava-Jato. Trata-se de Douglas Franzoni, sócio de Anderson Dorneles, que assessorou a presidente da República.

    Eles têm sociedade no Red Bar da Arena Beira-Rio, estádio de Porto Alegre. Franzoni também foi conduzido coercitivamente.

    Os empreendimentos conduzidos pela Odebrecht nos estados poderão dar início a investigações locais, de acordo com a Lava-Jato. O juiz Sergio Moro deve remeter para o âmbito estadual os achados na operação de ontem.

    Durante o cumprimento de mandados de busca, a PF foi a um hotel em Brasília onde estava hospedado o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o alvo era um apartamento usado pelo publicitário João Santana. (Colaboraram Marina Falcão, do Recife; e César Felício, de São Paulo, com agências noticiosas)

     

    Fonte: Valor Econômico

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