Os impactos da estagflação no Brasil

    JOSÉ MATIAS-PEREIRA 

    Economista, advogado, doutor em ciência política pela Universidade Complutense de Madri, pós-doutor em administração pela Universidade de São Paulo, professor de administração pública e pesquisador associado do programa de pós-graduação em contabilidade da Universidade de Brasília.

    As crescentes reivindicações da população brasileira por mudanças, conforme revelam as pesquisas eleitorais, têm uma correlação clara com os inúmeros insucessos do governo Dilma nos campos da Gestão Pública e da economia. Essas intervenções, além de não alcançarem os objetivos iniciais, contribuíram sobremaneira para piorar o ambiente de negócios do país. A insistência do governo em incentivar o consumo como principal motor do crescimento esgotou-se. Registre-se que essas falhas conduziram o país para preocupante processo de estagflação.

    Estagflação é um fenômeno no qual a economia passa a ter crescimento muito baixo, agravado pela inflação alta e persistente. Esse é o caso do Brasil na atualidade, que está crescendo abaixo do potencial, combinando inflação elevada e crescimento econômico pífio. Registre-se que a economia brasileira vem patinando em média 1,9% nos últimos três anos e que deverá ficar próxima de 1% em 2014. Esse quadro é agravado pela inflação (IPCA), mantida próxima do teto da meta, de 6,5% ao ano.

    Diante desse cenário, é preocupante ouvir a enfática defesa do ex-presidente Lula pela concessão de mais estímulos ao consumo. Os números da economia comprovam que o modelo econômico executado pelos governos Lula e Dilma – apoiado, em especial, no consumo – se esgotou. Somente para as instituições financeiras as famílias brasileiras estão devendo R$ 1,3 trilhão, o que corresponde a 1/4 do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Estima-se que, de cada R$ 10 da renda das famílias, cerca de R$ 4,5 já estejam comprometidos para pagar dívidas.

    O discurso do ex-presidente, ao propor a expansão do crédito ao consumo, contradiz outra recente recomendação feita por ele, para o governo endurecer o combate à inflação. São medidas que não se coadunam, pois o estímulo ao consumo é uma das causas da retomada da subida dos preços no país. É sabido que a falta de ações efetivas do governo e do setor privado para aumentar a produtividade é o principal entrave para a geração de novo ciclo de crescimento da economia. Destacam-se, entre os fatores, a escassez de recursos humanos qualificados, as deficiências de infraestrutura, o baixo nível de investimento e um ambiente institucional subdesenvolvido.

    Fica evidente, assim, que a defesa eloquente do ex-presidente para o governo estimular o consumo, por meio de mais endividamento dos consumidores, é uma forma de tentar dar um falso alento à economia. Busca-se, dessa forma, evitar o aumento do nível de descontentamento popular com o atual governo e, consequentemente, a perda de votos da candidata do partido. São recomendações inadequadas, quem sabe-se de antemão, apenas vão contribuir para agravar ainda mais o cenário econômico do país. Atitudes e recomendações como essa reforçam a percepção dos analistas políticos de que os atuais detentores do poder têm como objetivo manterem-se no poder a qualquer custo.

    Por sua vez, as pesquisas de opinião e os ecos vindos das ruas mostram que a população brasileira amadureceu politicamente e que não está mais disposta a tolerar desmandos dos governantes e políticos. Constata-se que existe uma percepção clara por parte da sociedade de que a situação econômica, política e social do Brasil resulta da má Gestão Pública, da adoção de um modelo econômico equivocado, apoiado no estímulo ao consumo, no autoritarismo, na arrogância, em desperdícios e na corrupção. Apesar das evidências de que a sociedade deseja mudanças profundas na Gestão Pública e mais ética na política, os atuais governantes e políticos aliados se recusam a perceber essa realidade.

    É válido ressaltar, por fim, que, embora nenhum dos candidatos de oposição trate abertamente das medidas que vai adotar para reorganizar o Estado – buscando melhorar o desempenho da Gestão Pública, que se encontra travada – e tirar o país do processo da estagflação, é sabido que decisões amargas deverão ser adotadas. E elas exigirão enormes sacrifícios do governo, do setor privado e, em especial, da população brasileira.

    Fonte: Correio Braziliense

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