Para analistas, política interna pesou

    Por Marta Watanabe e Rodrigo Pedroso | De São Paulo

    A principal razão da decisão da presidente Dilma Rousseff de adiar a visita aos Estados Unidos foi a preocupação com a política interna e as eleições de 2014. Ao mesmo tempo, a decisão não traz grandes custos diplomáticos ou comerciais para as relações bilaterais. Essa é a opinião que prevalece entre analistas ouvidos pelo Valor.

    Para Oliver Stuenkel, coordenador do MBA em relações internacionais e da Escola de Ciências Sociais (CPDOC) da FGV, as eleições de 2014 “pesaram claramente”. “Uma foto de Dilma de vestido de festa ao lado do presidente Barack Obama tão pouco tempo após as denúncias de espionagem poderia ser utilizada pela oposição.” E seria usada, diz ele, como símbolo de submissão ao governo americano. “Há uma conexão clara entre a decisão de Dilma e sua candidatura à releição em 2014”, avalia José Álvaro Moisés, diretor do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da USP. “A decisão é uma tentativa de recuperar popularidade, numa situação que criou um inimigo externo ao país.”

    Para Stuenkel, a decisão da presidente terá repercussão positiva no cenário internacional. “Conversei com pessoas de outros países que acompanham relações internacionais. A decisão da Dilma deve ser vista como sinal de força, principalmente por países emergentes, como a Índia, por exemplo.” Ao mesmo tempo, diz Stuenkel, o impacto negativo para as questões que poderiam entrar em pauta na viagem de Dilma é limitado. Ele lembra que o custo para essas negociações foi baixo, já que não havia expectativa de avanço nas questões mais antigas e nem propostas novas mais concretas.

    “O efeito de não fazer a viagem é inócuo, do ponto de vista diplomático. Também não há grandes prejuízos comerciais. Há mais um efeito retórico do que real. Não há rompimento de relações”, declara Moisés. “Houve um acordo entre os governos para o adiamento da viagem, mas isso também não significa que o governo americano irá abrir a máquina de espionagem.”

    O anúncio do adiamento evitou uma “visita vazia”, na visão de Rubens Ricupero, ex-embaixador do Brasil em Washington. Ele também lembra que não houve avanço tanto em acordos como em temas sensíveis na relação bilateral desde a última visita do presidente americano, Barack Obama, ao Brasil, em março de 2011. “De maneira geral, no fundo ia ser até meio constrangedora a viagem para Dilma, mesmo sem a denúncia da espionagem. Seria mais uma viagem de diplomacia de prestígio, para mostrar que os governos estão dispostos a melhorarem a relação. Se houvesse uma pauta concreta, o Brasil até poderia trabalhar para não ser afetado pelo caso da espionagem”, afirma Ricupero.

    As relações comerciais e econômicas entre os dois países também não serão afetadas na análise do ex-embaixador. Neste ano, até agosto, o Brasil registrava déficit de US$ 7,7 bilhões com os americanos. “Eles não vão deixar de vender ao Brasil por isso e o Brasil não vai deixar de comprar. A nossa relação econômica está muito mais relacionada a dinâmicas entre os setores privados do que entre os governos.”

    Para a Câmara Americana de Comércio (Amcham), a decisão de Dilma significa oportunidade perdida para elevar investimentos e o fluxo de comércio com os americanos. Para o presidente da entidade, Gabriel Rico, a visita não deve ser cancelada. A expectativa da câmara é que ela ocorra “em um médio prazo, uma vez que seja dada alguma resposta à questão da espionagem pela administração Obama”.

    Em relação às críticas de falta de pautas concretas na visita da Dilma a Washington, Rico afirmou que desde a posse da petista, 21 acordos foram assinados dos atuais 40 vigentes. “Em dois anos e meio se assinou mais da metade dos acordos que temos com os Estados Unidos em toda a história. A Dilma foi para lá e o Obama veio para o Rio de Janeiro”, disse. O aumento no número de acordos assinados mostra a importância das visitas, para a Amcham. “Mesmo que não haja uma pauta, o encontro acelera algumas questões e encaminha outras”, afirmou Rico.

     

    Fonte: Valor Econômico

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