Conjuntura Com IPCA deste ano perto de 9%, indexação preocupa, mas mercado de trabalho pode “ajudar ” BC
A expectativa é que, em 2015, a inércia continue com um peso próximo ao registrado no ano passado, contribuindo com cerca de 10% da inflação do período. A questão agora é saber como ela vai se comportar em 2016 já que, pela primeira vez em muitos anos, a inflação herdada de 2015 ficará perto dos 9%. Por enquanto, o certo é que o peso da inércia na inflação é crescente e prejudica os esforços da autoridade monetária em circunscrever, como deseja, os efeitos da inflação a este ano, de forma a trazê-la ao centro da meta em dezembro de 2016.
Em nova metodologia, apresentada no último relatório trimestral de inflação, o Banco Central aponta que o peso da inércia na inflação é crescente. Ela respondeu por 5,3% da inflação em 2012, contribuição que deu um salto para 10,8% da taxa de 2013, chegando a 10,9% do índice do ano passado. E já há quem ache que esse impacto pode praticamente dobrar em 2016.
Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, diz que a variável deve contribuir com algo em torno de 1,1 ponto percentual de uma inflação medida pelo IPCA de 5,4% em 2016 – ou seja, a inércia vai responder por quase 19% da inflação do próximo ano, bem acima da média dos últimos anos, impactada basicamente pela inflação passada muito forte, que, nas contas da consultoria, deve alcançar 8,9% em 2015.
Adriana não despreza os impactos relevantes do mercado de trabalho desaquecido sobre inflação. Ela conta com reajustes reais salariais eventualmente menores no próximo ano, com uma maior dificuldade de negociação diante de uma inflação de 9%. “De todo modo, o IPCA indexa vários preços da economia, então acho que o peso da inércia deve ser relevante no ano que vem”, diz. “O que certamente atrapalha os planos de trazer a inflação para o centro da meta em 2016”.
Marcela Rocha, economista da gestora de recursos Claritas, faz algumas ponderações. Ela avalia que a tendência seria mesmo esperar um impacto ainda mais forte da indexação sobre os preços no ano que vem, mas destaca que a deterioração do mercado de trabalho em ritmo bem mais avançado do que o esperado abre espaço para que a inércia acabe contribuindo com a inflação de 2016 no mesmo nível dos últimos dois anos – perto de 10% da inflação. “O embate no campo inflacionário certamente será entre mercado de trabalho e inércia”, diz.
Para Marcela, diante do salto de mais de dois pontos percentuais na inflação de 2014 para 2015 e do forte impacto que isso deve ter sobre o reajuste de salários, a tendência realmente seria esperar maior participação da inércia na inflação em 2016, mas os movimentos inéditos de rápida deterioração no mercado de trabalho não podem ser ignorados. Além da taxa de desemprego em alta, diz Marcela, há queda da renda real também muito veloz e muito mais grave do se esperava.
Em meio a esse cenário, os serviços – categoria mais atingida pela indexação, especialmente os serviços intensivos em trabalho, que representam 25% de todos serviços – têm alta correlação com os salários de admissão do Caged, que estão em queda na comparação anual, em termos reais, de mais de 1%. Logo, resume a economista, a participação da inércia na inflação neste ano ainda continua relevante, mas para o ano que vem o grau de convicção se reduz bastante.
Leonardo Costa França, da Rosenberg & Associados, concorda. “A inércia vai ter um impacto nos preços no ano que vem, mas espera-se que a desaceleração econômica seja tal, aliada ao aperto monetário e à reversão da política fiscal, que supere esse efeito, contribuindo para desaceleração da inflação”, afirma.
Os especialistas reforçam que a queda esperada para o IPCA entre 2015 e 2016 – de três pontos percentuais (quase 9% para perto de 5,5%) – é relevante, ainda que o índice não alcance o centro da meta. Entre os fatores apontados para que o centro da meta não seja atingido estão não só a inércia, pegando principalmente os serviços, com reajuste expressivo nominal do mínimo, como também a depreciação adicional de câmbio e a desancoragem das expectativas.
Para Fernando de Holanda Barbosa, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e um estudioso da inércia, se o BC quiser mesmo atingir o centro da meta de inflação, como vem sinalizando mais recentemente, vai ter que subir mais os juros. “Para vencer a inércia vamos ter que pagar um preço de período recessivo. Não existe outro mecanismo, não há outra saída para que a sociedade mude o seu comportamento e aceite um novo patamar de inflação”.
O custo social disso, ressalta, será o desemprego e o aumento da capacidade ociosa das empresas. “Se o BC persistir com essa política, não tenho dúvida que em 18 meses teremos inflação mais baixa. O problema é aguentar o tranco nesse período”, diz.
Fonte: Valor Econômico