Aumento de 27,3% reivindicado pelo funcionalismo implica acréscimo de R$ 69,9 bilhões na folha da União. Valor supera a meta de superavit do governo federal, de R$ 55,3 bilhões. Para analistas, correção não pode ir além de 7,9%
Em 2014, o Tesouro Nacional teve uma despesa de R$ 239,4 bilhões com o pagamento de salários, aposentadorias e pensões de 2.176.959 servidores ativos, inativos e pensionistas da União, segundo o Boletim Estatístico de Pessoal, do Ministério do Planejamento. Para 2015, a previsão inicial de gastos é de R$ 256 bilhões. Se forem acrescidos os 27,3% pedidos pelos funcionalismo, os gastos subirão em 2016 para R$ 325,9 bilhões – um acréscimo de R$ 69,9 bilhões.
O pleito dos servidores será apresentado oficialmente na próxima sexta-feira ao ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. O reajuste de 27,3% equivale à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estimada para o período de agosto de 2010 a julho de 2016, em torno de 44%, descontados os 15,8% concedidos anteriormente em três parcelas (2013, 2014 e 2015), mais um ganho real de 2%. Mas o impacto do aumento na folha salarial pode estar subestimado. A conta tende a ser ainda maior porque várias carreiras pedem correções superiores a 55%.
Além disso, no apagar das luzes de 2014, o Congresso aumentou os salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF); do procurador-geral da República; dos deputados e senadores; da presidente e do vice-presidente da República; e dos ministros de Estado. O aumento dos 11 ministros do STF teve forte impacto nos gastos da União, já que os seus vencimentos servem de base para calcular os salários dos 16.429 juízes do país. No caso do Ministério Público, o reajuste implica correção dos vencimentos de 12.262 procuradores. No total, o impacto anual dos aumentos é calculado em R$ 3,8 bilhões.
Para analistas, o governo tem margem para conceder reajuste de, no máximo, 7,9%, que é a previsão do mercado financeiro para a inflação de 2015, conforme o Boletim Focus, do Banco CENTRAL. Isso significa que os servidores terão que se contentar com bem menos do que pedem.
“Um reajuste de 27,3% é praticamente impossível. Depois de muitos erros, o Planalto está no rumo certo, mas precisará de habilidade para negociar em várias frentes. O Congresso terá de entender isso e aprovar as medidas provisórias reduzem a desoneração da folha de pagamento e endurecem as regras para os benefícios previdenciários”, avaliou Fábio Klein, da Consultoria Tendências.
Klein avaliou como “perigosa” a queda de braço entre a equipe econômica e o Legislativo. “Infelizmente, o ajuste parece não ser fundamental para a agenda política. Foi por isso que Joaquim Levy (ministro da Fazenda) ensaiou pedir demissão”, disse. “Se Levy jogar a toalha, será o caos. Vamos perder o grau de investimento”, completou José Matias-Pereira, especialista em finanças públicas da Universidade de Brasília (UnB).
Para Matias Pereira, o governo deveria dar o exemplo e cortar na própria carne. “Até hoje ninguém entende o porquê de haver 39 ministérios. Poderiam ser 18, no máximo 22. Além disso, sobram cargos em comissão. São essas decisões equivocadas de um governo perdulário, complicado pelo cenário de corrupção, que fazem as representações sindicais apresentarem números mirabolantes”, assinalou.
Os servidores contestam a análise dos economistas. Com base em dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), argumentam que a despesa com salários, que correspondia a 56,21% da receita corrente líquida, em 1995, caiu para 30,05% em 2012. Para o presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda (Sinprofaz), Heráclio Camargo, a equipe econômica apenas finge fazer ajuste fiscal. “É uma farsa. O governo arrocha a classe média para entregar tudo aos banqueiros. Basta ver que os juros estão aumentando. A cada 0,5 ponto de alta da taxa Selic, são gastos R$ 11,5 bilhões por ano com a dívida”, alegou.
Mais de 20 mil vagas em disputa
Mesmo sem grandes concursos abertos, as portas para a estabilidade do serviço público continuam escancaradas. Há mais de 20 mil vagas para todos os níveis de escolaridade, em certames municipais, estaduais e federais, com salários de R$ 642 a R$ 15,3 mil. Nesta semana, as inscrições se encerram em 41 oportunidades e 3.117 vagas. Os concursos com a maior remuneração estão em cidades de Mato Grosso e Minas Gerais. A Prefeitura de Japorã (MT) tem 17 oportunidades de nível superior na área de saúde com salário de R$ 13 mil; e, em Capitólio (MG), há 93 vagas para diversos cargos com ganhos que chegam a R$ 11.656.
A expectativa de abertura de novas seleções como as do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT); do Tribunal Regional Federal (TRF1); e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem mantido as salas de aula e bibliotecas cheias de concurseiros que não querem perder a chance de ingressar no serviço público. Segundo o professor de direito administrativo e empresarial Washington Barbosa, coordenador do Instituto de Capacitação Avançada (ICA), a remuneração esperada para o TJDFT é de R$ 7 mil (nível médio) e de R$ 9 mil (superior).
“No último certame, em 2013, só no meu curso, havia 5,5 mil alunos. Agora, além das oportunidades tradicionais, foram criadas 490 vagas para novas varas que foram abertas”, ressaltou Barbosa. A publicação do edital para o TRF é aguardada para junho, com provas previstas para agosto. “Tem os mesmos salários do TJDFT e engloba praticamente todo o Brasil, com exceção de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul”, explicou.
INSS
Na semana passada, correu um boato pelas redes sociais de que o concurso para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), cujo pedido de autorização tramita no Ministério do Planejamento (MPOG), teria sido cancelado. “A pasta apenas mudou o sistema de acompanhamento de processos administrativos. Os pedidos cadastrados foram arquivados. Quando o novo sistema começar a rodar, eles serão automaticamente ativados”, explicou o professor do ICA. Desde 2014, o INSS planejava abrir 2 mil oportunidades para técnico, 1.580 para analista do e 1.150 para perito médico previdenciário. Os salários são de R$ 4,4 mil a R$ 11,2 mil.
Barbosa esclareceu, ainda, que houve dois grandes booms de concursos nas décadas de 1970 e 1980. “A turma que entrou naquela época, está se aposentando. A União vai precisar de pessoal, não só no INSS, como em vários outros órgãos”, disse. Ele lembrou que o governo perde diariamente arrecadação, porque faltam profissionais de auditoria, controle e fiscalização. “É uma bobagem não repor pessoal”, opina.(VB)
Acampamento de protesto
Os servidores do Ministério Público da União e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) começaram, ontem, a montar um acampamento em frente à sede da Procuradoria-Geral da União (PGU), em Brasília. Em greve desde o fim de janeiro, a categoria reivindica a intervenção do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para que a presidente Dilma Rousseff inclua, no Orçamento de 2015, recursos para o reajuste de 56% desses funcionários. De acordo com o sindicato nacional da categoria (SinaseMPU – que engloba os MPs Federal, do Trabalho, Militar e do DF), o percentual equivale à recuperação de perdas de nove anos sem aumentos. O impacto total do aumento é de R$ 1,6 bilhão, escalonado em seis parcelas até 2017. A proposta prevê elevação dos salário da categoria de R$ 8 mil para R$ 9,8 mil, no início de carreira, e de R$ 13 mil para R$ 20 mil, no fim. Pelos cálculos do SinaseMPU, há dinheiro disponível para atender os funcionários, já que a proposta orçamentária do órgão contempla construção de sedes de mais de
R$ 1 bilhão, além de valores para troca da frota de veículos. (VB)
Fonte: Correio Braziliense