Reeleita, Dilma terá de decidir entre continuidade ou mudança

    Os desafios para a gestão da economia em 2015 são conhecidos pela presidente Dilma Rousseff e exigem uma reversão da política praticada desde 2011. Todos eles decorrem de desvios de rota em relação a uma fórmula que deu certo, experimentada no último governo de Fernando Henrique Cardoso e nos dois de Luiz Inácio Lula da Silva. Dado o marasmo da economia, a estratégica da presidente reeleita será gradual, com ajustes suaves para recolocar a inflação perto dos 4,5%, aumentar o superávit das contas públicas, reajustar preços administrados defasados e retirar do câmbio parte do peso de contenção inflacionária que teve recentemente.

    O primeiro sinal sobre os rumos que Dilma pretende imprimir virá da nomeação dos ocupantes dos principais cargos, a começar pelo ministro da Fazenda. A necessidade de refazer apoios e reconstruir pontes, após uma eleição polarizada e com resultado apertado para o governo, pode levar a presidente a corrigir rumos ou, então, reafirmar o caminho assumido com alguma abertura, escolhendo quadros do partido menos ortodoxos para a função.

    Se é possível eleger uma mudança que simbolizasse a intenção de corrigir os erros do passado, é a política fiscal. Há vários problemas importantes pendurados nela que é preciso resolver. O esforço fiscal praticamente nulo do primeiro mandato de Dilma foi determinado pelos estímulos à economia, como as desonerações fiscais, a redução de impostos para alavancar o consumo e, fora do orçamento, as injeções de recursos ao BNDES para elevar os investimentos. O governo sabe que, para evitar uma deterioração das contas públicas, não precisa de um superávit tão alto quanto o do início das administrações petistas (3,5% a 4% do PIB), e que, com algo entre 2% e 2,5% se pode manter constante a dívida bruta.

    Essa economia, porém, não foi feita até agora, e a dotação de recursos do Tesouro ao BNDES continuou, elevando a dívida bruta pela primeira vez em muito tempo. O efeito conjugado do anúncio de um superávit fiscal maior, com a interrupção da corrente de recursos para o BNDES, pode estancar o início de deterioração fiscal e evitar o risco de perda do grau de investimento do país, que teria o lastimável efeito de elevar o custo das captações externas para o governo e as empresas. Essa ameaça é imediata e sinais claros de medidas para evitá-la precisam ser, também, imediatas. Uma indicação de que a contabilidade deixará de ser “criativa” e se tornará monotonamente convencional seria vital para dotar de credibilidade o novo mandato.

    A correção dos preços dos combustíveis, evitada para não empurrar a inflação acima do teto da meta, terá de ser encarada. Uma das saídas é a recomposição da Cide, que servia de colchão de amortecimento dos repasses aos consumidores. A outra, não excludente, é o acerto de um mecanismo de reajuste que dê previsibilidade aos preços, como já foi pedido pela cúpula da Petrobras. As recentes quedas das cotações internacionais do petróleo já comeram toda a defasagem que sangrava os cofres da estatal. Apesar disso, não será possível adiar muito a decisão, da qual depende a saúde das empresas que produzem etanol, hoje em má situação. Um alívio no caixa da Petrobras também seria bem vindo.

    A resposta aos preços administrados dependerá da decisão sobre o nível dos juros. A inanição da economia não recomenda um aumento dos juros, enquanto que a inflação, sim. Como o horizonte possível para se atingir o centro da meta é de pelo menos dois anos, a taxa Selic não precisará subir, pelo menos em um primeiro momento. O juro real voltou a ser o maior do mundo e, em tese, é possível que haja pressão adicional por aumentos, advinda desta vez da normalização monetária dos EUA, cujos efeitos sobre o comportamento dos mercados não são previsíveis. Uma prudência momentânea com juros é a coisa certa a fazer. A presidente Dilma e o Banco CENTRAL não estão dispostos a ampliar o aperto monetário, a menos que a situação inflacionária fuja do controle, o que é muito improvável.

    A presidente terá de enfrentar de imediato situações de emergência, como a da seca no Sudeste. Terá também de reforçar a coordenação política, diante da pulverização de forças no Congresso e perda de força das bancadas majoritárias. Colocar em ordem o sistema tributário e pôr fim à guerra fiscal, duas tarefas quase impossíveis, dependerá muito da determinação com que o governo e sua base de apoio se dedicarem a ela.

     

    Fonte: Valor Econômico

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