Os mercados de Câmbio e Juros no Brasil voltaram a sentir a pressão do exterior, num pregão em que o estresse foi intensificado pela incerteza sobre a sinalização do Comitê de Política Monetária (Copom) a respeito do fim do ciclo de queda dos Juros e pelo ruído gerado pelo megalote de 13 milhões de prefixados ofertados pelo Tesouro Nacional.
O dólar voou a máximas desde o começo de julho. A moeda subiu 1,21%, para R$ 3,2835. Ao mesmo tempo, um conjunto de divisas emergentes fora o real caiu a mínimas não vistas desde março.
Mas foi na renda fixa que o movimento se mostrou mais intenso. As taxas dos contratos de Juros mais negociados na BM&F saltaram em média 27 pontos-base, variação comparável apenas à vista durante a hecatombe provocada pela divulgação de áudios gravados pelo empresário Joesley Batista, da JBS, que colocou em xeque a continuidade da agenda de reformas do governo Temer.
A disparada de taxas de DI veio acompanhada de forte volume de negócios, evidência de que as mudanças de posições podem ter sido de ordem estrutural. Pouco mais de 3,8 milhões de contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) trocaram de mãos, maior giro desde os dias seguintes à “crise Joesley”.
O noticiário de Brasília voltou a não dar argumentos para otimismo. A margem a favor do presidente Temer em votação na Câmara dos Deputados ficou mais apertada, alimentando receios de que a Reforma da Previdência possa demorar ainda mais para ser aprovada e, ainda assim, num formato muito mais enxuto que o desejado.
Os ruídos gerados pelas incertezas políticas pegaram um mercado ainda “com técnico ruim”, no jargão de operadores, em meio a um movimento descrito pelos “players” como fechamento de posições em Juros em prol do mercado de ações. Nesse contexto, o lote de 13 milhões de títulos prefixados ofertados pelo Tesouro Nacional serviu para gerar ainda mais distorção nos preços. Foi a maior oferta de prefixados em um dia desde julho. Apenas de Notas do Tesouro Nacional-Série F (NTN-F) o mercado absorveu 4,5 milhões, maior volume desde abril.
A NTN-F é um papel de prazo mais longo, portanto, mais suscetível a variações nas taxas de Juros de mercado. Essa característica exige que “players” busquem proteção (“hedge”) na curva de DI após leilões desse papel. O megalote de ontem acabou por intensificar essa demanda, o que ajuda a explicar a forte alta das taxas de DI nos vencimentos mais longos.
“O Tesouro estragou o mercado”, resume um profissional, acrescentando que já há algum tempo os investidores têm questionado a estratégia do Tesouro de elevar ofertas de prefixados.
O chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch no Brasil, David Beker, diz que a atuação do Tesouro foi tamanha que dificultou a leitura sobre a resposta dos Juros futuros à mensagem do comunicado do Copom. “Até esperava que a curva [de Juros] ficasse mais plana porque está chegando perto do fim do ciclo… Mas não está porque o leilão [do Tesouro] foi grande.”
A inclinação entre os DIs com vencimento em janeiro de 2023 e janeiro de 2019 – uma medida da percepção de risco – subiu 15 pontos-base, para o recorde de 250 pontos-base.
Ao longo do dia, o mercado debateu sobre o recado enviado pelo Copom ao ter excluído do comunicado a expressão “encerramento gradual do ciclo”. De forma geral, grandes Instituições Financeiras como Bradesco, Itaú Unibanco e BofA mantêm estimativas de que a Selic cairá abaixo de 7% até o começo de 2018. No entanto, reconhecem que aumentou a chance de o ciclo ser encerrado em dezembro.
Essa dúvida pôde ser percebida ontem nas precificações do mercado de DI. A curva embutia na quinta-feira 155 pontos-base de elevação da Selic ao longo de 2018, segundo cálculos de estrategistas da gestora Quantitas. No fim da tarde de quarta, antes da decisão do Copom, os contratos projetavam alta de 135 pontos do juro básico em relação ao patamar de fechamento de 2017.
A esticada dos Juros foi ditada ainda pela intensa pressão nos ativos de emergentes no exterior. O baque em moedas e renda fixa de países em desenvolvimento veio em novo dia de fortalecimento de apostas de alta de juro nos Estados Unidos, diante de sinais de avanço da proposta fiscal do presidente Donald Trump. A leitura é que mais estímulos tributários poderiam acelerar a volta da inflação, o que levaria o Federal Reserve (Fed, BC americano) a subir os Juros por lá com mais frequência que o previsto. Não por coinciência, os Juros dos Treasuries (títulos soberanos dos EUA) dispararam. O “yield” (retorno) do papel de dez anos foi a 2,463%, máxima desde março.
Fonte: VALOR ECONÔMICO