Segurança bancária deve virar competência federal

    A Câmara Municipal de João Pessoa (PB) aprovou em 2015 uma lei que determinou a instalação de vidros blindados na fachada de todas as agências bancárias da cidade. A medida foi tomada com o objetivo de aumentar a segurança nos estabelecimentos. Mas os bancos alegam que o efeito na prática é justamente o oposto: os criminosos poderão se valer da blindagem da agência como “escudo” contra a ação da polícia. Sem falar na maior dificuldade de acesso ao local em um possível caso de incêndio.

    A lei aprovada na capital da Paraíba é apenas uma entre milhares relacionadas a itens de segurança e conforto que os bancos precisam seguir para operar suas agências em todo o país. Para as instituições, muitas das normas editadas nos mais de 5,5 mil municípios brasileiros são inócuas ou podem deixar os clientes em situação ainda mais vulnerável.

    Essa situação pode mudar com a aprovação do Estatuto da Segurança Privada e da Segurança das Instituições Financeiras. A lei, em tramitação no Congresso, transfere para a esfera federal a competência sobre a segurança nas agências. O projeto foi aprovado na semana passada na Comissão de Assuntos Sociais do Senado e pode ser votado em plenário ainda neste ano.

    “Os bancos hoje atuam em todo o país e não somos um país com grandes diferenças regionais, por isso faz sentido ter uma legislação federal”, afirma Leandro Vilain, diretor de operações da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

    O gasto anual das instituições para prevenir roubos nas agências é da ordem de R$ 9 bilhões, de acordo com dados da Febraban. Entre os investimentos, estão a compra e manutenção de equipamentos como alarmes, sensores e câmeras. Os bancos empregam ainda cerca de 68 mil vigilantes para atuar nas 23 mil agências em todo o país.

    Para obter a licença de funcionamento de seus pontos de atendimento, os bancos já são obrigados por lei a apresentar um plano aprovado pela Polícia Federal. “A segurança já é garantida hoje”, diz Vilain, que destaca a redução no número de assaltos a agências. No início da década, eram quase 2 mil ocorrências, contra a previsão de menos de 200 roubos neste ano.

    Outras crimes, porém, têm se multiplicado. Um dos mais frequentes é a explosão de caixas eletrônicos por quadrilhas especializadas, em geral durante a madrugada. O aumento da criminalidade tem levado à reação das autoridades locais. “Muitos municípios, com a melhor das intenções, acabam impondo medidas que são ineficazes ou podem até piorar a situação”, afirma o diretor da Febraban.

    Uma delas, segundo os bancos, é a exigência da instalação de máquinas de escaneamento corporal nas entradas das agências bancárias, no lugar dos detectores de metal. Já são duas leis vigentes e oito projetos em tramitação no país, incluindo na Câmara Municipal de São Paulo.

    Adotados nos aeroportos americanos para combater terrorismo e tráfico de drogas, os equipamentos têm custo estimado de US$ 145 mil cada (R$ 452 mil ao Câmbio de R$ 3,12). Se tivessem de colocar os equipamentos em todas as agências do país, os bancos teriam um gasto da ordem de R$ 9 bilhões, segundo estimativas do setor. O valor não considera o custo da operação, que inclui o salário mensal de um técnico para operar o aparelho.

    Dinheiro é sempre uma variável sensível quando se fala em bancos, mas as instituições alegam que não se trata apenas de uma questão de custos. Para o profissional de uma instituição, as máquinas de escaneamento corporal são ineficazes para conter assaltos, já que o equipamento não impede a entrada de um potencial suspeito, como acontece com as portas giratórias. “Bastaria ao ladrão passar correndo pelo aparelho para entrar em uma agência”, afirma.

    Outra regra que preocupa os bancos é a determinação da presença de um vigilante 24 horas por dia nas agências. O objetivo da medida, que já conta com 76 leis vigentes e outros 29 projetos de lei pelo país, é impedir os roubos e explosões de caixas eletrônicos nas agências.

    Para os bancos, a presença de um vigilante não apenas não coíbe o crime como pode colocar em risco a vida do profissional e das pessoas ao redor, já que as agências ficam em locais de grande circulação. “Um vigilante com um [revólver calibre] 38 e um colete à prova de balas não vai conseguir combater quadrilhas fortemente armadas”, afirma Vilain. O mais provável é que o segurança também seja roubado, e a arma dele seja usada em outros crimes.

    “Ter vigilantes armados 24 horas por dia é deixar uma ou duas pessoas extremamente vulneráveis a ataques de grupos”, afirma Carolina Ricardo, coordenadora do Instituto Sou da Paz, que produziu um estudo sobre o tema para o Itaú Unibanco. “A arma dá uma falsa sensação de segurança.”

    De acordo com Carolina, um levantamento sobre armas apreendidas pela polícia no Sudeste em 2014 mostrou que há forte correlação entre o mercado legal e o ilegal, o que mostra que muitas armas registradas acabam desviadas para o crime. Ela também menciona dados da Polícia Federal de 1996 a 2015, que mostram que 217 mil armas foram roubadas ou furtadas da segurança privada – diretamente dos vigilantes ou das empresas. Para o Sou da Paz, que faz campanhas em prol do desarmamento, ampliar o uso de inteligência e tecnologia é um caminho muito mais eficaz para melhorar a segurança pública e privada.

    A proposta de federalizar a regulação das agências bancárias também conta com o apoio do Sindicato dos Bancários, que aponta para uma maior vulnerabilidade nos estabelecimentos localizados no interior. “As ocorrências ocorrem hoje em todo o país, por isso é importante que os bancos levem os itens de segurança que já adotam nas agências das capitais para as cidades menores”, afirma Gustavo Tabatinga, secretário de políticas sindicais da Contraf-CUT.

    Tabatinga alerta, porém, para um dispositivo incluído no Estatuto que, além de não ter relação com a questão da segurança, ainda pode prejudicar o direito de greve da categoria. A proposta prevê que o trabalho em Instituições Financeiras passe a ser considerado como um serviço essencial. “Acreditamos que o Senado vai tirar esse trecho do texto final”, afirma.

    Para a Febraban, a proposta não prejudica os trabalhadores. “Não existe proibição à greve, apenas a obrigação de se manter um mínimo de atendimento ao público”, diz Vilain, ao acrescentar que a população de baixa renda é a mais prejudicada pelo fechamento das agências, por ter menos acesso aos serviços pelos canais digitais.

    Leis regulam até itens para banheiro em agências
    De São Paulo

    Escadas móveis para portadores de nanismo em caixas eletrônicos. Atendimento preferencial para doadores de sangue. Protetor de vaso sanitário nos banheiros. Essas são algumas das normas que os bancos precisam seguir em alguns dos municípios onde possuem agências.

    Junto com a segurança, os itens de conforto dentro das agências bancárias são alvo constante da caneta de vereadores e deputados estaduais. Mas os bancos não são os únicos. Desde a Constituição de 1988 até o ano passado foram 5,4 milhões de leis editadas no país, ou 769 por dia útil, de acordo com estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).

    As Instituições Financeiras defendem que a regulação dos itens de conforto das agências bancárias também seja federal. Mas qualquer mudança depende de uma emenda à Constituição, segundo especialistas.

    A grande quantidade de regras a cumprir, sem falar na necessidade de acompanhamento dos projetos em andamento, se traduz em custos adicionais, que acabam sendo repassados para o preço dos produtos. O custo de monitoramento das legislações é estimado em R$ 60 bilhões pelo IBPT. “Bem ou mal os bancos contam com estruturas internas para atender à regulação, mas essa carga pode ficar inviável a um pequeno empresário”, afirma Leandro Vilain, diretor de operações da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

    Apesar das críticas, nem todos os projetos na área de segurança nascidos nas câmaras municipais e assembleias legislativas são inócuos. A lei estadual de São Paulo que determinou a colocação de divisórias entre o caixa e a fila para o atendimento se revelou positiva, segundo um executivo. A presença do biombo dificultou a chamada “saidinha”, golpe que ocorre quando um ladrão ataca um cliente que deixa a agência com uma quantia maior de dinheiro, a partir da informação de um comparsa que fica do lado de dentro.

    Fonte: VALOR ECONÔMICO

    Matéria anteriorIndicação ao banco do Brics deve sair em duas semanas
    Matéria seguinteFintechs ocupam espaço dos bancos no empréstimo a empresa