Envolvido em uma teia de problemas que se retroalimentam, o Congresso Nacional entra hoje em sua última semana de atividade com toda a estratégia fiscal de 2016 pendente. A aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que deveria ter ocorrido até agosto, ainda não foi votada e a meta de superávit primário prevista na proposta é objeto de embate dentro do governo. Sem a lei, não há previsão legal sequer para o pagamento de despesas obrigatórias no próximo ano.
Ao cenário soma-se um Legislativo em compasso de espera da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), prevista para quarta-feira, sobre o rito do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, o que resulta em uma série de medidas com a tramitação travada – como a volta da CPMF, a repatriação de recursos no exterior e mudanças no auxílio-reclusão, necessárias para tornar o Orçamento de 2016 factível.
O governo ainda tem que aprovar o Plano Plurianual (PPA) e, depois, a LDO para que a proposta de Orçamento possa ser analisada. Os dois primeiros itens da estratégia fiscal estão na pauta da sessão do Congresso Nacional marcada para amanhã, mas a prioridade será de cinco vetos presidenciais que estão na fila. Presidente do Congresso, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) já indicou que, para limpar a lista, vai convocar nova votação na quarta, mesmo dia em que os deputados e senadores voltarão suas atenções ao Supremo para saber o desfecho sobre o rito do processo que pode apear Dilma do cargo.
O parecer do Orçamento de 2016, feito pelo vice-líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), foi mal recebido por parte da base aliada e até por oposicionistas, ao propor corte de R$ 10 bilhões dos R$ 28,8 bilhões que seriam destinados ao programa Bolsa Família.
A tesourada, no entanto, foi feita para que a peça possibilitasse a manutenção do superávit primário R$ 34,4 bilhões (0,7% do PIB) exigido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. A ala do PT no Congresso alinhada ao ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, vai apresentar proposta para que a economia fiscal seja flexibilizada. Em conversas com parlamentares, Levy tem ameaçado deixar a cadeira se a mudança for levada a cabo.
Líder do governo na Comissão Mista de Orçamento, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) vai apresentar a emenda. “Uma meta de 0,7% do PIB é demasiada. Ou reduz isso ou retira [os gastos com] o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do cálculo”, sugere. O petista quer evitar o corte no Bolsa Família e em investimentos estratégicos, mesmo que isso contrarie o titular da Fazenda. “Quem aprova o Orçamento é o Congresso. Não é fulano ou ciclano que vai decidir”.
Depois que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deflagrou o processo de impeachment, as votações no Congresso ficaram travadas à espera da decisão final do Supremo, que deve ser proferida esta quarta. Dilma, Renan e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviaram documentos na sexta-feira que serão usados pelos ministros da Corte. Os três defenderam que, mesmo diante de uma decisão da Câmara de admitir o impeachment, ela só poderia ser afastada por 180 dias após o Senado chancelar a medida, o que não seria um ato automático. A Presidência pediu ainda a anulação de todos os atos de Cunha relacionados ao impeachment – da instauração do processo à criação da comissão especial.
As maiores chances de o governo ver projetos de seu interesse avançarem na Câmara estão nas comissões, poupadas pelo movimento de obstrução. Parte do pacote de ajuste fiscal, a proposta que prorroga e amplia a Desvinculação de Receitas da União (DRU) pode avançar amanhã, quando deve ser conhecido o parecer.
No plenário da Casa, duas medidas provisórias (MPs) continuam trancando a pauta. Uma delas faz parte da reforma administrativa, extinguindo e modificando cargos públicos. A outra eleva a tributação de bebidas e produtos eletrônicos. O texto foi modificado pelo relator, senador Humberto Costa (PT-PE), que aliviou a alta de encargos. Cunha, no entanto, já declarou que não acredita que haverá votações em plenário esta semana.
No Senado, a pauta está recheada de medidas sobre as quais não há acordo. O projeto que regulariza recursos mantidos no exterior e não declarados ao Fisco, de onde o governo espera arrecadar R$ 21 bilhões em 2016, está entre eles.
Provenientes da comissão especial da Agenda Brasil, patrocinada por Renan Calheiros, há duas medidas: a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do senador Aécio Neves (PSDB-MG), cria limites para a ocupação de cargos comissionados na administração pública. Outra, do senador Romero Jucá (PMDB-RR), acelera a liberação de licenças ambientais para empreendimentos de infraestrutura considerados estratégicos. Os senadores têm de analisar ainda o projeto, do senador José Serra (PSDB-SP), que libera a Petrobras das obrigações de ser operadora única no pré-sal e da participação mínima de 30% dos blocos licitados. (Colaborou Maíra Magro)
Fonte: Valor Econômico