O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, praticamente blindou a presidente Dilma Rousseff de sofrer um processo de impeachment ao alegar que ela só pode ser responsabilizada por atos cometidos durante o mandato. A tese foi aceita pelo ministro Teori Zavascki, relator dos autos Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), após Janot entregar os pedidos de abertura de inquérito contra políticos. Com isso, a não ser que surjam fatos novos, a presidente não deverá ser processada por impeachment no STF.
Janot e Teori se basearam no parágrafo 4º do artigo 86 que diz que a presidente, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizada por atos estranhos ao exercício de suas funções. Com base nessa tese, Dilma só poderia ser processada por atos praticados a partir de sua posse na Presidência, o que ocorreu em 1º de janeiro de 2011.
Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF, vai além e diz que os dois mandatos de Dilma devem ser vistos separadamente e, por isso, ela só poderia ser processada por atos a partir de 1º de janeiro de 2015. Segundo ele, o artigo 85 determina que “são crimes de responsabilidade os atos do presidente da República que atentem contra a Constituição”. “O verbo não está no passado”, afirma Britto. “A Constituição não diz: ´os crimes que atentaram´. O artigo fala de crimes no presente, ou seja, no exercício do atual mandato.”
Carlos Velloso, também ex-presidente do STF, explica que impeachment é “medida legal, prevista na Constituição e, portanto, não se pode falar que é golpe”. Mas, para ele, o eventual impedimento da presidente só poderia ser discutido a partir de “casos extremos e que exigem maiores critérios”. Velloso avalia que as citações envolvendo Dilma na Operação Lava-Jato “ainda não são suficientes para um impeachment”.
“Se essas improbidades que têm sido denunciadas na Petrobras – e parece-me que há outros casos de entidades públicas, como o BancoNacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – forem verdade, a questão é indagar se a presidente da República se omitiu para coibir esses atos de improbidade na Administração Pública. Isso precisaria ser investigado. Como não há investigação a esse respeito até agora, então, eu penso que não é adequado em falar-se em impeachment”, conclui Velloso.
Dilma foi citada por Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, que disse tê-la conhecido em 2004, quando ela presidia o Conselho de Administração da estatal. Costa afirmou que recebeu uma solicitação do doleiro Alberto Youssef para que R$ 2 milhões do caixa do PP fossem encaminhados para a campanha de Dilma à Presidência da República, em 2010. Já Youssef disse que essa afirmação “não é verdadeira”.
Com base nos depoimentos de Costa e Youssef, Janot concluiu que Dilma não poderia ser responsabilizada por atos que teriam sido cometidos antes de ela assumir o cargo. O caso da presidente sequer foi arquivado, pois não houve acusação implicando Dilma.
Por outro lado, tanto Britto quanto Velloso avaliam que a presidente pode ser processada por crime comum no STF caso surjam novas informações de que a presidente teria se omitido ao saber de irregularidades na estatal antes de assumir a Presidência da República e não tomou as devidas providências. Britto adverte que, mesmo nessa hipótese, não haveria impeachment. “Se for recebida denúncia ou queixa-crime contra a presidente pelo Supremo, ela ficaria suspensa de suas funções”, diz.
Para Velloso, as denúncias relacionadas à operação Lava-Jato são mais graves que os fatos que resultaram no processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor, em 1992. “Não se compara. O que está acontecendo na Petrobras é lamentável e está tendo repercussão internacional”, lamenta o ex-ministro.
Velloso diz ainda que não se pode contestar se Janot deveria ter agido de maneira diferente. “Não se pode discutir conveniência e oportunidade do procurador-geral. Eu não criticaria o procurador. É ele quem decide.”
Fonte: Valor Econômico