Inflação abaixo da meta em 2017 é cada vez mais provável

    A menos que o governo anuncie outro reajuste de impostos ainda este ano, é cada vez mais provável o cenário em que o Banco Central terá que escrever uma carta para, de maneira inédita, justificar uma inflação abaixo do intervalo da meta em 2017, acreditam economistas.

    O boletim Focus, divulgado ontem, revelou que o grupo de instituições que mais acertam previsões (Top 5) revisou a estimativa para a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 3,15% para 2,84% este ano. O piso estipulado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 3% e a taxa acumulada em 12 meses até agosto é de 2,46%.

    As previsões para a taxa de inflação também recuaram para mais próximas do piso da meta entre as demais instituições que alimentam o boletim Focus. A mediana agregada para 2017 caiu de 3,14% para 3,08%. Há quatro semanas, as estimativas dos analistas indicavam inflação de 3,5% neste ano.

    A Mongeral Aegon Investimentos é uma das casas que já projetava a inflação abaixo dos 3% em 2017, com o IPCA a 0,15% em setembro, 0,30% em outubro e 0,40% em novembro e dezembro, chegando ao fim do ano num acumulado de 2,90%. Agora, a economista Patrícia Pereira aguarda o IPCA-15 que será divulgado na quinta-feira para possivelmente revisar para baixo seus números.

    “Mantendo a dinâmica de inflação que estamos vendo hoje – uma recuperação da atividade ainda sem pressionar a inflação devido ao hiato [do produto] muito aberto e o desemprego melhorando, mas ainda via informalidade, com espaço para recuperação sem pressionar a inflação -, parece que esses meus números de 0,30% e 0,40% para outubro, novembro e dezembro estão muito altos”, afirma Patrícia.

    A Mongeral projeta o IPCA-15 de setembro em alta de 0,10%, na base mensal ajustada, com o acumulado em 12 meses caindo a 2,55%, ante 0,35% e 2,68%, respectivamente, em agosto.

    Segundo a economista, a inflação abaixo do piso no ano é influenciada principalmente pelos alimentos, que respondem por cerca de 25% do cálculo do IPCA. Mas além da alimentação, Patrícia destaca que os núcleos da inflação, que buscam eliminar ou reduzir a influência dos itens mais voláteis, continuam com comportamento benigno; a difusão (percentual de itens com alta de preços em relação ao mês anterior) segue abaixo de 50%; e mesmo a inflação de serviços, resistente no início da recessão, tem atualmente um comportamento favorável.

    A economista da Mongeral ressalta ainda que, pela primeira vez em muito tempo, ocorre uma “inércia positiva” como resultado da inflação benigna. Devido à indexação de itens como aluguéis e educação, além do salário mínimo, a inflação reduzida do passado recente tende a influenciar positivamente os números futuros.

    A expectativa da continuidade de uma inflação de serviços baixa é o principal fator para a Absolute Investimentos apostar num IPCA a 2,50% no fim de 2017. Vetor mais relevante da inflação de serviços, a renda da população não deve ter uma melhora expressiva a frente, acredita o sócio e gestor de renda fixa Renato Botto.

    Segundo o economista, a variação anual da massa salarial real passou a ser positiva recentemente por fatores como os dissídios coletivos do início do ano (feitos com uma inflação acumulada em 12 meses mais alta do que a atual), a queda da inflação de alimentos e a injeção de recursos do FGTS. Para o ano que vem o gestor lembra que o salário mínimo não deverá ter reajuste, tampouco os salários do funcionalismo público federal, e também a inflação deve voltar a subir, gerando perda de renda real até os próximos dissídios.

    “Todos esses são componentes que não vão fazer com que a recuperação da renda real seja algo vigoroso. Com isso, não tem porque achar que serviços sobem de forma muito abrupta”, afirma Botto. Além disso, se a Reforma da Previdência for aprovada, haverá maior disponibilidade de mão de obra no mercado, de pessoas que antes se aposentariam e agora terão que continuar trabalhando, por conta da regra de transição. Isso também poderá ser um fator a contribuir para a fraca inflação de serviços, diz.

    Do ponto de vista fiscal, a inflação baixa em 2017 pode trazer dois efeitos opostos. Por um lado, pode dar alívio ao gasto público – limitado em 2018 ao teto de 2017, corrigido pelo IPCA acumulado em 12 meses até junho (3%). Caso a inflação feche o ano abaixo disso, deve impactar o reajuste do salário mínimo, que afeta parte relevante da despesa, como o pagamento de benefícios previdenciários e assistenciais e outros gastos sociais. “Isso cria um alívio para o gasto no ano que vem”, diz Fábio Klein, da Tendências Consultoria.

    Por outro lado, se a inflação voltar a subir em 2018, como esperado, haverá perda do poder de compra do orçamento, dificultando o cumprimento do teto.

    Fonte: VALOR ECONÔMICO

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