Os gastos com Juros considerados para o cálculo da “regra de ouro” somaram R$ 203,11 bilhões em 2017, segundo dados do Tesouro Nacional informados ao Valor. Houve ligeira queda em relação aos últimos dois anos, mas o montante ainda ficou bem acima dos níveis verificados de 2010 e 2014, cuja média foi de R$ 139,8 bilhões.
Os Juros são despesas correntes que em tese não podem ser cobertos por emissão da dívida, conforme norma constitucional. Para fins de cálculo da “regra de ouro”, o Tesouro considera o gasto com o serviço da dívida descontando a inflação medida pelo Índice Geral de Preços -Mercado (IGP-M).
A definição desse critério de uso do juro real para os cálculos da “regra de ouro”, segundo o órgão informou, está prevista nos artigos 5º e 29º da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que determinam a atualização do principal da dívida pública por algum índice de preços. “Isso implica que os Juros registrados estão apartados da inflação, isto é, são Juros reais”, diz o Tesouro.
Ao descontar a inflação, a conta de Juros ficou nos últimos três anos mais de R$ 100 bilhões menor que a despesa nominal dessa rubrica divulgada pelo Banco Central. Em 2016, por exemplo, o governo central teve gastos de R$ 318,4 bilhões, enquanto, para efeito da “regra de ouro”, a conta foi de R$ 204,9 bilhões. No acumulado em 12 meses até novembro deste ano, a conta de Juros calculada pelo BC era de R$ 342,8 bilhões.
As apurações do Tesouro e do BC, além da diferença dada pela inflação, também estão relacionadas a fatores de ordem contábil. O BC faz a apuração pelo critério “abaixo da linha”, que considera a variação no endividamento da União e regime de competência, enquanto o Tesouro considera o regime de caixa e o sistema “acima da linha”, que apura receitas e despesas.
Apesar de o uso do juro real reduzir o tamanho da carga considerada na apuração das despesas correntes, a queda da inflação é um fator que acaba sendo negativo para o governo. Isso porque a inflação é aplicada sobre o principal dos títulos e depois o resultado é descontado do juro contratado. Nos papéis pré-fixados já emitidos isso significa que a carga de Juros real pode subir, afetando o resultado total negativamente para o governo. Assim, o encargo financeiro é o mesmo, mas relativamente a um período de inflação mais alta pode ter havido alta na despesa.
Segundo José Roberto Afonso, o especialista em contas públicas do Ibre-FGV, o problema é que “nem sempre é fácil definir o que é inflação, como no caso dos papéis pré-fixados”. “Quando a inflação era muito alta e oscilante, dava enorme diferença medir a inflação já realizada versus a esperada em determinada data. Aí se carregava na mão no que era correção monetária, correção cambial, atribuindo sempre o máximo possível como despesa de capital, e não como Juros correntes, o que ajudava a cumprir a regra de ouro”, diz.
Segundo Afonso, o sistema de apuração do Tesouro poderia ser de competência e não de caixa. “Melhor seria usar regime de competência, como nas demais despesas. Tanto dá para calcular, que o BC sempre fez assim.”
O cumprimento da “regra de ouro” é a maior dificuldade que o governo tem que equacionar após anos de elevados déficits fiscais. A situação de 2018 só será resolvida porque o Ministério da Fazenda ganhou a queda de braço com o BNDES, forçando o banco a aceitar devolver R$ 130 bilhões ao Tesouro Nacional, o que deve ocorrer no segundo semestre.
O Déficit primário abaixo do esperado em 2017 também ajudará no cumprimento do dispositivo, já que permitirá que fontes de receita antigas possam ser contabilizadas como de capital.
A queda do juro básico, que hoje em termos reais está perto de 3%, também tende pressionar menos as contas governamentais, ao reduzir a conta prevista para este ano, ainda que isso possa ser mitigado pelo efeito paradoxal sobre os papéis pré-fixados. O Tesouro, contudo, não informou a estimativa dessa despesa para 2018.
Fonte: VALOR ECONÔMICO