Por José de Castro | De São Paulo
Preparem-se para dólar mais forte no mundo nos próximos meses, ainda que temporariamente. Esse é o conselho de analistas e estrategistas de Câmbio, que destacam os consequentes riscos a moedas emergentes diante da postura mais protecionista do governo de Donald Trump.
A reação dos mercados de Câmbio ontem deu uma boa sinalização de qual pode ser o caminho caso Washington intensifique o tom em relação às relações comerciais dos EUA com o restante do mundo. As moedas emergentes recuaram a mínimas em dez dias, segundo dados do Deutsche Bank, sob peso da queda de divisas correlacionadas às matérias-primas – como rand sul-africano e real brasileiro. E uma medida de risco atribuída a essa classe de ativos sofreu ontem a maior alta em cinco semanas, de acordo com índice do Barclays.
No Brasil, o dólar fechou em alta de 0,90%, para R$ 3,290, no maior nível desde o último dia 9 de fevereiro. Na máxima, a cotação beirou os R$ 3,30 ao tocar R$ 3,2966.
Profissionais do mercado explicam que a perspectiva de recuperação do dólar no curto prazo está ligada ao aumento da percepção de risco com a política comercial americana, cujo tom protecionista ganhou reforço com a indicação de Larry Kudlow para substituir Gary Cohn como chefe de conselho de assessores econômicos da Casa Branca. Ontem, Kudlow não somente demonstrou suporte às ideias de Trump como fez uma incomum recomendação sobre ativos financeiros: “Eu compraria o rei dólar e venderia ouro”.
“Mais até do que a questão se os Juros sobem mais ou não nos Estados Unidos, acredito que os desdobramentos das medidas comerciais do governo Trump terão efeito importante no dólar daqui para a frente”, diz Rafael Biral, responsável pela mesa de clientes do Standard Chartered Bank no Brasil.
A elevação de tom do governo Trump veio um dia depois de a Casa Branca confirmar o objetivo de cortar em US$ 100 bilhões o Déficit comercial dos EUA com a China. O receio é que Washington adote medidas diretas contra Pequim, o que poderia gerar retaliação chinesa e, assim, gerar desdobramentos negativos a mercados emergentes que exportam para o gigante asiático.
Em 2017, a China se manteve como o principal destino das exportações brasileiras (22% do total). Dos US$ 67 bilhões de superávit comercial recorde no ano passado, 30% vieram exclusivamente do comércio brasileiro com a nação asiática.
Para o Morgan Stanley, tanto a postura comercial americana quanto o movimento esperado do Federal Reserve (Fed, BC americano) e de outros importantes Bancos Centrais indicam que as “robustas” condições de liquidez podem “em breve” se tornar “coisa do passado”. “Sair de uma visão otimista para uma visão mais pessimista para ativos de risco será a consequência”, diz Hans Redeker, chefe global de estratégia de Câmbiodo Morgan.
Redeker diz que aproveitará mínimas do dólar para preparar o portfólio para uma alta de 4% do índice DXY – que mede o valor da moeda americana ante uma cesta de divisas. Nesse contexto, o Morgan Stanley decidiu remover sua posição comprada em real brasileiro contra dólar australiano.
Vassili Serebriakov, estrategista de Câmbio do Crédit Agricole em Nova York, lembra que, como parte desse contexto, os custos de financiamento bancário nos EUA bateram ontem máximas em seis anos, elemento favorável ao dólar. “O mercado parece mais na defensiva antes do Fed“, diz, referindo-se à decisão de política monetária do BC americano da próxima semana, para a qual espera indicação de quatro altas de Juros ao longo deste ano.
Esse ambiente menos propício a risco afetou ontem também o mercado local de Juros. Apesar de sofrerem menos que outros ativos brasileiros, as taxas voltaram a subir com aumento da percepção de risco sobre o médio prazo. Os Juros projetados de ontem até janeiro de 2020 e 2021 subiram 3 pontos-base para 7,380% e 8,260% ao ano, respectivamente. (Colaborou Lucas Hirata)
Fonte: Valor Econômico