Edição 0 - 21/06/2010

BOCA LIVRE – Ideia, crítica & debate – nº 9, de 21.6.10: Borralhos eleitorais e preocupações sindicais

 

 

 

BOCA LIVRE

Ideia, crítica & debate                 

São Paulo, 21 de junho de 2010 – nº  9

 

EDITORIAL

Passado o plebiscito do Sinal, é o momento de se retomar outros temas, como diz o autor do texto de hoje, o filiado Idalvo Toscano (DESUP/DESP2/SUESP-02), economista, ativista do movimento de Economia Solidária e Coordenador de Estudos Técnicos do Sinal-SP.

Boa leitura!

BORRALHOS ELEITORAIS E PREOCUPAÇÕES SINDICAIS

Idalvo Toscano

"Acho que na sociedade atual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objetivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objetivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem idéias, não vamos a parte nenhuma".

[José Saramago, 15.11.1922 – 18.07.2010]

Passado o mal concebido "plebiscito" do Sinal, com sua pífia participação, retornam os temas conjunturais que dizem respeito ao compromisso que a Autoridade Monetária deve ter com a sociedade brasileira.

Muito se tem falado no descontrole do déficit público; comentaristas econômicos de diversos matizes insistem no tema. Sem adentrar na qualidade desses comentários – no mais das vezes estreitos, em nossa modesta opinião – apresentamos algumas considerações a partir de outro ângulo de visada; não convencional, por certo.

A preocupação da semana foi o reajuste de 7,72% das pensões e aposentadorias da Previdência Social. Este seria, na visão dos comentaristas, um forte fator de desequilíbrio das contas públicas, em particular, das contas previdenciárias.

Na essência, a existência ou não de déficit previdenciário "depende… de como são entendidos o sistema de proteção social e a base financeira construída para lhe dar sustentação". [1]

Temos, assim, três visões: 1) a constitucionalista; 2) a fiscalista; e 3) a pragmática. Todavia não nos deteremos na apreciação das mesmas, por fugir do objeto de nossas atuais preocupações. Registremos apenas que, ao contrário do que se divulga, "as receitas da seguridade têm financiado gastos do Tesouro, contribuído para a realização do superávit primário e, consequentemente, para o pagamento dos juros da dívida pública". [2]

Em continuidade: em excelente artigo divulgado em 17 p.p., intitulado "O RATO E O ELEFANTE", o mestre em finanças pela FGV/SP, Amir Khair, apresenta alguns dados essenciais à análise do "rombo" de R$ 1,6 bilhões nas contas do governo federal, provocado pelo reajuste previdenciário. Este seria o RATO.

Por outro lado, afirma que a previsão do mercado financeiro para a Selic (geralmente acompanhado pelo Copom) até o final de 2010 – 11,75% -, permanecendo nesse patamar até o final de 2011, provocaria, no mínimo, uma despesa adicional de R$ 8 bi (2010) e R$ 16,1 (2011), portanto de R$ 24,1 bi até dezembro do próximo ano. Essa estimativa admite que só os títulos atrelados à Selic, no montante de R$ 536,7 bilhões causariam essa despesa e que a dívida federal permanecesse estagnada, o que é irreal. "Eis o filhote de ELEFANTE", diz Khair.

Ressalte-se o impacto negativo sobre o endividamento público daí decorrente que levaria as despesas com o pagamento de juros (estimados em R$ 172 bilhões neste ano), a mais de "treze vezes os R$ 13,1 bilhões previstos para o orçamento do Bolsa Família neste ano (2010)". [3]

Além disso, continua Khair, se:

 "A dívida atrelada à Selic irá crescer, a cada mês, acima dos R$ 536,7 bilhões e os aplicadores em títulos do governo não atrelados à Selic irão exigir ganhos em suas aplicações acompanhando as elevações da mesma. No final de abril a dívida atrelada à Selic correspondia a 36,0% da dívida em títulos do governo federal. Admitindo que isso ocorra gradualmente a partir de julho até o final do ano e que a dívida total em títulos registrada no final de abril de R$ 1.492,9 bilhões, cresça segundo a tendência ocorrida neste primeiro quadrimestre, o aumento causado pela elevação da Selic com seus reflexos daria R$ 15,2 bilhões neste ano e R$ 55.0 bilhões em 2011". Taí o ELEFANTE.

 

O ELEFANTE

 

Adicional de juros

 

(R$ milhões)

 

 

 

Mês

2010

2011

jan

4.258

fev

4.317

mar

4.376

abr

22

4.435

mai

341

4.494

jun

611

4.553

jul

944

4.612

ago

1.360

4.671

set

1.940

4.730

out

2.555

4.789

nov

3.194

4.848

dez

4.199

4.907

Total:

15.166

54.990

Não se trata, assim, de "planilhar" os riscos potenciais que o reajuste dos benefícios previdenciários possa causar sobre as contas públicas e alardear o descontrole das mesmas: o risco de uma sangria provocada pelo aumento da Selic é assustadoramente maior. Como se vê, "O Perigo Mora ao Lado", ou, se preferirmos, estamos "Dormindo Com o Inimigo".

O argumento de que a economia está superaquecida e, deste modo, necessário se faz o freio dos juros (já que o diagnóstico é de inflação de demanda), não considera a possibilidade da implementação de uma política de desenvolvimento, voltada à produção de bens populares, que traga consigo a criação de postos de trabalho na "base" do capitalismo, além de outras possibilidades de dar continuidade ao crescimento econômico de forma equilibrada, tais como a redução do crédito – ampliação do compulsório, aumento do IOF, "encurtamento" dos prazos de financiamento etc. etc. – que teriam o condão de atuar pontualmente e de forma seletiva, segurando a demanda dos setores mais aquecidos, sem penalizar e sem transferir renda do conjunto da sociedade ao setor financeiro.

Todavia, o viés rentista dos dias atuais impede uma visão mais sensível aos interesses da coletividade, sob o argumento do controle de preço como suprema conquista de todos os cidadãos, o que não é, exatamente, verdadeiro.

Em passado recente, a Autoridade Monetária teve oportunidade de "dar uma cacetada" nos juros, mas para baixo; a redução de alguns pontos percentuais na Selic, quando da crise de 2008, poderia ter sido muito mais eficaz (e custado bem menos às contas públicas) ao processo de recuperação da economia do que o descongelamento do compulsório. Ademais, teria provavelmente desempossado o crédito que, ao fim e ao cabo, se destinou, por aversão ao risco, à aquisição de títulos públicos, assunto objeto, inclusive, de reclamos do Sr. Presidente da República.

Por fim, faz todo o sentido sermos cautelosos na defesa da irrestrita autonomia operacional do BC: é necessário um firme controle social (que não necessariamente reside no Congresso Nacional), pois a Autoridade Monetária não é menos ou mais falível que qualquer instituição republicana.

—————————–

[1] Nota Técnica nº 52 – DIEESE

[2] Idem

[3] Sindicato dos Bancários – (site: http://www.bancarios.com.br)

PALAVRAS FINAIS

Você tem algo a acrescentar ou uma opinião diferente sobre o assunto? Você gostaria de escrever sobre outro tema? Sua opinião é valiosa e poderá ser publicada em próximo boletim.

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