FELIZ ANIVERSÁRIO!

    Em julho de 2009, o cenário, na diagonal esquerda para quem estava sentado num dos tamboretes no interior de uma determinada padaria em São Paulo, era de um grupo de pessoas negras, formado por um casal e três meninas. Uma delas maior e as outras duas bem pequenas. Todos, vestidos de maneira tosca, ocupavam uma das mesas.  Se o foco se fixasse em frente à padaria perceberia um carrinho de mão estacionado ao lado da porta, abarrotado de papelões, garrafas plásticas, jornais velhos e latas de bebidas. Um esforço maior iria sugerir que o carrinho pertencia àquelas pessoas que, provavelmente, deveriam formar uma família de moradores de rua, catadores de lixo.  No centro da mesa surgiu um desses bolos comprados pronto. Mesmo a distância dava para ver que a vela branca, afixada no centro do bolo, era de nove anos. A suposta mãe, olhando para todos os lados como que para pedir licença, passou a entoar o “Parabéns para você”. Os membros da família fizeram coro. O espectador da cena pediu ao garçom da padaria que abrisse uma coca-cola família e entregasse na mesa da aniversariante. Depois, olhou em direção a calçada do outro lado da rua e viu alguns camelôs. Foi até lá e comprou três bonecas que não custaram R$10,00. Voltou à padaria e distribuiu as bonecas entre as crianças. Para a aniversariante a boneca maior. Os gestos não lhe renderam nenhum orgulho. Era o mínimo que poderia fazer. Em meados de 2010 o rádio estava sintonizado na BandNews FM e o colunista Salomão Scchvartzman contava que viu, num bar do centro de São Paulo, uma família de catadores de lixo comemorando o aniversário da filha única. O pai comprou um pedaço de bolo que estava exposto na vitrine, improvisou como vela um pavio de fósforo aceso e os três cantaram o “Parabéns”. O radialista, em homenagem à ilustre aniversariante desconhecida, colocou para tocar, com tudo o que a menina tinha direito, o “Parabéns”, ricamente musicado.       A primeira história, jamais revelada e similar a relatada pelo Salomão Scchvartzman (pessoa que nunca vi), aconteceu comigo, um ano antes dele contar a sua. As explicações  para a igualdade dos acontecimentos pode estar no fato de que “qualquer semelhança é mera coincidência” ou que “existem mais mistérios entre o céu e a terra do que pode imaginar a nossa vã filosofia”. Só sei que quando ouvi a versão do Salomão no rádio, passei a temer que tudo fosse apenas fruto da minha imaginação ou de uma história amortecida no cérebro que um dia ouvi de um terceiro. Contudo, tenho certeza de que jamais vou esquecer o abraço apertado, o frio calor do corpo, o hálito rascante e o sorriso aberto de agradecimento daquela menina, para quem, toda vez que me lembro desejo Feliz Aniversário!

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