Por Flavia Lima | De São Paulo
Com a inflação consistentemente acima do centro da meta desde 2010, o esforço fiscal e monetário necessário para voltar aos 4,5% será significativamente maior e deve trazer resultados apenas no médio prazo. Estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) aponta que um horizonte razoável para a convergência da inflação para o centro da meta, de 4,5%, se daria apenas em 2018.
Partindo de um cenário de referência que conta com um superávit primário de 1% do PIB, taxa de câmbio de R$ 2,55 e uma taxa básica de juros de 11,25% no fim de 2014, o estudo analisa as políticas econômicas necessárias para trazer a inflação à meta usando, em um modelo matemático, três cenários extremos. No primeiro deles, alterando apenas a política fiscal para retornar aos 4,5% seria necessário um esforço adicional no superávit primário de 1,6 ponto percentual até o fim do período considerado. Portanto, a meta de superávit primário precisaria atingir mais de 4% do PIB a partir de 2016 – o maior esforço fiscal realizado em mais de dez anos.
Na política monetária, seria necessário que a taxa de juros chegasse ao pico de 14,25% ao ano (percentual atingido pela última vez em 2006), retornando aos poucos a níveis mais baixos, para que, ao final de 2018, a inflação voltasse ao centro da meta. Sozinhos, os instrumentos trariam custo imenso à economia. Assim, diz o estudo, o caminho para trazer a inflação de volta aos 4,5% deve ser um mix entre esses dois cenários, além de um esforço maior de controle de expectativas, a partir de uma mudança radical da postura da autoridade monetária.
O exercício faz parte de um estudo mais amplo que ajuda a explicar por que o baixo crescimento da economia continua a gerar inflação acima do centro da meta de inflação e por que reancorar as expectativas custará tanto esforço e tanto tempo. Em “Estimando o Hiato do Produto” – o indicador que aponta o quanto a economia pode crescer sem acelerar a inflação -, os pesquisadores Vinícius de Oliveira Botelho, Samuel Pessôa e Silvia Matos usam nova metodologia, a partir da qual tentam identificar melhor os chamados “choques de demanda” na economia – ou em que medida a demanda por bens e serviços vem sendo suprida por mais horas trabalhadas de funcionários ou máquinas, o que pode elevar custos e gerar inflação.
As metodologias para calcular o hiato do produto não são consensuais. porque, no geral, funcionam bem para explicar os choques que desaguam em inflação enquanto a economia mantém uma trajetória uniforme, mas não quando há uma mudança de tendência – o que pode levar a autoridade monetária a aumentar a dose de juros quando a economia não se recuperou completamente, ou relaxar a política monetária quando os sinais são ainda inflacionários.
É justamente nesse quesito que a metodologia desenvolvida pelo Ibre promete se sobressair. Segundo os pesquisadores, ela consegue capturar com mais acuidade os choques de demanda “ruins” (que vão dar em inflação) e pode ser um instrumento adicional importante na caracterização desses choques daqui para frente – coisa que não aconteceu no passado recente.
De acordo com a metodologia, a atividade econômica não desacelerou tanto quanto se imaginou em 2009 e também em 2011, daí as pressões inflacionárias mais persistentes atualmente. A sensação de desaceleração brusca da economia foi curta e os estímulos maciços que foram dados para que ela se reerguesse, na verdade, contribuíram para mais inflação.
Para Botelho, um dos pesquisadores, a nova metodologia poderia ter funcionado logo depois da crise de 2008 como uma espécie de alerta mais rápido e mais preciso da aceleração de demanda da economia. “Isso é coisa que outras estimativas não apontam e ajuda explicar porque o baixo crescimento continua gerando inflação”. Botelho diz ainda que a simulação mostra que o período de convergência para o centro da meta será longo, o que significa que nossa resistência a choques de oferta causados, por exemplo, por uma seca, está muito menor. “O que significa dizer que esses choques podem levar a inflação para o teto da meta novamente, alargando o período de ajustamento. Ficamos mais sensíveis nesse sentido.”
Fonte: Valor Econômico