A taxa de juros implícita na dívida líquida do setor público, hoje de 17%, pode chegar a 21,6% em 2016 e permanecer acima de 20% pelo menos até 2018, aponta a Carta do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia) da FGV, que será divulgada esta semana.
A pior consequência de juros implícitos tão altos é que os superávits primários necessários para estabilizar a dívida líquida nos próximos anos são elevados e, portanto, difíceis de ser executados. Este ano teria que ser de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), percentual que se aproximaria de 4% do PIB nos anos subsequentes por causa do aumento dos juros implícitos.
A boa notícia, porém, é que usando as mesmas premissas, a tendência da dívida bruta – hoje tida como o mais importante indicador de solvência do país – é cadente. Na dívida bruta, o que pesa é a Selic, cuja taxa é bem menor do que os juros ímplícitos.
O cenário que a carta apresenta, portanto, segundo Luiz Guilherme Schymura, presidente do Ibre, “não é apocalíptico”. Mas para isso, indica, será preciso que o próximo governo assuma alguns compromissos relevantes: em primeiro lugar, estabilizar como proporção do PIB os aportes de recursos da União no BNDES; e não mais acumular reservas. Ao contrário, reduzir as reservas cambiais dos atuais 16% do PIB para a casa dos 13% do PIB.
É claro que tudo depende dos pressupostos considerados nos modelos, tais como a evolução da Selic, da taxa de câmbio, da inflação, do PIB e do superávit primário (ver tabela).
Desde 2012 os juros implícitos da dívida líquida vêm subindo apesar de a taxa Selic ter caído para 7,25% por sete meses (entre outubro de 2012 e abril de 2013). O descolamento entre o custo real da dívida líquida e a taxa Selic deve-se ao fato de que pouco mais de 25% dos ativos do setor público – as reservas internacionais e os créditos do Tesouro Nacional contra os bancos públicos – rendem menos do que a Selic.
Em fevereiro, os créditos aos bancos públicos somavam 9,7% do PIB. Desses, 8,6% eram com o BNDES que este ano reivindica mais cerca de R$ 45 bilhões de recursos da União. Os empréstimos ao BNDES rendem TJLP de 5% ao ano. Já as reservas cambias são remuneradas com base na Libor mais a variação cambial.
Um dos motivos da elevação dos juros implícitos nos próximos anos é o aumento da taxa Selic que já está em 11% ao ano e deve, segundo o estudo do Ibre, subir mais a partir de 2015.
Mesmo com superávits primários crescentes, de 1,3% do PIB, em 2014, 1,8% do PIB, em 2015, e 2,2% entre 2016 e 2018, a trajetória da dívida líquida é fortemente ascendente. Passaria de 33,8% do PIB, em 2013, para 40,7%, em 2018.
Já o esforço fiscal necessário para estabilizar a dívida bruta, que atingiu 56,8% do PIB ao fim de 2013, é bem mais suave: de 1,5% do PIB.
Para Schymura “a estratégia mais sensata” seria criar as condições para estabilizar a dívida líquida nos próximos anos em algum ponto do intervalo atual, entre 35% e 55% do PIB.
Seria fundamental, porém, enfrentar os fatores que fizeram explodir o “spread” entre a Selic e os juros implícitos da dívida líquida. Ou seja, o Tesouro deveria parar de expandir seus créditos ao BNDES de tal forma que o montante permanecesse pelo menos estável como proporção do PIB nominal.
Levando em conta a persistência inflacionária, parte substancial dos analistas de mercado acredita que o Banco CENTRAL vai parar de aumentar aSelic, mas que o ciclo de aperto monetário recomeça após as eleições de outubro. As projeções do Ibre consideram a taxa de juros básica de 14,75% em 2015 e 2016, caindo para 12,75% nos dois anos seguintes.
Considerando-se as projeções da Selic e do IPCA, os juros reais sobem de 4,32% este ano até um pico de 7,75% em 2016, e depois recuam para 6,77% em 2018.
O que o quadro fiscal revela, portanto, é que o país não está diante de um cenário “assustador”, sublinha Schymura.
Poderia estar melhor, sem dúvida. Mas o retrato que o estudo do Ibre mostra é que as contas públicas não estão sob ameaça de uma dominância fiscal. Essa se relevaria quando, em um ambiente de grande aversão ao risco por parte dos investidores, qualquer elevação da taxa de juros poderia ser interpretada como maior probabilidade de um calote da dívida pública.
Se o risco de solvência está fora do horizonte, a importância da política fiscal não se torna menos relevante no quadro macroeconômico. Em um país dependente de poupança externa para financiar os investimentos, como é o caso do Brasil, o melhor seria que o setor público poupasse, deixando de avançar sobre a poupança privada.
Fonte: Valor Econômico