Estímulo de bancos centrais repercute no câmbio

    A onda de programas de estímulo lançados por bancos centrais este ano parece uma guerra econômica mundial. Em rápida sucessão, países que respondem por mais de 30% da produção econômica mundial – desde a zona do euro até a China, Austrália e Canadá – tomaram medidas que provocaram a desvalorização de suas moedas.

    Mas, se isso é uma guerra, ainda está bem pacífica.

    Metade dos bancos centrais das economias desenvolvidas e emergentes que formam o Grupo dos 20 – cujas autoridades financeiras vão se reunir nesta semana em Istambul, na Turquia, para discutir a economia mundial – já tomaram iniciativas de afrouxamento monetário neste ano.

    As medidas – a maioria na forma de cortes de juros, mas também de compras de ativos – reverberaram nos mercados de câmbio, empurrando as moedas de alguns países para baixo e as de outros, principalmente a dos Estados Unidos, para cima. O efeito ajuda as economias dos países que estão relaxando suas políticas monetárias, mas, ao mesmo tempo, complica a vida de alguns bancos centrais, como o americano Federal Reserve, e cria desafios para exportadores, como EUA, Suíça e Dinamarca.

    “Há um consenso crescente no mercado que uma guerra cambial da qual não se fala teve inicio”, dizem David Woo e Vadim Iaralov, do bank of America Merrill Lynch, numa nota a clientes. Eles observam ainda que a magnitude das oscilações nos mercados de câmbio em 2015 atingiu os níveis mais altos nos últimos 20 anos, excluída a crise financeira. 

    A menção a guerras cambiais evoca a ideia de países deliberadamente tentando forçar a desvalorização de suas moedas para impulsionar exportações e reprimir importações à custa dos vizinhos. Guerras cambiais são, por definição, um jogo de soma zero.

    Essa, porém, é um pouco diferente: em grande parte, os bancos centrais não estão tentando reduzir a taxa de câmbio ao, por exemplo, comprar moedas estrangeiras no mercado aberto, como fizeram em guerras cambiais passadas. Eles estão fazendo o que acreditam ser o melhor para suas economias e, se suas moedas se enfraquecerem no processo, tanto melhor. 

    Com a possível exceção da Suíça, cuja economia pode estar abalada por uma súbita disparada no franco suíço – depois que o BancoCENTRAL do país extinguiu inesperadamente o teto de valorização da moeda em relação ao euro -, essa suposta guerra ainda não fez claramente nenhuma vítima. De fato, há um aspecto semelhante a uma soma positiva nela: à medida que um Banco CENTRAL lança estímulos, outros são forçados a seguir o exemplo para aliviar a pressão para cima nas suas moedas. 

    Ao contrário de programas de afrouxamento monetário anteriores, esses últimos esforços – de economias que somam US$ 36 trilhões em produção anual – não têm como objetivo combater crises financeiras, como aquele liderado pelos EUA há seis anos. Em vez disso, os bancos centrais estão tentando conter os riscos de deflação e estimular o crescimento econômico.

    A onda atual de afrouxamento monetário começou na Europa, que já foi um centro de bancos centrais conservadores liderados pelo Bundesbank alemão. 

    Em janeiro, o Banco CENTRAL Europeu anunciou um programa de compra de títulos, a maior parte de dívida pública, que pode abranger 1 trilhão de euros (cerca de US$ 1,13 trilhão) até meados de 2016.

    A medida causou grande impacto em todo o continente. 

    A Suíça respondeu mesmo antes do programa ser anunciado, abandonando o teto fixado para a flutuação do franco ante o euro. O Banco CENTRAL da Dinamarca cortou juros quatro vezes em três semanas.

    A Suíça e a Dinamarca também compraram um volume considerável de moeda estrangeira em janeiro para conter a valorização de suas próprias moedas. A Suécia e a Polônia podem cortar os juros nas próximas semanas, dizem analistas, e o Banco CENTRAL da República Tcheca informou que está pronto para tomar medidas que impeçam a moeda do país de se valorizar ante o euro. 

    Os europeus puseram à prova a ideiadequeháumlimiteatéonde os juros oficiais podem cair. As taxas de depósito sobre reservas bancárias fixadas pelos bancos centrais da Suíça e da Dinamarca estão ambas negativas, em -0,75% ao ano. O BCE também tem uma taxa de depósito de -0,2%, o que significa que os bancos têm que pagar para guardar suas reservas nos bancos centrais.

    Essas políticas fizeram os rendimentos dos títulos despencar para níveis mínimos e deram impulso às bolsas. A expectativa é que as políticas também estimulem a demanda mundial.

    Mas há dúvidas sobre quanto mais estímulo as autoridades podem extrair dos mercados de ativos, o que transforma as moedas no principal canal de transmissão. Em uma era de crescimento global lento e inflação muito baixa, os bancos centrais podem tomar medidas agressivas de desvalorização de moedas, como imprimir dinheiro ou levar os juros para território negativo, sem ter que se preocupar com consequências inflacionárias.

    Comisso,asexportações setornam mais baratas em economias com políticas monetárias mais flexíveis e mais caras naquelas mais rígidas. Mesmo se as medidas recentes não tivessem sido direcionadas para as moedas, “o efeito de políticas orientadas domesticamente naturalmente teriam um impacto no câmbio”, diz Hung Tran, diretor administrativo do Instituto de Finanças Internacionais.

    Os EUA já estão vendo os efeitos negativos do dólar forte: no quarto trimestre, o comércio exterior cortou um ponto percentual do crescimento da economia do país.

    (Colaborou Tommy Stubbington.)

     

    Fonte: Valor Econômico

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