Efeito cascata nos tribunais

    Se a Câmara aprovar a PEC da Bengala em segundo turno, Dilma deixará de nomear 21 ministros em Cortes superiores, como STF, STJ e STM

    A aprovação da chamada PEC da Bengala – a proposta de emenda à Constituição que passa de 70 para 75 anos a idade da aposentadoria compulsória de magistrados – propiciará mudanças que vão além da impossibilidade de a presidente Dilma Rousseff nomear cinco novos ministros para o Supremo Tribunal Federal (STF) até o fim do mandato da petista, em 31 de dezembro de 2018. Se a emenda for aprovada em segundo turno pela Câmara dos Deputados, 21 ministros de Cortes superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU) terão as aposentadorias postergadas, segundo levantamento do Correio. Cabe ao presidente da República escolher os integrantes dos tribunais superiores. 

    A proposta divide opiniões. Enquanto alguns parlamentares defendem a medida, associações de classe contestam a alteração na lei. Para a Associação de Magistrados Brasileiros (AMB), por exemplo, a mudança na Constituição prejudicará a “oxigenação” das cortes. O presidente da entidade, João Ricardo Costa, também alega que a PEC está ligada, exclusivamente, a interesses particulares e à disputa política. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), defendeu ontem a medida, em discurso no plenário. “Ela (a PEC) é altruísta e não se reveste de casuísmo.” 

    Além de cinco magistrados do STF, 16 ministros teriam mais tempo no cargo (veja quadro). Aprovada em primeiro turno na Câmara na quarta-feira, a PEC da Bengala ainda precisará ser votada em segundo turno na Casa e ser promulgada em sessão do Congresso para entrar em vigor. A matéria já havia sido aprovada pelo Senado em dois turnos e ficou parada na Câmara por quase uma década. Caso a emenda constitucional seja aprovada, o Superior Tribunal Militar (STM) terá o maior número de beneficiados. Entre os 10 atuais componentes da Corte, seis estão prestes a completar 70 anos. 

    Parlamentares do governo acusam Calheiros e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de trazer de volta o projeto para afrontar o Palácio do Planalto. O governo é contrário ao texto porque vai tirar da presidente Dilma Rousseff o direito de indicar cinco novos ministros para oSTF até o fim do segundo mandato. Até 2018, cinco ministros terão completado 70 anos: Celso de Mello (completa a idade-limite em novembro de 2015), Marco Aurélio Mello (julho de 2016), Ricardo Lewandowski (maio de 2018), Teori Zavascki (agosto de 2018) e Rosa Weber (outubro de 2018). Antes de nomear os substitutos desses ministros, a presidente ainda precisa indicar quem ocupará a vaga de Joaquim Barbosa, que se aposentou no ano passado, antes de completar 70 anos. 

    O texto aprovado na Câmara permite que o limite para a aposentadoria compulsória seja ampliado também para outras categorias do serviço público, dependendo apenas da criação de uma lei complementar. 

    “Conspiração”

    Deputados que apoiavam o projeto negaram que o objetivo seja prejudicar o governo Dilma. “Não há aqui conspiração nenhuma. Não há aqui intenção de prejudicar quem quer que seja. Nos tribunais superiores, há um consenso da necessidade da extensão, até porque, nos dias atuais, uma pessoa entre os 70 e os 75 anos de idade está em plena capacidade produtiva”, disse o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ). Já o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que a mudança na aposentadoria pode congelar as decisões dos tribunais superiores por muito tempo, comprometendo a evolução da interpretação das leis. 

    Para o presidente da AMB, a disputa política entre Congresso e governo não pode afetar “a estabilidade da estrutura judiciária”. João Ricardo Costa argumenta que a aposentadoria aos 70 anos é ideal para que não exista “distanciamento” das decisões em primeiro grau no Judiciário. Ele também afirma que os parlamentares, que são julgados pelo STF, não devem esperar benefício dos magistrados diante da aprovação da PEC. “Essa tentativa de agradar aos tribunais chega a ser uma ofensa à Justiça,”, criticou. 

    As críticas do ministro da Justiça

    O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, criticou ontem a PEC da Bengala. “Nós não podemos jamais fazer uma mudança constitucional pensando casuisticamente. (.) É melhor para o sistema judiciário uma PEC que faz com que a aposentadoria seja aos 75 ou é melhor aos 70? Se a presidente vai nomear menos, se vai nomear mais, essa não deve ser uma discussão correta quando se fala de melhoria das instituições. 

    “Não há aqui conspiração nenhuma. Nos tribunais superiores, há um consenso da necessidade da extensão, até porque, nos dias atuais, uma pessoa entre os 70 e os 75 anos de idade está em plena capacidade produtiva”

    Leonardo Picciani, líder do PMDB na Câmara

     

    TRF-2 afasta juiz do caso Eike

    O Tribunal Regional Federal da 2ª Região afastou do cargo o juiz Flávio Roberto de Souza, flagrado dirigindo um Porsche que ele mesmo mandou apreender do empresário Eike Batista. O TRF-2 ainda decidiu abrir processo disciplinar contra o magistrado, que havia sido impedido de atuar nas ações contra o dono do Grupo X. O procedimento tramita em sigilo. Flávio Roberto de Souza também será investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pode ser aposentado compulsoriamente – pena máxima para magistrados em processos administrativos. 

    Aposentadoria postergada

    Confira os nomes dos ministros que deveriam deixar a função compulsoriamente ao completar 70 anos até 2018, de acordo com a atual legislação, e que podem se beneficiar com a aprovação da PEC

     

    Supremo Tribunal Federal (STF)

    Celso de Mello

    Marco Aurélio Mello

     

    Ricardo Lewandowski

    Teori Zavascki

    Rosa Weber

     

    Superior Tribunal de Justiça (STJ)

    Laurita Vaz

     

    Felix Fischer

    Napoleão Nunes

     

    Tribunal Superior do Trabalho (TST)

     

    Fernando Eizo Ono

    Emmanoel Pereira

    Renato de Lacerda Paiva

     

    Superior Tribunal Militar (STM)

    Fernando Sérgio Galvão

    Alvaro Luiz Pinto

    Marcus Vinicius Oliveira dos Santos

     

    Luis Carlos Gomes Mattos

    William de Oliveira Barros

    Cleonilson Nicácio Silva

     

    Tribunal de Contas da União (TCU)

     

    Ana Arraes

    José Jorge

    Raimundo Carreiro

    José Múcio Monteiro

     

    Fonte: Correio Braziliense

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