A Câmara dos Deputados aprovou ontem, por 324 votos a 137, o projeto de lei (PL) 4.330/04, que regulamenta a terceirização. O texto foi alterado na última hora pelo relator, deputado Arthur Maia (SD-BA), para excluir artigo que tinha sido negociado com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para que todas as empresas contratantes de serviços terceirizados pagassem as contribuições previdenciárias dos empregados das empresas contratadas.
Deputados reclamaram que toda a discussão do projeto foi conduzida pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sem que conhecessem o texto final que seria votado, apresentado apenas à noite e montado diretamente durante a leitura no plenário. A votação dos destaques para alterar a proposta ocorrerá na terça-feira e, quando concluída, o texto seguirá para o Senado Federal.
A principal mudança, anunciada já à noite e que levou a protestos do governo, foi a retirada do texto negociado pela Fazenda. Levy queria que todas as empresas contratantes separassem 11% do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviço para pagar as contribuições previdenciárias dos empregados das terceirizadas com o objetivo de evitar que a falta de caixa da empresa contratada levasse à inadimplência de encargos trabalhistas (prática comum nestas empresas) e, consequentemente, à queda na arrecadação do governo.
Maia tinha concordado com o texto inicialmente, mas as empresas em que o custo da mão de obra representa parcela menor do contrato reclamaram que pagariam valores muito acima do necessário. O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, tentou convencer os deputados de que a mudança não visava aumentar a arrecadação. “As referidas retenções não representam aumento da carga tributária nem para o contratante nem para o contratado”, afirmou o secretário em nota técnica a que o Valor teve acesso.
O relator, então, sugeriu à Fazenda um prazo para devolução dos valores pagos a mais, mas a equipe econômica, diz Maia, vetou. “O contribuinte ficaria indefinidamente à espera da restituição deste tributo enquanto o governo faria caixa. Não tenho dúvida que isso poderia quebrar muitas empresas”, acusou o relator.
O relatório manteve a retenção de 11% do valor do contrato para quitar as contribuições previdenciárias para apenas as atividades em que o custo da mão de obra é maior: de limpeza, conservação e zeladoria; vigilância e segurança; e empreitada de mão de obra. O pedido de antecipação pela contratante só foi atendido para quitar outros tributos da contratada, em valores equivalentes a 1,5% do contrato para o Imposto de Renda, 1% para CSLL, 0,65% para PIS/Pasep e 3% para Cofins.
O relator também cedeu em um artigo sugerido pela Fazenda para evitar a demissão de funcionários por uma empresa para que fossem recontratados como pessoas jurídicas (PJs), com menos direitos trabalhistas, prática conhecida como “pejotização”, e acrescentou que uma empresa não pode contratar uma terceirizada que tivesse entre os sócios alguém que prestou serviços à contratante, com ou sem vínculo empregatício, nos últimos 24 meses.
O projeto, de interesse dos financiadores de campanhas, teve apoio de quase todo os partidos. Apenas PT, PCdoB e PSOL se manifestaram contra o projeto, que permite a terceirização de todos os setores de uma empresa. Para eles, haverá precarização e perda de direitos trabalhistas com a terceirização da atividade-fim, ou seja, aquela para a qual a empresa foi criada (o metalúrgico de uma montadora, por exemplo).
O entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), contestado por entidades empresariais no Supremo Tribunal Federal (STF), é de que só é permitido terceirizar as atividades-meio, como serviços de limpeza e segurança. O projeto não faz distinção e permite a terceirizar todos os setores.
Com exceção da Fazenda, os ministros não participaram das discussões e só se manifestaram após a derrota. “O projeto é ruim, pois permite que toda relação de trabalho seja terceirizada, portanto, precarizada. Reduz os salários e os fundos de seguridade social. Não é bom para os trabalhadores. Não é bom para o país”, disse, em nota, Miguel Rossetto (Secretaria-Geral).
A votação só ocorreu por uma manobra do PMDB para evitar que a pauta fosse trancada pela Medida Provisória (MP) 661/2014, aprovada na terça-feira na comissão mista e que, pelo entendimento até aquele dia, passaria a impedir a votação de qualquer projeto de lei no plenário da Câmara porque já estava com o prazo vencido.
Anteontem, porém, o presidente da Câmara acatou questão de ordem do líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), para que as MPs só tranquem a pauta depois de lidas em sessão – o que Eduardo Cunha só fez após a votação do PL 4.330/04. O deputado Alessandro Molon (PT-RJ) entrou com mandado de segurança no STF para anular a votação.
Fonte: Valor Econômico