Deputados contrários à medida questionam no Supremo a “pedalada regimental” de Eduardo Cunha para aprovar o tema
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes é o relator do mandado de segurança que visa derrubar a aprovação, pela Câmara dos Deputados, da redução da maioridade penal. O magistrado já se manifestou contra a medida, defendendo tratamento mais rigoroso a menores infratores com base em reforma do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O ministro Marco Aurélio Mello também fez críticas ao procedimento adotado na aprovação da proposta. O mandado foi protocolado ontem no STF por um grupo de 102 deputados de 14 partidos. Os parlamentares acusam o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de “atropelo” na condução do processo.
Na madrugada de 2 de julho, menos de 24 horas depois de a Casa ter rejeitado projeto que alterava de 18 para 16 anos a maioridade para crimes hediondos e graves, Cunha colocou em pauta uma proposta mais branda. Com 323 votos a favor, os deputados aprovaram texto determinando que jovens de 16 e 17 anos sejam punidos como adultos quando praticarem crimes hediondos, como homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. A manobra foi apelidada de “pedalada regimental” por parlamentares contrários ao projeto.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), por exemplo, disse que a atitude de Cunha é algo sem precedentes. “Manobras regimentais, sempre houve. Mas perder uma votação e articular para obter resultado oposto é algo novo”, disse.
Parlamentares pedem ao STF para, liminarmente, suspender a votação e, posteriormente, anular a sessão que aprovou a redução da maioridade. A argumentação se fundamenta em duas hipóteses. A primeira é de que a Mesa da Câmara colocou em votação emenda que reproduz matéria que já havia sido rejeitada no dia anterior. Pela Constituição, o teor de uma emenda constitucional já rejeitada não pode ser reapreciada no mesmo ano. A segunda possibilidade apontada pelo grupo é de que a emenda votada era matéria nova, conforme alegado pela presidência da Casa. Nesse caso, a hipótese é de que não foi obedecida a exigência de apoio de um terço dos deputados.
Mesmo sem referência direta a Cunha, o documento entregue ao STF fala em um “rolo compressor ilimitado” que se instalou na Câmara e da “pressa súbita e avassaladora” em aprovar a matéria, que está em tramitação há 22 anos na Casa. “Os vencedores de ocasião podem se sentir poderosos e invencíveis, imbuídos da crença de que os fins justificam todos os meios e de que estão apenas fazendo a vontade popular, imune a qualquer requisito do devido processo legislativo”, diz a peça apresentada ao Supremo.
“É inadmissível que, depois de 25 anos de redemocratização, ainda se submeta a práticas antidemocráticas, como está ocorrendo, reiteradamente, nesta Casa”, lamentou a deputada Luiza Erundina (PSB-SP). Já o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI) disse que a ação do STFcolocará fim ao que chamou de “disparate”. “Os obscurantistas não passarão”, completou o líder do PSol, Chico Alencar (RJ).
“É inadmissível que, depois de 25 anos de redemocratização, ainda se submeta a práticas antidemocráticas, como está ocorrendo, reiteradamente, nesta Casa”
Luiza Erundina (PSB-SP), deputada
Fonte: Correio Braziliense