Fórum que representa 90% da categoria prepara reação a adiamento de reajuste salarial e corte de abono
– A avaliação do fórum é que o governo está esvaziando o quadro de servidores, levando à precarização dos serviços públicos e penalizando aqueles que mais precisam. É uma coisa que não dá para aceitar. O déficit é originário deste governo que está aí, por que temos que pagar a conta? Por isso, é possível que se aponte para uma grande greve geral dos servidores – disse Rudinei Marques, um dos integrantes da organização.
Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS),
Sandro Alex Cezar disse ver com “muito maus olhos” o congelamento do reajuste salarial para os servidores e chamou as medidas de “velho receituário”:
– O governo fez a opção errada de política econômica e não estamos dispostos a pagar a conta. Essas medidas eram um velho receituário que a gente pensava que estivesse esquecido. Não foi com apoio a essas medidas que a presidenta Dilma foi eleita. Para adotar essas medidas, melhor que tivesse sido eleito o candidato da oposição. A medida não ajuda o governo federal e ainda agrava a relação com os trabalhadores – afirmou o servidor, cuja categoria está em greve desde julho.
Após mais de três meses de negociação com sindicatos e de ter fechado proposta formal de aumento para a categoria, com reajuste de 5,5% a partir de janeiro, o governo recuou e adiou a correção salarial para agosto de 2016. Anunciada ontem no pacote de ajuste fiscal, a medida reduzirá R$ 7 bilhões em gastos. No ano inteiro, o impacto, segundo o Ministério do Planejamento, seria de R$ 13 bilhões. O acordo previa ainda mais 5% a partir de janeiro de 2017.
O governo anunciou ainda a suspensão dos concursos públicos para economizar mais R$ 1,5 bilhão. Também foi anunciado o fim do pagamento do chamado abono de permanência do serviço público – que corresponde a 11% do salário, pago aos servidores que completam as condições para se aposentar. Segundo o Planejamento, há 101 mil servidores com direito ao abono e 123 mil que teriam direito a essa condição nos próximos anos.
O congelamento do reajuste também irritou servidores do Judiciário. Para Cledo Vieira, coordenador geral da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal (Fenajufe) e Ministério Público da União, a categoria – cujo reajuste foi aprovado pelo Congresso e vetado pela presidente Dilma Rousseff- enfrenta um desafio “mais político que econômico”:
– É um massacre a que os servidores estão sendo impostos, e a categoria vai para cima. Nosso instrumento é a greve.
CRÍTICA A CORTE NO MINHA CASA
As medidas também agravaram o distanciamento entre o governo e os movimentos sociais. O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) prepara atos contra os cortes no Minha Casa Minha Vida. O Movimento dos Sem Terra (MST) também está descontente. Na avaliação desses movimentos, o governo repassou a conta aos mais pobres. O governo cortará R$ 4,8 bilhões previstos para o programa. Em contrapartida, pretende passar a conta para o FGTS. Assim, poderá financiar famílias com renda acima de R$ 6 mil.
– O que nos deixa indignados é o corte no Minha Casa Minha Vida. É inaceitável e lamentável. Significa disposição do governo de, mais uma vez, jogar a conta da crise fiscal nos mais pobres. Tentar aliviar a crise fiscal aprofundando a crise social – afirmou Guilherme Boulos, da coordenação nacional do MTST.
Boulos disse que o movimento planeja mobilizações nas principais capitais. Semana passada, o MTST já fizera ameaças. Em nota, disse que “não aceitamos pagar a conta da crise. Se o ajuste fiscal continuar, o país vai parar” O MST também se opôs aos últimos anúncios do governo.
– Há um descontentamento completo. Cada medida que o governo toma, vai perdendo apoio de uma base de sustentação que tinha. Isso é mais preocupante. Não vamos aceitar passivamente que as medidas afetem os mais pobres. Vai haver luta se isso acontecer – afirmou Joaquim Pinheiro, da coordenação nacional do MST. •
SERVIDORES CONTRA FH E CRÍTICAS DO PT
Mexer com servidor público sempre foi um jeito rápido de criar polêmica. Nogoverno Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, houve várias. Em 1996, o governo federal ameaçou congelar os salários dos servidores, caso a estabilidade de emprego fosse mantida na então reforma administrativa que se estudava. Em 1998, um plano de ajuste fiscal previa, entre outras medidas, restrições à reposição de servidores que se aposentassem; suspensão de concursos públicos; e aumento da contribuição para a Previdência dos servidores ativos, além de cobrança de contribuição previdenciária também para inativos, até então isentos de contribuição.
Não demorou para aparecerem as críticas, e não apenas da então oposição petista: na primeira entrevista como governador eleito de Minas Gerais, o ©(-presidente Itamar Franco (PMDB), por exemplo, afirmou que faria oposição à política econômica de Fernando Henrique, seu antigo ministro. Líderes
governistas na Câmara também avisaram que o Congresso era contrário à cobrança de contribuição de servidores inativos.
Mas a reação maior vi ria em 2000, quando uma marcha reuniu ma is de dez mil servidores federa is em greve na Esplanada dos Ministérios, em maio daquele ano. 0 ato, que chegou a receber o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), incluiu uma caravana com dez ônibus que saiu da Cinelândia, no Rio de Janeiro, para protestarem Brasília. No Rio, um grupo de servidores abraçou o Cristo Redentor. Entre as classes que aderiram à paralisação estavam o funcionalismo do INSS e da Saúde.
No fim de 2001 -após seis anos sem conceder aumento aos servidores, e depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar o reajuste salarial, em abril daquele ano, ao julgar ação direta de inconstitucional idade (Adin) proposta pelo PT e pelo PDT -, FH daria um reajuste linear de 3,5%. Ainda naquele ano, porém, ogoverno precisaria enfrentar uma greve das universidades federais. Iniciada em agosto, durou mais de 80 dias.
Fonte: O Globo – RJ