Edição 166 – 20/10/2015
Ser ou não ser, eis a questão, ministro
“Se ele continua é porque nós concordamos com essa política”.
(Presidente Dilma Rousseff, em resposta à permanência ou não do ministro da Fazenda, durante entrevista na Suécia, 18/10/2015)
A Presidente da República esteve no final de semana longe do país, na Suécia, que detém um dos menores níveis de desigualdade social no planeta, atrás da Islândia, para onde seguiria a comitiva brasileira.
Quem acompanhou a entrevista concedida por Dilma Rousseff em Estocolmo ficou surpreso com as afirmativas sobre os temas que permearam a última semana, e também com o tratamento dispensado ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha: “Lamento que seja um brasileiro.”
Na queda de braço entre o Executivo e o Legislativo, onde tudo parece valer como instrumento de troca, o público parece não existir. O país, seus trabalhadores, usuários e servidores, estudantes e professores, todos à deriva. O ano vai findando com a mesma agenda do primeiro trimestre.
As categorias em negociação não recebem resposta aos seus pleitos, como ocorre com os servidores das universidades federais, do INSS e do Banco Central; trabalhadores acidentados, doentes, licenciados, submetem-se ao calvário de não verem seus benefícios nas contas; estudantes contam os dias para reporem aulas de um período inteiro; carreiras de estado, como a nossa, são deixadas ao léu.
Enquanto o país conhece mais contas estratosféricas na Suíça, nos Estados Unidos e sabe-se lá onde mais, nossa corte presidencial desfila na Europa amparada em gastos maiores que os da monarquia mais famosa do mundo. Reportagem de O Globo deste domingo, 18, revela que no ano passado, somente a Presidência da República utilizou-se de R$ 9,3 bilhões, considerando organismos, fundos e secretarias – 210% a mais que em 2005. Em consumo pessoal, os gastos de 2014 totalizaram R$ 390 milhões. No mesmo período, a pomposa família real britânica consumiu de seus súditos cerca de R$ 196, 3 milhões.
Números dignos de ajuste, que só recai sobre quem trabalha.
Quanto ao anunciado corte de 3 mil funções comissionadas, nada. De concreto, nossa única seção amazônica do Banco Central, em Belém, padece com 60 servidores para atender sete estados, dentre eles os dois maiores do território, Amazonas e Pará, destacando que o segundo abriga uma das maiores províncias minerais do mundo e exporta pelo Porto de Itaqui, no vizinho e paupérrimo Maranhão, quase toda produção da maior empresa do ramo, a Vale.
Riqueza não socializada à população, pois são commodities, ora em baixa com a queda da compra pelo gigante asiático. A poderosa China, embora mal das pernas, cresce a mais de 6% ao ano e deve liderar as ofertas dos leilões de nada menos que 29 hidrelétricas nacionais nos próximos dias.
Na esfera social, sete programas sofrerão cortes de quase R$ 4 bilhões e um milhão de empregos formais foram-se embora nos últimos 12 meses. São 115 demissões a cada hora; 2.777 por dia; 83.333 por mês (dados de setembro).
Nesse quadro, o que se esperar dos salários? 111 categorias fecharam proposta de redução salarial, com reajustes abaixo da inflação. Dentre elas, os servidores públicos federais que já assinaram acordo com o governo.
Enquanto isso, a história abaixo, registrada na coluna de Jorge Bastos Moreno, também em O Globo, aconteceu com o ministro dos Transportes (!), obrigado a utilizar-se de avião comercial, uma das medidas de contenção de gastos, segundo o Palácio do Planalto:
“Depois que perderam as mordomias dos jatinhos da FAB e passaram a embarcar em voos normais das companhias aéreas, como parte do ajuste fiscal, os ministros de Estado começaram a sentir na pele a impopularidade do governo junto aos passageiros comuns.
Esta semana, por exemplo, o ministro dos Transportes, Antônio Carlos Rodrigues, só conseguiu evitar um incidente graças a uma admirável presença de espírito. Sentado numa das primeiras fileiras do voo, Rodrigues era cumprimentado pelos parlamentares que embarcavam pelo aceno “olá, ministro!”. Uma passageira, vendo a cena, não se conteve e se dirigiu ao ministro, já de dedo em riste:
— Não me diga que o senhor é ministro desse governo?!
E Antônio Carlos Rodrigues, a essa altura, abaixa o jornal que fingia ler, para na verdade tentar cobrir o rosto, e responde com a maior tranquilidade:
— Não! É apelido!”
E ao colega Tombini, como se qualifica quanto ao epíteto?