Edição 64 – 4/5/2016

Palavra do Filiado


A coerência do Sinal ainda resta ser demonstrada. Em 2002, no governo de Luís Inácio, o Sinal teria manifestado a sua “apreensão” (Apito Brasil nº 126/02) com a nomeação de um ex-banqueiro. Em 2016, num governo Temer, que ainda nem sequer se concretizou, o Sinal manifesta seu receio de “uma possível entrega do BC ao mercado financeiro”, sem que haja sequer nomes confirmados.

Mas há uma questão tão importante quanto essa que não está sendo abordada: a do empoderamento da base do corpo funcional. Não é só o nome do presidente do BC o que conta, pois uma pessoa sempre poderá estar sujeita a pressões. A prova disso é que a nomeação em 2002 do ex-banqueiro foi, em boa medida, bem sucedida, enquanto que a nomeação de um funcionário de carreira, contra a qual nenhum de nós se insurgiria, deixou a desejar, conforme demonstram os resultados.

Hoje discute-se a autonomia do Banco Central, mas que autonomia? Autonomia com a atual estrutura de poder? Não, obrigado. São cinco níveis hierárquicos, cuidadosamente concebidos para atenuar todo e qualquer empenho da base por aplicação rigorosa das leis e das normas. Cinco níveis destinados a filtrar a verdade de modo a se pintarem as práticas bancárias com o tom de cinza que convém ao governo de plantão ou aos interesses do mercado, conforme o caso. Cinco níveis hierárquicos a converterem corações e mentes e a moldarem “convenientemente” o caráter do agente público até que ele esteja “qualificado” a ocupar posições “estratégicas”. Assim, não deveria ser surpresa nenhuma a ninguém que, por exemplo, a inflação, esteja como está.

Outros órgãos públicos tão incensados pela imprensa e pela opinião pública são exatamente aqueles que seus agentes gozam de alguma garantia de atuação, de que suas manifestações e despachos não decorrem de pressões ou seus autores não são submetidos a constrangimentos internos, ou, pior, não são substituídos por outros mais “convenientes”.

Assim, sem o empoderamento da base, por meio da liberdade do agente para atuar de acordo com a sua consciência e de garantias aos primeiros níveis hierárquicos, eventual autonomia do BC poderá se tornar um tiro no pé.

Paulo de Toledo, de São Paulo

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