Estudo do Tesouro mostra que 8 entes já gastam 60% ou mais da receita líquida com a folha
Eduardo Campos
O Tesouro Nacional tornou mais clara a situação fiscal dos Estados com a divulgação do Boletim de Finanças Públicas dos Entes Subnacionais. E o que se vê é um sistemático aumento das despesas dos Estados, notadamente com pessoal, que subiram, na média, 38% entre 2009 e 2015 em termos reais, superando muito o aumento das receitas. Junto disso há uma queda do volume de investimento que volta a patamares não vistos pelo menos desde 2012.
O Tesouro mostra que a situação é ainda mais crítica do que a imaginada, uma vez que seis Estados já gastam mais de 60% da Receita Corrente Líquida (RCL) com pessoal, o que é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). São eles Rio Grande Sul (75%), Mato Grosso do Sul (cerca de 73%), Minas Gerais (cerca de 68%), Paraíba (quase 65%), Goiás (quase 65%) e Rio de Janeiro (cerca de 63%). Mato Grosso e Roraima estão no limite de 60%.
Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira de Medeiros, a medição foi feita com base na metodologia de cálculo considerada a mais adequada pelo Tesouro. Atualmente, gastos com fundos de previdência dos Estados, por exemplo, saem da contabilidade que os Estados apresentam com gasto com pessoal, o que é visto por alguns especialistas como uma “maquiagem” dos dados ou uma nova modalidade de “pedalada”. O Tesouro tenta uma padronização dos dados e tal proposta consta do projeto de lei que trata da renegociação da dívida dos Estados que está em tramitação.
Por essa metodologia, que deve se tornar padrão, a média de gastos com pessoal em proporção da RCL está em 57,3%. Pela LRF atingido 95% do limite ou 57% da RCL de gasto com pessoal o Estado já tem de começar a adotar medida para ajuste de contas, ultrapasso o limite o Estado tem que fazer um ajuste das contas ou perde aval para novas dívidas e transferências voluntárias.
Os dados sobre o gasto com pessoal chamam atenção. Entre 2009 e 2015, em termos reais, o gasto do Rio de Janeiro com funcionários da ativa e aposentados saltou 70%, sendo mais de 40% do aumento com inativos. Santa Catarina teve alta de 65% e São Paulo pouco menos de 20%.
O gasto médio per capita com pessoal é de R$ 1.628, mas a variância é enorme. Em Roraima e no Distrito Federal o gasto passa de R$ 3 mil, enquanto que no Maranhão está próximo dos R$ 900.
Centrando foco no período entre 2012 a 2015, as receitas totais subiram 27,8%, enquanto as despesas saltaram 38%. O aumento da receita é de arrecadação própria, enquanto as despesas são concentradas com pes- soal (36%). Já o investimento cai 5,4% no período, mas merece destaque um tombo de 36% entre 2014 e 2015. Entre 2012 e 2013 foi visto um salto de 38%, que pode estar relacionado a uma excepcional ampliação no limite de operações de crédito, que em 2012 atingiu R$ 65,049 bilhões. Naquele ano, o então ministro da Fazenda Guido Mantegaacreditou nos Estados como motor do investimento e colocou também o BNDES para dar dinheiro por meio do Proinveste. Os dados também mostram a marca de Joaquim Levy na Fazenda: já em 2015 as novas liberações de limite foram de modestos R$ 298 milhões.
O relatório será divulgado anualmente e uma nova versão, a ser divulgada em agosto, também trará dados sobre os municípios.
Já a Secretaria de Política Econômica divulgou a Análise dos Gastos Público Federal, relatório que passará a ser publicando anualmente. O documento ilustra a narrativa do governo sobre o aumento do gasto social, mas deixa ainda mais evidente a necessidade de lidar com a despesa previdenciária e com a necessidade de um Orçamento menos rígido.
No período compreendido entre 2006 e 2015, a transferência de renda para as famílias subiu de 8,3% do PIB para 9,4%, e o aumento foi liderado pelos benefícios previdenciários, que saíram de 6,9% para 7,4% do PIB. OBolsa Família, que gera debates políticos e eleitorais, sai de 0,3% para 0,4% do PIB. Abono e seguro-desemprego sobem de 0,6% para 0,8% do PIB e gastos assistenciais, como Loas, de 0,5% para 0,7% do produto.
De acordo com secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Manoel Pires, as transferências de renda cresceram trazendo o benefício de combate à pobreza e redução da desigualdade, mas com a questão demográfica a Previdência ganha importância.
O secretário apontou que os dados também reforçam a necessidade de migrar o ajuste fiscal para a reforma fiscal, pois não há espaço para cortes em um Orçamento com apenas 2% de despesas contingenciáveis.
Quem paga a conta, no quadro atual é o investimento, que caiu a 1% do PIB em 2015, menor patamar desde 2009. Em 2014, o investimento foi o maior da série, de 1,4% do PIB, considerando também os gastos do Minha Casa, Minha Vida.
Fonte: Valor Econômico