BERÇO DO RÁDIO E DA MPB

    Em Agosto eu completei os meus 71 anos de vida. Neste mês de Setembro quem também chega aos “setentum” é a nossa querida e pioneira Rádio Nacional. Indubitavelmente o berço do rádio e de nossa MPB. Não se pode falar da história do rádio brasileiro sem considerar que a Nacional foi o nascedouro, ditou moda e costumes da época, “deu à luz” os maiores e melhores valores, cantores e cantoras da nossa música popular. Era uma verdadeira e autêntica Academia do Talento Musical Brasileiro, se posso dizer assim. A Nacional teve também em seu valioso cast os melhores atores e atrizes das novelas radiofônicas da época. Ainda não se avaliava audiência pelo que depois se habituou a popularizar como ibope, e nem precisava, com certeza. Emissoras que hoje apregoam sua liderança no ranking não resistiriam à popularidade e nem ao nível de programação da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. E os programas de auditório? Não havia quem não os conhecesse e aplaudisse pelo Brasil afora. E que comandantes: Paulo Gracindo, Almirante, César de Alencar, entre outros. O auditório da Nacional, durante o programa de César de Alencar, parece que encolhia, pois quase não comportava tanta gente. Minha saudosa esposa, falecida em 2003, foi e nunca negou ser uma fã das mais vibrantes da grande estrela Emilinha Borba. Pertenceu, como tantas jovens naqueles tempos, ao fã Clube de Emilinha. Colecionava fotos, inclusive junto com a cantora, e mostrava a todos com muito orgulho. Ela me contava a aventura que era enfrentar a  fila dos elevadores que levavam ao andar do auditório mais famoso do Brasil. No que concerne à comicidade, também a Nacional não só tinha os melhores humoristas como os programas que não encontravam concorrência à altura. Citarei apenas três dos melhores programas de humor que, aliás, foram vários. A “PRK-30” tinha uma característica que a diferenciava dos outros programas de humor: era apresentada apenas por Lauro Borges e Castro Barbosa. Dois gigantes no gênero. Não dá para passar uma idéia do que eles faziam naquele programa, só lhes digo que se multiplicavam em personagens diversos e muito divertidos. E prendiam nossa atenção o tempo todo. Um detalhe importante: não se valiam de apelações, tão comuns hoje em dia, como se sem palavrões e uma certa forma agressiva de falar, de gritar e fazer caretas não houvesse humor. Uma lástima o humor atual da televisão, onde existem raríssimas exceções em se tratando de qualidade. Uma coisa é certa e eu afirmo sem receio de errar, a maioria dos pretensos “humoristas” lançados pela TV, especialmente pela Globo, mas não só por ela, com todo o respeito, nunca seriam aprovados num eventual vestibular para o cast da nossa Rádio Nacional no auge do seu sucesso. Eles se esforçam, todavia sem talento, sem conhecimentos básicos da técnica de fazer humor, e sem criatividade, apenas irritam. Outro programa que quero relembrar rapidamente é o “Balança mas não cai”. Este marcou uma época com o melhor do humor nacional, indubitavelmente. Havia humoristas que eram autênticos mitos do melhor do rádio brasileiro de todos os tempos. Paulo Gracindo, por exemplo, era um homem de rádio e de facetas tantas, todas com a marca do sucesso, que ainda veio escrever, com seu imenso talento, uma bela trajetória em plena época da TV. Esta porém, embora tenha tentado, não conseguiu reeditar o “Balança mas não cai” em edição televisiva. Não emplacou. E acrescento na minha relação o “Hotel da Sucessão”. Nunca mais tivemos programa na mesma linha. Era como se os maiores nomes que atuavam na política brasileira vivessem hospedados naquele hotel. Lá estavam Ademar de Barros, Jânio Quadros, Carlos Lacerda, Tenório Cavalcanti, Juscelino, entre muitos outros. Eles não só conversavam entre si como atiravam farpas uns contra os outros, cada um no seu estilo muito personalístico de ser, de falar, de fazer política enfim. O povo também se fazia representar no programa de várias formas. Quando eu trabalhava na Rádio Marajoara, emissora dos associados em Belém de Pará, nos anos 50, nós recebíamos o “Hotel da Sucessão” gravado naqueles discos chamados de “long play” com 78 rotações por minuto. Ele era então reproduzido em certo horário. Em muitas outras cidades acontecia o mesmo. Foi um dos marcos do humor da Nacional até hoje sem concorrente. E não se ouvia, nas muitas críticas a qualquer um daqueles políticos, agressões grosseiras ou palavreado chulo como é tão comum hoje em dia. O humor de nosso tempo perdeu muito em qualidade.  Não se trata de evolução ou um humor mais, digamos, modernista, não, eu julgo que hoje falta mesmo é talento para fazer rir sem apelações vulgares e um linguajar que infelizmente acaba sendo adotado por boa parte de nossa população. Salvam-se alguns dos poucos que vêm da antiga escola, mas que estão sendo subutilizados. Lamentável. Bem, apenas pretendi fazer, nesta minha coluna, uma modesta homenagem à Rádio Nacional que ainda aí está a divulgar boa música, informação, divertimento e cultura.   Recolho-me agora à minha insignificância e deixo para pessoas mais competentes, que viveram e ainda vivem a história da Nacional, como os radialistas Gerdal dos Santos e Osmar Frazão, por exemplo, mais detalhes desta trajetória que orgulha a todos nós que sempre amamos o rádio e que tivemos naquela emissora o modelo mais dignificante e eficiente a seguir, como radialista que também fomos. Eles poderão ser ouvidos todos os domingos pela manhã desde cedo. Vale a pena, amigos e amigas. Um apresenta o “Rádio Memória” e o outro  “Histórias da MPB”.  Parabéns a todos que atuam, em todos os setores da Rádio Nacional, pelos seus 71 anos de existência.

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