ENTRE A RAZÃO E A EMOÇÃO

    É isso, meus amigos, chega um momento na vida de todos nós em que temos que tomar alguma decisão séria, muito séria mesmo. Aquela que pode mudar completamente o nosso viver. Geralmente temos que sopesar valores ou argumentos entre a razão e a emoção para então nos alimentarmos daquela coragem necessária a uma tomada de posição. E como é difícil este exercício, não é verdade? Algumas vezes o é mesmo. Se o momento ocorre ainda em nossa juventude costumamos ser mais inclinados a ouvir a emoção através do nosso coração. É perfeitamente normal isso. Eu me confesso “culpado” porque quando ainda jovem acabei abraçando a solução que o coração propôs e depois… bom, e depois não havia mais como recuar. Pouco foi o tempo decorrido para que o coração reconhecesse seu erro e se voltasse para a razão que, além de me puxar as orelhas, me castigou e muito com lições de vida bem duras. Lições que me lançaram numa solidão e num desamparo muito triste e cruel. Felizmente reconheci que somente eu poderia encontrar meu novo caminho. Em vez de ficar a me queixar procurei aprender com elas. Recomeçar sozinho, remar contra uma corrente que eu nunca enfrentara antes. No começo não via aquela luz no fim do túnel. A vida parecia me rejeitar. Um dia descobri que estava enganado. Veio a emoção, me abraçou e me ajudou a escrever: “Era a vida que te encontrara / e te apresentava a mim.” Mais uma vez mergulhei fundo no amor mesmo tentando fechar meus sentimentos à emoção. Mas como amar e sentir paixão fingindo que não ouvia o coração? Aparentemente uma incoerência total, não é verdade? Lembrei então o que escreveu o grande Fernando Pessoa: “"Eu simplesmente sinto / Com a imaginação. / Não uso o coração." — Só que não me parecia ter eu alma de poeta. Por outro lado era mais do que evidente que estava apaixonado. Eu queria, eu precisava ser feliz. Precisava também aprender a fazer alguém igualmente feliz. O passado me negara estas chances. Então segui em frente.   Em plena felicidade jamais alguém imagina que tudo um dia tem um fim. O amor celebra a vida, não tem ouvidos nem atenção para algo como a morte, todavia esta é a única certeza da vida. Até parece uma grande incoerência, mas não é.   Pois eu tive que a conhecer bem de perto, a ver bem de frente, tê-la nos meus braços. Perdi para ela o que eu tinha de mais importante. Na verdade todos perdem para a morte, sempre.  Quem fica tem que conviver com a dor da perda, com um retorno à solidão, ao silêncio de uma paz calada que grita mais do que qualquer revolta. A razão e a emoção sucumbem esmagadas pela saudade.  Lembro aqui alguns versos do meu poema “A Manhã Seguinte” escrito no ano de 2000:  “Por isso hoje  Havia apenas sombra na alma do mundo  E uma ânsia de passado no tempo que seguia.  Por isso hoje  Na nossa solidão cresceram espinhos  E as rosas foram todas para o céu.  Por isso hoje  Um suspiro soluçava numa lágrima  E o amor dividia o coração com a saudade.” Mas, como se costuma dizer, o tempo é o melhor remédio, ele sempre cura tudo. O tempo, e como ele custa a passar nesta situação. Parece que se arrasta, talvez nos oferecendo a oportunidade de que precisamos para sarar as feridas da alma, para fazer reflexões, para nos soerguermos e entendermos que se a vida ficou conosco ela deve ser vivida. Quando a lucidez e o equilíbrio emocional retornaram, voltei-me especialmente para a solidariedade. Dei-me conta de que a vida, para mim, já representava sete décadas e que “o horizonte está ficando cada dia mais próximo”, como digo em outra poesia. Vi então que ainda tenho amigos que nunca me abandonaram, algumas pessoas boas que tanto me ajudaram quando mais necessitei. Revi tudo, procurei recompor meus sentimentos, afastei-me da dor que me sugava, aceitei novamente a chance de viver e ajudar outros a fazer o mesmo com mais dignidade já que a vida não lhes sorrira por todo o tempo que estavam sobrevivendo. Muito pelo contrário. Essas dificuldades eu jamais as conhecera pois, apesar dos pesares, comigo a vida sempre fora ditosa, afortunada mesmo. Tive a incompreensão de poucos que não eram capazes de entender que, estando ainda vivo, tinha eu o direito inalienável de buscar novamente a felicidade, até na felicidade de outros que eu, com amor e lealdade, estava agora ajudando a construir, tijolo por tijolo. Senti-me como que renascendo num coletivo de paz, de amor, de fraternidade, de harmonia. As circunstâncias acabaram me colocando novamente entre a razão e a emoção. Embora a essa altura da vida eu devesse dedicar quase toda minha atenção ao que me aconselha a razão, não me sinto tão velho que não perceba ainda, com certa intensidade, os clamores do meu coração a me sugerir abraçar uma terceira chance de ser feliz, sem medos bobos, sem preconceitos idiotas, sem achar que meu tempo de amar já caducou.  Nunca acreditei que “a vida começa aos quarenta” como diz um ditado que tantos gostam de repetir doutoralmente. Também jamais levei em conta que a idade sirva de parâmetro para se poder ou não fazer isto ou aquilo, e não me agrada a tal classificação de “terceira idade” que acho preconceituosa, mesmo porque até hoje ninguém “inventou” a primeira ou a segunda. Então me poupem, por favor. E para encerrar vou lembrar aqui um verso que escrevi no meu poema “Passando o Tempo”.  Diz ele: “O tempo mede a vida com a régua do destino”. Pois é, e destino, para quem acredita nele, cada um tem o seu. A minha vida, com certeza, desmente alguns daqueles ditados bobos.  Desta vez aceitei os conselhos tanto da razão quanto da emoção e vou seguir vivendo até quando quem dirige o nosso destino me cobrar a fatura. Só tomo a liberdade, amigo e amiga, de lhe pedir que me deseje felicidade. Obrigado.  

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