No reino da fantasia

    Logo após o texto sobre a minha paixão pelos antigos faroestes, recebi uma mensagem em que, o destinatário entre outros assuntos, revelou-se, também, um apaixonado colecionador de “filmes de mocinho”, com direito a mais de 1.000 fitas no acervo particular, devidamente analisadas, com sinopses e fichas técnicas. Contudo, apesar da idolatria, o missivista, como diria meu pai, ex-funcionário dos Correios e Telégraphos, não assumiu o papel dos seus heróis. Não possui roupas de John Wayne, chapéu de Tom Mix ou cinturão de Wyatt Earp. Além dos filmes, coleciona grandes recordações.Ao contrário dele, não sou um colecionador, mas moro no reino da fantasia: na pele do xerife, persigo, montado num cavalo, um bando de ladrões. Sem errar nenhum tiro, vou ferindo e derrubando todos eles. Depois de algemá-los e trancá-los no xadrez, vou namorar a morena de olhos azuis que, saudosa, me recebe com os mais doces beijos. Uma de minhas frustrações é não ter exercido a autoridade de xerife nos antigos carnavais friburguenses, como fizeram várias outras “figuras”. Vestidos a caráter, estrela no peito, bota, chapéu e dois revólveres na cintura, desfilavam suas fantasias pelas ruas do centro da cidade, “impondo” a ordem apenas com olhar de desaprovação.Existem sósias de famosos que aliam a fantasia à semelhança física para ganharem a vida. Sei de alguns Robertos Carlos, Chacrinhas e Pelés. Mas, não é deles que estou falando. A maioria das meninas da geração das minhas filhas imaginou ser a Xuxa: adoravam usar botas de cano longo, blusa, mini-saia, “chuca” e franja na testa. O paradoxal é que as meninas cresceram, amadureceram e foram à luta. E a Xuxa ainda pensa, fala e age como uma menina. Quem vive a eterna fantasia dela, é ela.   Ainda estão em plena atividade antigos Elvis Presley’s. Não perdem as festas com temas dos anos 60. Apresentam-se de graça e fantasiados como o roqueiro norte-americano. Alguns arriscam até a “cometerem”, em inglês ininteligível, algumas músicas do ídolo imortal. Outros apelam para o playback. Mas, o que é comum a todos é imitar o estilo de cantar do Elvis: pernas bem abertas e uma delas balançando de forma frenética. E se já havia muita gente fantasiando o Michael Jackson quando ele era vivo, imagina agora que morreu.  O que considero estranho é nunca ter ouvido falar de nenhuma Madonna.Além dos que fantasiam ser alguma personalidade, há os que cismam que exercem determinadas profissões. No BC há um coleguinha aposentado que se considera “ufólogo”. Diz que vive enviando provas contundentes da existência de Ovni’s até para o ex-presidente dos EUA, Jimmy Carter. Um dia, reapareceu no antigo setor e passou a decifrar para uma crédula platéia de mensageiros e estagiários as pinturas realizadas por “piXadores” na pedra da Pedra da Gávea, afirmando que foram feitas pelos fenícios. Também afirmou de “pés juntos” que o espaço, hoje ocupado pela montanha, foi tomado do mar. E numa apoteótica despedida, digna de impressionar os antigos colegas de trabalho, anunciou: A NASA não faz nada sem me ouvir!    

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