OVELHA NEGRA, SIM SENHOR

    Em dezembro passado eu me vali do excelente artigo “Manifesto das Ovelhas Negras”, escrito pelo jornalista brasileiro Bruno Kampel, que vive na Suécia, e o distribuí aos amigos leitores e leitores amigos, com um encaminhamento meu, fazendo minhas as palavras do Bruno, como uma mensagem de fim-de-ano. Naturalmente eu estava autorizado por ele a fazê-lo.Não me surpreendeu a repercussão alcançada, os tantos comentários favoráveis que me chegaram e que enalteciam a qualidade do texto do amigo jornalista Bruno Kampel. Vários leitores chegaram a se confessar pertencerem ao time das ovelhas negras, com muita honra. Fiquei feliz. Minha escolha fora acertada. Deu para avaliar que no modesto universo dos que me lêem nem tudo está perdido. Aleluia. Resolvi destacar o trecho abaixo porque, entre tantas identificações que encontrei naquele artigo com os meus anseios de um dia poder viver num país melhor, mais justo, num mundo menos cruel e menos violento, numa sociedade menos hipócrita e muito mais solidária, senti-me perfeitamente retratado nessas poucas palavras escritas com tanto talento pelo Bruno Kampel:”…escolhemos sempre cuidar a grama que cresce entre as estrofes do nosso ideário ou nas entrelinhas dos nossos fracassos, a ter que apará-la para satisfazer o gosto alheio; e principalmente, escolhemos lavar e passar as nossas velhas e surradas utopias – essas que jazem no fundo da gaveta das boas intenções – a ter que abaixar os braços e aceitar as ordens peremptórias e quase sempre sem sentido dessa déspota chamada Realidade;”Já fui chamado de utópico ao expor e defender, sem nenhum pejo, os meus sonhos que insisto em alimentar, não obstante os desestímulos, que a realidade que me cerca, atira-me na cara constantemente, mas, também o meu ideário se fortalece a cada decepção, a cada desapontamento, a cada malogro da minha teimosa esperança.Jamais me conformarei com as guerras, contrariando o que me dizem alguns: “o mundo sempre conviveu com elas”. Nunca aceitarei a violência, as injustiças sociais, o preconceito, o desamor, repudiando o que outros já puseram para mim como argumentos para justificar essa realidade que nos rodeia: “ora, desde que existe o homem sobre a face da Terra, sempre foi assim e nunca será diferente.” Hoje em dia, mais do que nunca, levantarei sempre mais alto a bandeira das minhas utopias e a sacudirei bem forte, e bradarei enérgica e vigorosamente a sublevação das palavras escritas que haverão de romper e despertar o silêncio conformista, que haverão de irromper pelos ouvidos moucos da conveniência elitista, burguesa, egocêntrica, intolerante e hipócrita.Sem nenhum intento de reportar-me a, ou de fazer política, insiro aqui, por oportuno, uma citação de Bernard Shaw, que certa vez foi usada por Millôr Fernandes: “Todo homem sensato aceita o mundo como ele é. Só os loucos tentam reformar o mundo. Portanto todo progresso depende dos loucos.” Millôr se referia a uma declaração do americano O Neill, quando este afirmara que o então candidato, Lula, era maluco.E também, por oportuno, na minha linha de raciocínio e de argumentação, permito-me relembrar aqui este apotegma atribuído ao grande Oscar Wilde:”Aos olhos de quem leu a História,  a desobediência é a virtude original do homem.  A desobediência permitiu o progresso – a desobediência é a rebelião.” (Oscar Wilde)”Ovelha Negra” também tem coração e este sofre porque ama no limite de seus sentimentos. Eu não saberia viver sem amor, já o disse certa vez, e enganam-se os que possam pensar que eu o tenha sepultado ou cremado, muito pelo contrário. Ele ultrapassa os limites, ditos terrenos, e alça vôos, para alguns, incompreensíveis, pois não há barreiras que o impeçam.”Ovelha Negra” não é terrorista, talvez contestador, talvez revolucionário, se necessário, no mais nobre dos sentidos, em busca não só da sua felicidade, da sua paz, mas também da dos marginalizados, dos sem voz, dos sem vez, dos só lembrados na oratória conveniente e interesseira da politicalha e logo apagados da memória dos promesseiros inescrupulosos quando alcançam seus objetivos eleiçoeiros.”Ovelha Negra” também fala e fala muito de amor. Não do amor que só consola, que alicia ao conformismo, que prega coisas lindas, mas é vazio na emoção, que tem a alma ególatra, que apequena o sofrimento alheio quando o subjuga a uma “vontade Divina”, incontestável, onipotente, que talvez lhe imponha a dor para expiar culpas das quais o pobre coitado sequer tem consciência. E este direito lhe seria negado num certo sentido de justiça que me foge da compreensão.Nosso amor é solidário, como outros o são, porque abraça os diferentes, os desiguais, os enfermos, os molestados, os ofendidos, mas não apenas na teoria, não apenas na intenção exibicionista e algumas vezes interesseira pela troca de favores e pelo lucro, pela vantagem, pelo proveito na prática da caridade que humilha e até prostitui.  Para alguns, falar de amor, pregar o amor, exclui a dor, o realismo, e, algumas vezes até não resistem a subir alguns degraus de um pedestal a configurar aquele algo de superioridade. Não pratico este amor. O amor que me ensinaram abraça bem mais que um outro ser humano, ou só um, que nos ajuda a construir uma felicidade solidária a dois, e jamais me cegou, ou cegará, quanto à penúria, à torpeza, à iniqüidade, às injustiças tantas de uma realidade em que estamos todos inseridos, queiram ou não enxergar. “Ovelha Negra”, sim senhor, também me declaro.Encerro com as mesmas palavras usadas no “Manifesto das Ovelhas Negras”, do amigo e jornalista, Bruno Kampel: “Que os punhos fechados se abram em mãos estendidas ao próximo, e que a paz rompa os grilhões, e que a verdade tenha finalmente o direito de dizer a última palavra.”

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