PELOS TRILHOS DO METRÔ

    A cada dez textos que “cometo”, pelo menos um classifico como “obra prima”, na vã esperança de que irá se tornar um “campeão de audiência”. E aí, a partir do envio da matéria para os portais do Sinal e da RioNet para veiculação na segunda-feira, fico numa ansiedade de futura mãe, à espera da chegada do primeiro filho.Ao chegar para trabalhar na terça-feira, a primeira coisa que faço é ligar o micro para verificar o que “pintou” a respeito da crônica. Inexistindo manifestações à “obra-prima”, passo a considerar que é cedo, que não deu tempo para as pessoas lerem, etc. Depois, ligo a caixa de som bem alto e a qualquer aviso sonoro-eletrônico de novo e-mail, paro tudo que estou fazendo, vou lá verificar e o resultado é o de sempre: nada vezes nada!Na quarta, o mesmo ritual matinal. À tarde, esgotadas as desculpas e concordando com os possíveis “leitores” que não produzi nenhuma “obra-prima”, relaxo e volto falar mal da vida alheia.Entretanto, regido pelo signo do “que pinta”, ou seja, não escrevo sobre temas pré-concebidos, no decorrer da semana, “bate” uma desmotivação para produzir novos textos. Se até sexta depois do almoço continuar em “baixa”, passo a ler desesperadamente – até bula de remédio – e depois, “suando em bicas”, me “viro” para dar algum sentido a digitação destas bobagens.A embromação aí de cima, além de ajudar preencher o tamanho da coluna previsto no “contrato”, ou seja, uma página de papel A-4, serve para informar que os fatos que contei sobre a Linha 2 do metrô, renderam mensagens com novas histórias cujos autores pediram anonimato.  A primeira: na estação Vicente de Carvalho, a mãe vai puxando a filha de uns dez anos de idade pela mão em direção à saída. De repente, a menina começa a chorar e a mãe olhando ao seu redor como um periscópio de submarino, culpando a tudo e querendo briga com todos que lhe ousassem fitá-la, repete a mesma pergunta em voz alta: – Pisaram no teu pé? Quem foi que pisou? A menina, calçada com sandálias que lhe deixa à mostra o dedão do pé esquerdo protegido por um curativo, custa a parar de chorar e mãe não conversa: fixa o olhar desafiador em quem encontra, repetindo as mesmas perguntas: – Pisaram no teu pé? Quem foi que pisou? Ao desembarcar a menina choramingando responde:- Ninguém não, mãe! Foi você! Você!A segunda: sentado ao lado da porta no vagão lotado, o "coleguinha", ao abrir um livro para distrair, notou viajando em pé à sua frente, uma bonita morena, jovem, bom corpo, de lábios carnudos, e que no decorrer do percurso, de tão cheia que estava a condução, passou a roçar-lhe os joelhos, fato que o levou a imaginar incríveis aventuras eróticas.A “morenaça”, enquanto se equilibrava segurando com a mão o balaústre do vagão, cadenciava, em atitude excitante, o quadril em sincronia com o balanço do trem.No decorrer da viagem, o metrô deu uma sacudidela mais forte chacoalhando os passageiros e fazendo com que esses saíssem momentaneamente das suas posições. Foi então que o “coleguinha” captou a cena inusitada: a mão direita da morena, inclinada para trás, “trabalhava” no interior da braguilha aberta de um passageiro postado em diagonal às suas costas.Vendo que os dois, mesmo após o tranco, não desfizeram o ar de felicidade estampado em seus rostos e sequer abriram os olhinhos sonhadores de prazer, restou ao coleguinha retomar a leitura, nessa altura, preocupado com a possibilidade do “acariciado” jactar-se em sua direção. Falei nisso e lembrei da piada sobre um motorista de  táxi  que, ao passar em frente a um aeroporto transportando um apressado casal de namorados para um motel, subiu na calçada ao ouvir o rapaz alertar a parceira: “olha o jato!”.          Enrolei muito, mas cheguei aonde quero. É que após ler uns livros espíritas, descobri um lado místico no metrô: trabalhei todo o ano de 1985 – sem interrupção – no BC em São Paulo. Em 90% das segundas-feiras pela manhã, encontrei no trem, sempre com um mesmo casal de namorados adolescentes, estudantes, brancos, sardentos e cabelos de fogo . Por sermos, quase sempre, os únicos passageiros do vagão, o fato ensejou com o tempo, até mútuos cumprimentos. Se considerarmos que ônibus nunca chegam ao ponto num mesmo horário; que sempre parava na banca de jornal para ler as manchetes por tempo que variava de acordo com as notícias; que tomava café num bar, levando diferentes quantidades de minutos na fila para pagar e ser servido; enfim, que a rotina matinal possui o caráter da impresivibilidade, como também, sem esquecer de que estudantes tiram férias e de que nunca fiquei mais de uma semana sem vir ao Rio, não posso atribuir aos encontros apenas o caráter simplista da mera coincidência.  Não sei não, mas nos escuros túneis do metrô, coexistem outros pares além dos trilhos. 

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