TODO MUNDO E NINGUÉM VIU – II

    Essa vida de escrivinhador tem coisas estranhas. Às vezes pinta na cachola um tema que acreditamos que irá “estourar a boca do balão” e originar vários comentários. Aí caprichamos nas palavras, nas idéias, nas descrições, lemos, relemos e modificamos o texto quinhentas vezes. AÍ o danado vai “para o ar”, ficamos ansiosos, abrimos toda hora a caixa de correios e não aparece uma mísera manifestação a respeito. Às vezes, com o prazo estourando para o envio, apelamos para “escritos” esquecidos na prateleira, enviamos apenas para cumprir a “obrigação trabalhista”, e surpreendentemente, há boa repercussão. Foi o caso da coluna “O que todo mundo e ninguém viu”. Teve gente mandando e-mail para dizer que estava no jogo entre Botafogo e Fluminense, no show do Frank Sinatra, nos mil gols do Pelé, no comício das diretas, etc. Mas não! Ninguém falou que viu a derrubada do Muro de Berlim ou o ataque as Torres Gêmeas. Recebi até e-mail da poetisa, escritora e brilhante companheira de Rionet, Rosi Moura, contando que foi ao primeiro Rock in Rio. Soube inclusive que em um encontro recente de aposentados em Comary – que infelizmente não pude comparecer – estava sendo aguardado por um participante disposto a mostrar ingressos de algumas famosas atividades em que ele estava presente.  A Apresentação de ingresso original é prova irrefutável. É como batom na cueca. Por falar em ingresso, sempre lamento ter perdido as entradas de um histórico jogo entre Vasco e Santos, que “todo vascaíno viu”, mas assistido por apenas 29.200 torcedores, no qual Pelé empatou o jogo, nos últimos dois minutos, em 16.2.63. É que andei trocando e-mails com outro vascaíno e disse-lhe que um dos gols do Vasco foi do Sabará. Como ele contestou, pesquisei e achei o registro que confirmava a minha informação num site esportivo. Mas, faltou a prova cabal: a presença física! Para tanto teria que enviar-lhe, “on-line"; a cópia do ingresso do jogo. Teria sido uma vitória por nocaute.”Nessa de todo mundo e ninguém viu", já fiquei numa saia justa danada: um antigo funcionário da prefeitura marcou dia e hora para comparecer na Câmara de Vereadores de Friburgo e denunciar as falcatruas do sobrinho do prefeito, que era o secretário geral do município. Ao começar a falar, foi morto pelo tal sobrinho, que estava acompanhado de um irmão. Ouvi tanto a respeito que, para me “cartar”, como se dizia “antigamente”, passei a dizer que assisti ao crime que não vi e dava até os detalhes. Só que, dias após a prisão dos atiradores, entrei em pânico com a notícia de que o promotor estava arrolando testemunhas para depor contra os criminosos. Fiquei com um medo tão grande que nem saía mais de casa. Minha mãe percebeu, me chamou no canto e disse: “esta com medo de ser arrolado como testemunha daquilo que você diz que viu e não viu, não é? O jeito foi confessar. Ela, com a calma e sabedoria rotineiras das mães aconselhou:” Você está no mesmo caso de um monte de gente por aí. Quando dava notoriedade, todo mundo viu o crime. Quando esse mesmo crime passou a representar um problema, todo mundo ficou cego. Ninguém viu”.

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